Ronaldo Gogoni 2 anos atrás
A China vem tocando sua estação espacial própria de modo comedido e silencioso, e está muito certa em fazer isso, de certa forma. Hoje a ISS está próxima de seu limite de tempo hábil para continuar sendo usada com segurança, e a estação lunar Gateway é a proposta norte-americana voltada a substituí-la. O problema é que os países outrora parceiros não estão se entendendo para estabelecer acordos de cooperação.
A Rússia já avisou que não vai mais trabalhar com os malditos ianques, e sairá da joint da ISS em 2025, ano em que deverá entrar em operação uma estação própria. A Russian Orbital Service Station, ou ROSS, terá zero compatibilidade com o módulo russo da atual estação, que a Roscosmos pretende alugar para uso pelos americanos.
A grana arrecadada seria direcionada para o novo empreendimento, fazendo com que os americanos de certa forma paguem parcialmente pela construção da ROSS, o que agrada em muito Dmitry Rogozin, o diretor da Roscosmos. Além de sair da ISS, a Rússia se recusou a assinar os Acordos Artemis e até onde se sabe, a estação projetada para ser a autêntica (para os russos) sucessora da Mir terá zero compatibilidade com o Gateway.
Parte da briga se deu porque a Roscosmos tentou forçar a manutenção de compatibilidade das cápsulas Soyuz, e os americanos preferem estruturar um sistema único mais moderno. Além disso, os EUA se posicionam como os "donos" da Lua, com a NASA agindo como a caseira: todo e qualquer projeto das nações parceiras para exploração do satélite só ganha sinal verde se os americanos aprovarem.
Rogozin, e o parlamento russo como um todo, consideraram tal proposta inaceitável, defendendo que a exploração da Lua e do espaço como um todo deve ser administrada num acordo de cooperação igualitária, mas como os americanos não cederam, os russos pediram o boné e vão trabalhar por conta.
No país vizinho, Zhang Kejian, diretor da Administração Nacional de Espaço da China, a agência espacial do País do Meio, assim como Rogozin, não gostou dos termos dos Acordos Artemis e como consequência, a Gateway também não terá participação chinesa. Em contrapartida, Pequim se aliou a Moscou para a construção de uma futura base lunar, 100% livre de porcos capitalistas.
Só que a China também tem seus próprios planos para uma estação espacial, e diferente dos russos, vem testando módulos desde 2011, quando o Tiangong-1 (o nome em chinês se traduz como "palácio celestial") foi lançado, seguido pelo Tiangong-2 em 2013. Ambos reentraram na atmosfera respectivamente em 2018 e 2019, o primeiro à moda chinesa, o segundo devidamente controlado.
Representação artística da Estação Espacial Tiangong quando concluída (Crédito: Divulgação/China Manned Space Engineering Office)
Já em abril de 2021, a agência espacial chinesa lançou o módulo principal Tianhe ("harmonia celeste"), o primeiro a integrar o que virá a se tornar a Grande Estação Espacial Modular da China, que é o nome pomposo oficial. Para fins práticos, ela vem sendo chamada pela mídia de Estação Espacial Tiangong (TSS), ou apenas Tiangong-3.
Em termos práticos, a TSS é uma Mir 2 - A Missão, com tamanho (20 metros de extensão e 3 m de diâmetro) e massa (100 mil kg) muito próximos da antiga estação russa. A título de comparação, a ISS mede 73 m de comprimento, 5 m de diâmetro em média e tem uma massa de 419.725 kg.
Claro que a ideia é ser uma estação com cooperação entre países bem restrita (até o momento apenas a Itália fechou um acordo de longa duração, e a Universidade de Oslo, na Noruega, está desenvolvendo um experimento para ser realizado na TSS), mas mesmo assim...
Antes que experimentos possam ser realizados na TSS, o módulo Tianhe precisa ser preparado adequadamente para a acoplagem dos demais, e para isso, nesta quarta-feira (16), às 22:02 horário de Brasília, ou 9:22 de quinta-feira (17) no horário local, a China irá lançar a missão tripulada Shenzhou 12, a primeira em 5 anos, desde a Shenzhou 11 em 2016.
Os taikonautas Nie Haisheng, Liu Boming e Tang Hongbo permanecerão três meses a bordo da Tianhe, ajustando o módulo para viabilizar a acoplagem das futuras missões e expansão da estação chinesa, que se tudo correr dentro do cronograma, deve ser concluída já em 2022. Segundo a agência espacial chinesa, a Tiangong-3 terá um ciclo de vida útil de 10 anos, desconsiderando as inevitáveis extensões do prazo.
O foguete Longa Marcha-2F já está devidamente posicionado, mas como sempre, não há um link oficial para a transmissão do lançamento, porque a China é absolutamente paranoica com isso. Portanto, é bem possível que um streaming apareça na última hora e sem aviso, logo é bom ficar de olho nas redes sociais dos suspeitos habituais, inclusive as nossas.
Fonte: Global Times