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Storm Shadow, o míssil que está arrancando os cabelos do Putin

Storm Shadow é um míssil de cruzeiro anglo-francês que está sendo usado pela Ucrânia, e se mostrando um pesadelo para as defesas antiaéreas russas

25 semanas atrás

Storm Shadow é um míssil de cruzeiro franco-britânico que graças a uma série de gambiarras, está sendo usado na Ucrânia, com resultados excelentes, mas para sabermos mais sobre ele, primeiro temos que voltar uns 80 anos no passado.

Míssil Storm Shadow no Museu da RAF, Londres (Crédito: Rept0n1x / Wikimedia Commons)

Primeiro, precisamos esclarecer dois pontos fundamentais. Apesar do nome, o míssil balístico V-2 (oficialmente chamado A-4) não é sucessor da bomba voadora V-1. Ambos os projetos ocorreram paralelamente, e podemos traçar as origens da V-2 bem antes, talvez 1930, quando Werner Von Braun passou a trabalhar no programa de foguetes do Partido Nazista. Já a V-1 foi proposta formalmente em 1935.

E Von Braun não teve nada a ver com a V-1, que era uma proposta de míssil fundamentalmente diferente.

Míssil de cruzeiro V-1, no Museu Imperial de Guerra, Londres (Crédito: Peter Trimming / Wikimedia Commons)

Explicando, de forma simples e incompleta: existem três tipos de mísseis, primariamente.

1 – Mísseis interceptadores

São os mísseis cujo objetivo primário é interceptar um alvo móvel, como um caça, outro míssil, um tanque ou um helicóptero. São os mísseis que o Tom Cruise lança em Top Gun. Eles carregam uma ogiva pequena e ao contrário do que vemos nos filmes, seu motor funciona por muito pouco tempo.

Um AIM-120 AMRAAM, míssil-padrão dos EUA, com alcance de pouco mais de 100 km, tem um tempo de queima de 27 segundos. Após isso ele vai no embalo. Um AIM-9A Sidewinder, com alcance de uns 20 km, só acelera por 2,2 segundos, depois disso é pura inércia.

2 – Mísseis balísticos

A famigerada V-2 foi a mãe de todos os mísseis balísticos, armas que seguem trajetórias parabólicas, aceleradas por boa parte do percurso, depois guiadas pelas Leis da Física. Mísseis balísticos são primariamente usados contra alvos estáticos, como bunkers, fábricas, usinas de energia. Com o desenvolvimento da eletrônica, as ogivas balísticas passaram a ter a capacidade de identificar alvos, então hoje temos mísseis capazes de atingir velocidades hipersônicas, identificar alvos como navios e porta-aviões, e direcionar a ogiva até eles.

3 – Mísseis de cruzeiro

Outra categoria de míssil que surgiu com a Alemanha da 2.ª Guerra. Mais precisamente a V-1, que era basicamente um avião com um motor de jato pulsado, com um alcance de 250 km. A genialidade dos mísseis de cruzeiro é que eles usam combustível líquido (álcool, no caso da V-1, e os alemães tiveram problemas com soldados roubando o combustível para beber).

Eles funcionam por muito mais tempo, permitindo que os mísseis atinjam alvos distantes, voando baixo e enganando radares inimigos.

Claro, no caso das V-1 a precisão era mínima, o máximo de precisão que conseguiam era atingir Londres, e mesmo assim ocasionalmente erravam. O mecanismo de navegação na totalidade era muito simples: um piloto automático mantinha altitude e estabilidade. Uma bússola elétrica mantinha a direção na qual a V-1 voaria.

Um odômetro com uma pequena hélice contava rotações. Os engenheiros tinham calculado mais ou menos quantas rotações a hélice faria, voando a 640 km/h, e quando o número aproximado de rotações fosse atingido, indicando que o míssil estaria sobre Londres, os cabos de controle seriam forçados em mergulho vertical. Era primitivo, mas funcionava.

Desde então muitos mísseis de cruzeiro foram desenvolvidos, cada vez mais sofisticados, como o Tomahawk americano, muito usado nas Guerras do Golfo.

A versão mais moderna do Tomahawk tem um alcance de 2.500 Km, podendo carregar armas nucleares ou convencionais.

Claro, existem muitos outros mísseis de cruzeiro, como o Silkworm chinês, o Brahmos da índia e o AV-TM 300 brasileiro, com um alcance oficial de 300 km, mas as más-línguas dizem que pode chegar a 1.000.

Teste do Brahmos, indiano.

Com os problemas de navegação e alcance basicamente resolvidos, as indústrias começaram a tornar os mísseis de cruzeiro mais sofisticados, e o Storm Shadow é um dos mais modernos atualmente.

O Storm Shadow começou a ser desenvolvido no começo da década de 1990, quando membros da OTAN perceberam que estava ficando muito caro fazer tudo sozinho, e projetos conjuntos começaram a pipocar. Reino Unido e França se uniram para criar um míssil mais barato, mais moderno e mais versátil.

Em 1996 o míssil venceu uma concorrência e foi oficialmente aceito pelas forças armadas dos dois países. No Reino Unido ele se chama Storm Shadow, na França, onde tudo é diferente, ele é conhecido com SCALP - Système de Croisière Autonome à Longue Portée, "Sistema de Cruzeiro Autônomo de Longo Alcance."

O Storm Shadow é um míssil bem ambicioso, com 550 km de alcance, voando a Mach 0,8. Ele é semi-stealth, é difícil de ser enxergado pelos radares inimigos, coisa que só foi comprovada recentemente, apesar de ele estar em uso desde 2003 com a invasão do Iraque.

Depois disso ele foi usado contra a Líbia, ISIS, os suspeitos habituais, mas seu extremo sucesso foi creditado em parte à incompetência do inimigo.

O Storm Shadow pode ser lançado de Mirages, Tornados, Typhoons e outros aviões da OTAN. Na Ucrânia, desenvolveram uma série de gambiarras para que o míssil pudesse ser lançado de caças Su-24, mas há uma série de restrições, todas as informações de alvo precisam ser programadas previamente, em solo, e o controle do míssil é feito via um tablet.

Mesmo assim, o Storm Shadow tem sido um enorme sucesso, as baterias antiaéreas S-300 e S-400 russas simplesmente não estão dando conta.

Primeira imagem de um Su-24 ucraniano levando dois Storm Shadows (Crédito: Reprodução Twitter)

Parte da culpa disso está na inteligência do Storm Shadow, que navega via GPS até o alvo, seguindo uma rota que pode ser bem tortuosa, se escondendo atrás de obstáculos como montanhas. Quando chega perto, ele ejeta o cone do nariz, expondo uma câmera térmica infravermelha.

O Storm Shadow então embica em uma subida íngreme. Após ganhar altitude, ele aponta o nariz para baixo e começa a escanear a região do alvo. Comparando com imagens na memória, ele identifica prédios, navios, paióis, o que for.

Segundo Storm Shadow atingindo o Quartel-General da Frota do Mar Negro

Reza a lenda (nada disso foi confirmado, obviamente), ele é inteligente o bastante para enviar imagens para a base, identificar seções do alvo já destruídas e focar em outras áreas, e até abortar a missão em caso de possível dano colateral.

As versões mais novas do Storm Shadow teriam um link de duas vias com a base, e poderia ser redirecionado e reprogramado ainda em voo.

Em 13 de setembro de 2023, um ataque com Storm Shadows atingiu uma base naval em Sevastopol, na Ucrânia ocupada. Mísseis danificaram seriamente, provavelmente perda total, o submarino classe Kilo Rostov-on-Don e o navio de desembarque Minsk, ambos em docas secas, o que significa que os russos perderam temporariamente não só as embarcações, como o espaço para consertar outros navios.

Danos no submarino russo. Dizem as más-línguas que deu PT (Crédito: Reprodução Twitter)

Em 22 do mesmo mês, Storm Shadows atingiram em cheio o quartel-general da frota russa do Mar Negro, também em Sevastopol. Pelo menos dois mísseis, cada um com uma ogiva com 450 kg de explosivos, causaram grandes danos. Falam-se em nove mortos, incluindo um Almirante.

O vídeo é lindo:

O próximo passo já foi dado: Após negar veementemente por vários meses, os EUA admitiram que vão dar para a Ucrânia os mísseis semi-balísticos MGM-140 ATACMS, com alcance de 300 km.

Depois disso os europeus provavelmente vão liberar o Storm Shadow com alcance máximo, e aí será o fim da ponte da Crimeia, mas aí já é dar spoiler e qual a graça da 3.ª Guerra Mundial se a gente contar quem vai ganhar?

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