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Dave the Diver: precisamos falar sobre os indies

Indicado no The Game Awards na categoria Melhor Jogo Independente, Dave the Diver causa polêmica por ter sido financiado pela gigante Nexon

17 semanas atrás

Quando olharmos para trás, provavelmente lembraremos de 2023 como um dos melhores anos da história dos videogames. The Legend of Zelda: Tears of the Kingdom, Baldur's Gate 3, Alan Wake 2, Marvel's Spider-Man 2, Super Mario Bros. Wonder... Esses são apenas alguns dos títulos que se destacaram esse ano, todos indicados ao The Game Awards. Outro é o Dave the Diver, mas mesmo tendo agradado muita gente, este tem causado uma certa polêmica.

Dave the Diver

Crédito: Divulgação/Mintrocket

O grande problema em relação à criação da Mintrocket é que, ao contrário dos outros jogos que citei anteriormente, ela não está concorrendo ao título de Melhor do Ano, mas sim na categoria Melhor Jogo Independente. Tendo alcançado uma nota 90 no Metacritic, ele já nasce como um clássico, mas o problema é que de indie, o jogo não tem muito.

Tudo bem, estamos falando de um título que foge do lugar-comum, com um preço bastante acessível, gráficos pixelados e uma jogabilidade que mistura RPG, exploração do fundo do mar e gerenciamento de um restaurante. O desenvolvimento de algo assim dificilmente seria bancado por uma grande editora, mas o detalhe é que foi.

Embora muitas pessoas não saibam disso, o estúdio que produziu o Dave the Diver pertence a uma gigante, a sul-coreana Nexon, empresa que só no ano passado faturou mais de US$ 2,3 bilhões. Sendo assim, o jogo poderia ser tratado como um indie? Pois a resposta para essa pergunta teria sido dada pelo presidente da editora, Kim Dae-hwon, quando afirmou que “ele pode parecer um indie, mas não necessariamente é.”

Porém, por mais que a primeira reação seja de querermos eliminar o título da premiação, ao menos nesta categoria, o fato é que definir o que é um jogo indie está se tornando cada vez mais difícil.

Crédito: Divulgação/Mintrocket

No caso do Dave the Diver, além dos vários elementos que o empurram nesta direção, ele ter sido a primeira criação a Mintrocket — estúdio fundado há pouco mais de um ano — pode ter ajudado a confundir os jurados do The Game Awards. É difícil saber se essas pessoas sabiam que a desenvolvedora pertence a uma companhia imensa, mas confesso que eu mesmo só fui ter ciência disso agora, após todo o debate.

Além disso, se considerarmos as outras categorias da premiação, é possível encontrar algumas indicações duvidosas e até mesmo categorias um tanto subjetivas. Afinal, o que seria um jogo família? Os títulos presentes em Games For Impact possuem realmente a capacidade de impactar a vida das pessoas?

Enfim, o problema é que sempre tratamos os jogos indies como um subgênero, assim como acontece na música ou nos filmes. Na cabeça de muitas pessoas, desde que um jogo não se enquadre como uma produção de grande porte ou conte com uma jogabilidade diferente, ele passa automaticamente a ser visto como um indie. Porém, é justo fazer isso, mesmo quando há um investidor por trás?

Crédito: Divulgação/Mintrocket

Novamente, o impulso é responder que não, mas a falta de critério do The Game Awards ajuda a tornar essa linha ainda mais tênue. Quer um exemplo? Se o Dave the Diver pôde ser indicado na categoria Melhor Jogo Independente, porque o Hi-Fi RUSH não? Desenvolvido pela Tango Gameworks, uma subsidiária da Bethesda, que por sua vez pertence à Microsoft, seria a fonte do dinheiro o motivo? Ok, mas o que dizer então do Baldur's Gate 3?

Financiado, produzido e publicado pelo Larian Studios, o RPG foi um dos maiores sucessos do ano e tecnicamente, mesmo usando uma marca tão poderosa, é um jogo independente. Seria o seu orçamento, qualidade ou escopo aquilo que o difere de um indie?

Mas foquemos apenas nos outros títulos que concorrem com o Dave the Diver. Dos quatro, apenas o Sea of Stars foi publicado pela própria desenvolvedora, a Sabotage Studio. Desta forma, o Viewfinder (Thunderful Publishing), Dredge (Team17) e Coccon (Annapurna Interactive) não podem ser considerados títulos independentes?

A bagunça se torna ainda maior quando notamos que o jogo da Mintrocket não aparece em outra categoria, a de Melhor Jogo Indie de Estreia, sendo que o Cocoon, Dredge e Viewfinder estão também nela.

Olhando para os dois anos anteriores, a categoria foi vencida por jogos que, mesmo que os consideremos como independentes, contaram com fortes campanhas de divulgação da Sony: Kena: Bridge of Spirits e Stray. No caso do segundo, ele ainda foi financiado pela mesma editora do Coccon, a Annapurna. Logo, essas foram premiações justas?

Dave the Diver

Crédito: Divulgação/Mintrocket

Na minha opinião, a polêmica em que o Dave the Diver indiretamente se meteu não deveria ser motivo para manchar a imagem de um jogo tão elogiado. Ele não deveria ser indicado, muito menos premiado em uma categoria a que talvez não pertença, mas de forma alguma isso pode apagar o ótimo trabalho realizado pelo pessoal da Mintrocket.

Alguém poderá dizer que o caso apenas expõe o quão problemáticas podem ser premiações como o The Game Awards, mas acredito que ela possui seu valor e tenho certeza de que boa parte daqueles que a faturam, se orgulham disso. Contudo, como ficam os realmente independentes, que eventualmente verão suas criações perderem para um projeto que pôde se aproveitar dos benefícios de um financiador?

De qualquer forma, por mais que o conceito sobre o que é um jogo indie possa parecer bastante simples, está ficando cada vez mais complicado distingui-los entre tantos gêneros, estruturas, modelos de financiamento e de monetização.  Com gigantes como Square Enix, EA e Sony investindo em estúdio e produções de pequeno porte, até mesmo a tão declamada liberdade criativa parece ter deixado de ser exclusividade dos jogos assim.

E talvez esse seja o ponto principal nessa discussão. Independentemente de um jogo poder ser classificado como indie ou não, o importante é que não deixemos de ter acesso a títulos tão criativos, inovadores e divertidos como um Dave the Diver. Se isso continuar acontecendo, imagino que o tal rótulo só voltará a ser um estorvo na época das premiações, um preço que considero bem baixo a ser pago.

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