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Sony, Funimation, e a "posse para sempre" só que não

Ao fundir a Funimation com a Crunchyroll, Sony apagará as compras digitais de usuários, que tinham acesso a conteúdos "para sempre"

09/02/2024 às 10:34

Outro dia, outra celeuma envolvendo a distribuição digital: o rolo da vez envolve a Sony, mais especificamente a Funimation, seu serviço original de streaming de animes, que está sendo descontinuado e seus conteúdos transferidos para a Crunchyroll, adquirida pela gigante japonesa em 2021.

Os usuários da Funimation descobriram que conteúdos digitais resgatados, via vouchers em DVDs e Blu-rays vendidos pelo site, não serão transferidos para a Crunchyroll (cujo valor da assinatura vai aumentar, obviamente), no que muitos que não têm mais as mídias físicas, ou não têm como reproduzi-las, perderão o acesso àquilo pelo qual pagaram, e não haverá reembolso.

Funimation vendeu mídias físicas de One Piece e outras séries, com vouchers para resgatar o mesmo conteúdo no site; com a fusão, os usuários perderão o acesso (Crédito: Divulgação/Toei Animation/Crunchyroll/Sony)

Funimation vendeu mídias físicas de One Piece e outras séries, com vouchers para resgatar o mesmo conteúdo no site; com a fusão, os usuários perderão o acesso (Crédito: Divulgação/Toei Animation/Crunchyroll/Sony)

Sony, Funimation e a "compra" que não é uma compra

Na última quarta-feira (7), a Funimation publicou um aviso aos usuários, sobre o fim das atividades do serviço, que será fechado em 2 de abril de 2024, em todo o mundo. O público já estava ciente que isso aconteceria em algum momento, pois a Sony vinha aos poucos transferindo conteúdos deste para a Crunchyroll, e corrigindo algumas discrepâncias como dublagem, sincronização de legendas, etc.

Desde o início, a Sony prometeu que os assinantes da Funimation seriam migrados para uma assinatura premium da Crunchyroll, tão logo o serviço fechasse, e este plano permanece inalterado. No entanto, há uma diferença crucial entre as plataformas, a primeira vendia mídias físicas de algumas das séries que distruía, em DVD e Blu-ray.

Os usuários que adquiriram as mídias recebiam também um voucher, que dava direito a resgatar, no site ou app da Funimation, os mesmos conteúdos que adquiriu fisicamente, na forma digital, o que a Sony dizia originalmente que o acesso era "para sempre", mas com "algumas restrições", conforme os Termos de Serviço da plataforma.

Assim como aconteceu no caso da Apple, as restrições da Sony são o conceito de posse de conteúdo digital, que nada mais é do que uma concessão de uma licença de uso, que serviços não fazem questão de explicar como funciona. Claro, o usuário nunca lê os Termos de Serviço e todo mundo sabe disso.

Nas restrições da Funimation, o site/app se reserva no direito de "cancelar imediatamente a disponibilidade do Serviço e/ou Conteúdo (e quaisquer elementos e características deles) no todo ou em parte, por qualquer razão", assim, a "compra" digital é uma licença que pode ser revogada, quando a Sony, no caso, achar que deve. A posse de um produto de mídia, como sempre, continua sendo dos estúdios, produtores e desenvolvedores, dos quais distribuidores como Apple, Sony e Amazon, tiram sua parte.

A Funimation continuou vendendo as mídias até bem recentemente, contemplando séries clássicas como Dragon Ball (todas as fases), One Piece e Robotech, a versão americana de Superdimension Fortress Macross, e mais recentes como Attack on Titan; filmes também foram distribuídos, incluindo uma versão remasterizada de Akira.

Funimation vendeu mídias físicas de várias séries e filmes em anime (Crédito: Reprodução/Sony)

Funimation vendeu mídias físicas de várias séries e filmes em anime (Crédito: Reprodução/Sony)

O caso atual é similar ao da Amazon, pois envolve uma mudança no plano de negócios da Sony em relação ao streaming de animes. Fechar a Funimation e manter apenas a Crunchyroll, com o catálogo de ambos serviços, é o mais sensato a fazer, mas esta não suporta as compras digitais disponíveis no primeiro, e não o fará.

Os usuários que compraram DVDs ou Blu-rays, mas se livraram deles para ficar apenas com as cópias digitais, ou não possuem mais reprodutores dedicados para rodar os discos, perderão completamente o acesso aos conteúdos que adquiriram legalmente, e a Sony não fará reembolsos de nenhum tipo; tecnicamente, os usuários ainda deveriam possuir as mídias físicas, mas sabemos que este não deve ser o caso de muita gente.

Ainda assim, a mudança contradiz o "acesso para sempre" prometido no passado pela Funimation, mas de novo, companhias usam a carta da licença de uso, que pode ser revogada mesmo envolvendo compra de conteúdos, o que está especificado nos Termos de Uso.

Por fim, a Funimation está notificando seus usuários legados sobre um reajuste na assinatura em 2025, pois os valores praticados pela Crunchyroll são maiores. Quem adquiriu o plano anual de US$ 54,95 manterá o acesso até o fim do período adquirido, mas depois disso, a renovação custará US$ 99,99, uma diferença de quase 82%.

A assinatura mensal da Crunchyroll sai por US$ 7,99 no plano Fan, o mais barato (R$ 25/mês no Brasil), o que dá US$ 95,88 em um ano, próximo aos US$ 100 que serão cobrados dos assinantes migrados da Funimation; quem já assina o agora serviço principal não terá que pagar mais... por enquanto.

Quando a Netflix surgiu, muitos comemoraram por ela ser a materialização do mantra de Gabe Newell, presidente da Valve, de que "a pirataria se combate com bons serviços e preços", algo aplicável ao Steam em relação a jogos, mas mesmo este não ficou imune à balcanização da distribuição digital, onde hoje temos Epic Games, GOG, EA, Ubisoft, cada um com sua lojinha e lançamentos exclusivos.

Com o streaming foi o mesmo, hoje temos serviços diversos como Amazon Prime Video, HBO Max, Apple TV+, Paramount+ e vários outros, cada um com sua caixinha de exclusivos, cada um cobrando um valor. Os animes tiveram a Funimation e a Crunchyroll como os dois principais hubs concorrendo entre si, até a Sony comprar a segunda, o que inclusive levantou preocupações de reguladores, quanto à criação de um monopólio.

A solução para muitos, como sempre... (Crédito: Reprodução/Toei Animation/Crunchyroll/Sony)

A solução para muitos, como sempre... (Crédito: Reprodução/Toei Animation/Crunchyroll/Sony)

Hoje, há quem diga que o pé atrás do Departamento de Justiça dos EUA foi justificado, pois as opções para streaming legal de animes, de um serviço especializado, se resumem a uma só plataforma (há algumas produções em outros serviços, claro), que pode se dar ao capricho de cobrar o quanto quiser, e a remoção do acesso aos conteúdos comprados na Funimation, somado ao aumento significativo no valor da assinatura para estes no futuro, está irritando muita gente.

Este, muito provavelmente, já estão abrindo o baú para recuperar seus chapéus de pirata, e voltar, mais uma vez, a recorrer à Locadora do Paulo Coelho.

Fonte: Funimation

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