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NASA critica Rússia por propaganda anti-Ucrânia na ISS

NASA e Roscosmos vinham colaborando na ISS sem problemas... até cosmonautas russos usarem estação para propaganda pró-invasão da Ucrânia

2 anos atrás

A NASA divulgou nesta quinta-feira (7) uma rara e dura reprimenda à Roscosmos, a agência espacial russa, e ao governo de Moscou como um todo, após os três cosmonautas residentes na Estação Espacial Internacional (ISS) a usarem como plataforma de propaganda pró-invasão da Rússia à Ucrânia.

Em uma postagem compartilhada pela Roscosmos no Telegram, Sergey Korsakov, Oleg Artemyev e Denis Matveev posaram para fotos com bandeiras da República Popular de Lugansk, região separatista da Ucrânia, um dia depois das tropas russas tomarem a cidade de Lysychansk, o que, na prática, consolida a secessão do território.

Cosmonautas russos Sergey Korsakov, Oleg Artemyev e Denis Matveev exibem bandeira da República Popular de Lugansk na ISS (Crédito: Roscosmos/Telegram)

Cosmonautas russos Sergey Korsakov, Oleg Artemyev e Denis Matveev exibem bandeira da República Popular de Lugansk na ISS (Crédito: Roscosmos/Telegram)

A postagem dos cosmonautas foi compartilhada nesta segunda-feira (4), em referência à "operação militar especial" conduzida na Ucrânia, que um dia antes, havia assegurado, ou melhor, "libertado" a região de Lugansk de forma praticamente definitiva.

Na postagem compartilhada, a Roscosmos escreveu o seguinte:

"Este é um dia muito esperado pelos residentes das áreas ocupadas da região de Lugansk, há pelo menos 8 anos (...). Acreditamos que o dia 3 de julho de 2022 ficará para sempre na história da República."

O que vem irritando a comunidade científica e as agências espaciais, da NASA à ESA, nos últimos tempos, é a politização extrema da Roscosmos, algo sem precedentes na História. Nem durante a Guerra Fria, os soviéticos se atreveram a criar atritos com os EUA no que tangia à exploração espacial, e colaboraram muitas vezes em esforços conjuntos.

Sob o comando de Werner von Braun, Sergei Korolev e seus sucessores diretos, a NASA e a Roscosmos foram comandadas por cientistas e, em alguns casos, por políticos minimamente interessados em avançar a pesquisa aeroespacial, e menos inclinados a cederem aos ventos políticos.

O mesmo não pode ser dito, entretanto, de Dmitry Rogozin, o atual diretor da Roscosmos. Um político carreirista e amigo próximo do presidente Vladimir Putin, ele compartilha da retórica atual do Kremlin, de total agressividade ao ocidente e defesa irrestrita dos ideais políticos de Moscou, que pela primeira vez, foram levados para o espaço.

O processo movido contra uma astronauta dos EUA devido a um buraco que apareceu na cápsula Soyuz, que escalou para uma campanha local de "cancelamento" (afinal, mulher), a ameaça recente (e infundada) de desacoplar o módulo russo da ISS, e de piratear o telescópio alemão do observatório Spektr-RG, são os casos mais recentes de politização do espaço por parte dos russos.

Em março de 2022, trajes de cosmonautas russos levantaram suspeitas de ato pró-Ucrânia, mas Moscou disse ser coincidência (Crédito: Reprodução/Roscosmos)

Em março de 2022, trajes de cosmonautas russos levantaram suspeitas de ato pró-Ucrânia, mas Moscou disse ser coincidência (Crédito: Reprodução/Roscosmos)

O que nos traz ao caso atual. Em março de 2022, os cosmonautas russos chegaram à ISS usando trajes amarelos com faixas azuis, o que todo mundo apontou como uma manifestação velada pró-Ucrânia, o que poderia lhes custar caro em terra. A Rússia, no entanto, negou a homenagem, dizendo serem as cores da universidade em que Korsakov, Artemyev e Matveev estudam. E concluiu, dizendo que "às vezes, amarelo é só uma cor".

Como não houveram mais manifestações a esse respeito desde então, todo mundo acreditou que o governo russo falou a verdade, e que exceto por uma curiosa coincidência, o trio não faria nenhuma manifestação política na ISS, o que agora se mostrou não apenas falso, mas com os cosmonautas sendo, como esperado, pró-invasão.

A NASA, claro, não gostou nem um pouco dos russos usarem a estação como palanque. Em uma rara declaração bem grossa, o secretário de imprensa da agência espacial norte-americana disse o seguinte:

"A NASA condena veementemente o uso da Estação Espacial Internacional pela Rússia para propósitos políticos, de modo a apoiar sua guerra contra a Ucrânia, que é fundamentalmente inconsistente com à sua função primária, definida pelos 15 países participantes, depromover o avanço e o desenvolvimento científico e tecnológico para fins pacíficos."

A declaração contra a atitude dos cosmonautas na ISS é por si só inédita, visto que a Rússia é um dos, se não O, parceiro mais essencial para a manutenção da estação, por ser responsável pelo Segmento Orbital Russo (ROS), que gera propulsão, fornece controle de altitude e sistema de manobras.

Como a ISS foi projetada para que todos os módulos dependam uns dos outros, uma desacoplação, já ameaçada antes, fariam com que os russos no ROS logo ficassem sem energia, fornecida pelos painéis solares do módulo americano. Por outro lado, o resto da ISS ficaria inerte.

Politização extrema da Roscosmos pelo diretor Dmitry Rogozin, amigo próximo de Putin, está irritando toda a comunidade envolvida com a exploração espacial (crédito: Reuters)

Politização extrema da Roscosmos pelo diretor Dmitry Rogozin, amigo próximo de Putin, está irritando toda a comunidade envolvida com a exploração espacial (crédito: Reuters)

As constantes provocações da Rússia vêm tirando o sono e irritando todo mundo, mas até então, havia a preocupação de manter o trabalho duro no espaço, com Moscou inclusive considerando estender sua presença na ISS, após afirmar que se retiraria do projeto em 2025.

Agora, a NASA te que lidar com a situação atual, no que a Rússia conseguiu levar sua máquina de propaganda pró-governo e anti-Ucrânia para uma estação que, apesar de tudo, nunca foi politizada, por Dmitry Rogozin e sua Roscosmos, hoje basicamente mais uma ferramenta que Putin usa como quer.

No médio prazo, os ânimos entre a NASA e a Rússia podem ficar ainda mais acirrados, ao ponto dos americanos em algum momento começarem a barrar participações russas, ou algo não tão improvável assim, apressarem os planos de descomissionamento da estação, e exclusão dos russos da estação Gateway.

O que pode nem ser um problema para Moscou, que pode contar com a China para explorar o espaço e a Lua.

Fonte: The Verge

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