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Futuro das narrativas interativas pode estar nas Smart TVs

Criadora do As Dusk Falls defende que os consoles são uma barreira para aumentar o público dos games e aponta as Smart TVs como a melhor solução

04/06/2024 às 10:08

Um dos maiores desafios da indústria de games é aumentar o número de consumidores. Se para os típicos jogadores a ideia de comprar um console ou usar um gamepad pode parecer comum, para quem não está habituado aos jogos eletrônicos esses objetos acabam servindo como enormes barreiras. Pois uma desenvolvedora defende que a solução para esse problema estaria no melhor uso das Smart TVs.

Crédito: Divulgação/Interior/Night

Quem defendeu esses aparelhos como a saída para o maior alcance dos games, principalmente aqueles focados em narrativas interativas, foi Caroline Marchal, CEO e diretora de criação da Interior/Night.

Fundado em 2016 em Londres, o estúdio foi formado principalmente por profissionais que trabalharam na Quantic Dreams, sendo lá que Marchal participou da criação de jogos como Heavy Rain e Beyond: Two Souls. Logo, não surpreende o primeiro projeto da sua empresa ter sido o As Dusk Falls.

Fortemente escorado no enredo, o jogo lançado em julho de 2022 funciona como uma espécie de história em quadrinhos e conquistou alguns admiradores por a todo momento precisarmos tomar decisões que influenciarão no desenrolar dos acontecimentos. Indicado em várias premiações, ele faturou o prêmio Games for Impact concedido pelo The Game Awards naquele ano.

As Dusk Falls é o tipo de jogo que algumas pessoas adoram assistir outras jogarem, com elas palpitando sobre qual caminho seguir e até pela sua mecânica um tanto simples, ele poderia ser aproveitado por um público muito maior. Por isso, Caroline Marchal acredita que a indústria precisa encontrar maneiras de tornar os jogos mais acessíveis.

“Quando você olha para jogos como Unpacking, Norco, Venba ou Papers, Please, [essas] são abordagens muito diferentes da narrativa interativa, todas válidas e acho que isso é fantástico, eles estão onde precisam estar,” disse. “Talvez eles ainda não estejam nas plataformas corretas para que todos possam acessá-los, porque quando você sabe que está no Xbox, está acessando uma subseção bastante central de jogadores.”

Marchal então usou o jogo Venba como exemplo, citando que se ele estivesse disponível na Netflix, poderia alcançar um público muito mais amplo e completou: “a partir do momento em que você precisa comprar um console para aproveitar o Venba, você não atinge todo o público potencial.”

A primeira reação de algumas pessoas diante de tal afirmação pode ser apontar os dispositivos mobile como a melhor alternativa, mas a game designer deu um motivo importante para os tablets e smartphones não serem a saída ideal.

Venba (Crédito: Divulgação/Visai Games)

“O mobile é muito complicado, porque é baseado em free-to-play e ter uma narrativa interativa free-to-play é difícil,” explicou. “Há exemplos como o Choices, mas é muito difícil, porque o [modelo] premium deixou de ser algo no mobile, infelizmente [...] Claro, todo mundo possui um smartphone, então como podemos resolver isso? Está ficando muito difícil, porque agora a aquisição de usuários é absurdamente cara e se tornou um negócio inteiramente diferente.”

Chegamos então àquela que desponta como a possibilidade mais promissora, que são as Smart TVs. Com vários dos aparelhos mais modernos contando com a capacidade de rodar jogos nativamente, eles poderiam facilitar enormemente o acesso a certos títulos, com o streaming ampliando ainda mais o público.

“Se isso funcionar, pode ser uma grande oportunidade para esse tipo de experiência alcançar o público da TV — que é enorme,” especula Caroline Marchal. “É essencialmente todo mundo, jogadores e não jogadores.”

Mas além de eliminar a necessidade de um console, computador ou dispositivo mobile, a CEO defende que os jogos precisam entregar mecânicas mais simples. Para quem está acostumado com videogames, andar por um vasto mundo aberto em três dimensões pode parecer natural, mas as pessoas que teriam contato com a mídia apenas através de Smart TVs sofreriam para entender como essa navegação funciona.

Crédito: Divulgação/Interior/Night

“Mesmo se disséssemos que o As Dusk Falls é fácil de jogar, basta usar o analógico esquerdo e o botão A, você precisa saber o que o botão A é,” explicou. “Já com um telefone, todo mundo possui um, não há atrito aqui. Todo mundo sabe como deslizar, como se mover, você não tem nada para explicar.”

Caroline ainda citou a capacidade das pessoas jogarem juntas como um fator que contribuirá para aumentar o público. Em um jogo como o As Dusk Falls, isso acontece através das escolhas das decisões que os personagens devem tomar, como numa votação. Contudo, nada disso funcionará se o leigo tiver que lidar com elementos tão comuns nos jogos, como interface, gerenciamento de inventário, barras de energia, etc.

“É sobre os personagens, o que eles estão fazendo no mundo e todo mundo é bastante competente em entender as pessoas e motivações,” disse. “Essa parte de [o público] se tornar mais amplo, não é apenas sobre os controles ou a acessibilidade. É também sobre o que o jogo se trata, é sobre pessoas que lutam com problemas da vida real e, de repente, qualquer um pode entrar e participar [do jogo] em igualdade de condições.”

Crédito: Divulgação/Interior/Night

Acho interessante esse ponto de vista de Caroline Marchal e como alguém que acredita que os jogos devem ser os mais acessíveis possível, torço muito para que a visão da game designer se concretize. De fato, poder oferecer jogos diretamente através de Smart TVs poderia contribuir muito para uma maior popularização da mídia, mesmo que isso acontecesse apenas por streaming.

Porém, quando se trata de derrubar a barreira da interface ou oferecer mecânicas mais simples, tendo a achar que essa será uma missão muito mais difícil de ser concluída. Para jogos como o que a Interior/Night criou, isso não será um problema, mas sabemos que ele é uma exceção e voltado para um público bem específico.

De qualquer forma, acho legal saber que alguns desenvolvedores estão preocupados em aumentar o público que seus títulos podem alcançar e não acho que isso se deve apenas a uma questão financeira. Hoje é comum vermos jogos com as mais variadas opções de acessibilidade e se um dia a minha mãe descobrir que pode se divertir com algo que ela nem percebeu se tratar de um jogo, acredito que a indústria terá rumado para um caminho melhor para todos.

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