Meio Bit » Entretenimento » Dear David e o cinema na era pós-Web 2.0

Dear David e o cinema na era pós-Web 2.0

Sinal dos tempos: Dear David é uma história de terror que foi contada no Twitter e que, seis anos depois, está perto de chegar ao cinema

27 semanas atrás

No dia 7 de agosto de 2017, Adam Ellis publicou um fio que viralizaria no Twitter. Seis anos depois, a história conta com mais de 74 mil curtidas, 46 mil compartilhamentos e quase 15 mil comentários, mas ainda mais impressionante, aquela publicação daria origem a um filme de terror e agora estamos perto de conhecer o longa Dear David.

Dear David

Crédito: Divulgação/Buzzfeed Studios

Trabalhando como cartunista para o site Buzzfeed, Ellis começou seu relato afirmando acreditar que o seu apartamento estava sendo assombrado pelo espírito de uma criança. Segundo ele, tudo começou quando foi dormir e teve algo pelo qual talvez você já tenha passado, a paralisia do sono.

Neste distúrbio, uma "falha de comunicação" entre o cérebro e o restante do corpo faz com que, mesmo acordada, a pessoa seja incapaz de mover seus músculos ou mesmo falar. E no caso de Ellis, isso fez com que ele permanecesse deitado na cama enquanto via um menino sentado numa cadeira de balanço ao lado.

Tal situação já seria suficiente para aterrorizar muita gente, mas ela tinha um agravante. A criança apresentava uma deformidade na cabeça, como se metade dela estivesse amassada. Para piorar, após algum tempo o garoto se levantou, começou a caminhar na direção do rapaz e só quando ele estava perto de tocá-lo, Adam conseguiu acordar, obviamente, bastante assustado.

A assustadora criança, pelo traço de Adam Ellis (Crédito: Reprodução/Adam Ellis)

Algumas noites depois, Ellis diz ter sonhado que estava numa biblioteca, quando uma menina se aproximou dele e perguntou: “Você viu o Querido David, não viu?” O diálogo que ele travou com a garota foi o seguinte:

“Quem? E ela disse, ‘o Querido David. Você o viu.’

Ela continuou, ele está morto. Ele só aparece a meia-noite e você pode lhe fazer duas perguntas se disser ‘Querido David’ primeiro. Porém, nunca lhe faça uma terceira pergunta, ou ele matará você.”

Aquela passagem provavelmente ficou rondando a mente de Adam Ellis, até que alguns dias se passaram e numa noite o rapaz novamente sofreu com a paralisia do sono. Sentado na cadeira, o menino o encarava sem dizer nada, até que o assustado rapaz decidiu perguntar: “Querido David, como você morreu?”

Naquele momento, o garoto murmurou que teria acontecido um acidente numa loja e Adam fez outra pergunta: “Querido David, o que aconteceu na loja?” A resposta veio na forma de um gemido, com o fantasma revelando que uma prateleira foi empurrada sobre sua cabeça.

Assustado, mas querendo saber mais detalhes, o artista questionou quem teria empurrado a prateleira e quando se deu conta do erro que havia cometido, afinal aquela era a terceira pergunta que ele jamais deveria fazer, acordou aterrorizado.

Para quem ficou curioso sobre o que aconteceu nos dias seguintes, a publicação de Ellis ainda está disponível, mas como a história está perto de chegar ao cinema, evitarei dar spoilers. Sim, pode parecer loucura, mas Dear David é um filme que começou sua produção há dois anos e que mostra como a internet abriu as portas para que o público deixasse de ser apenas um receptor de mensagens, para se tornar também um emissor.

Crédito: Reprodução/Youtube

Dirigido por John McPhail (Anna e o Apocalipse, Where Do We Go from Here?), Dear David fará algumas mudanças em relação à história original, colocando o menininho como uma conta que passa a seguir o protagonista no Twitter e que foi vítima de uma mãe descontrolada. Porém, essa liberdade poética é o menos importante aqui.

O que chama a atenção na produção do Buzzfeed Studios (A Queda, O Demônio dos Mares) sem dúvida é a sua inusitada origem. Alguns poderão dizer que aproveitar uma história contada numa rede social não passa de preguiça ou falta de criatividade dos roteiristas, mas não podemos ignorar o conceito criado por Tim O’Reilly há 20 anos, quando ele cunhou o termo Web 2.0 e falou sobre o aproveitamento da inteligência coletiva.

Mas mesmo que a proposta de O’Reilly não passe de uma jogada de marketing e que a história contada por Adam Ellis tivesse como objetivo apenas viralizar, é inegável o poder da internet — e das redes sociais — em permitir que qualquer pessoa possa ser ouvida por qualquer pessoa.

Vamos supor que desde o início o caso do Querido David tenha sido pensado para chegar aonde chegou, as telas do cinema, mas que tivesse surgido na década de 80 ou 90. Ellis certamente teria uma grande dificuldade em encontrar um estúdio disposto a filmá-lo. Talvez o conto nem chegasse nas mãos de algum produtor e assim, a única oportunidade do autor poderia ser através da publicação de um livro, o que também não seria tão simples.

Dear David

Crédito: Divulgação/Buzzfeed Studios

Porém, nos tempos atuais, bastou fazer sua publicação numa rede social, contar com um pouco de sorte para que as pessoas se interessassem pela história e depois colher os frutos de uma adaptação. Pode ser que Adam Ellis nunca tenha pensado tão grande, mas tenho certeza de que ele não está triste por ter vendido os direitos para pessoas interessadas em transformar sua história em um filme.

Infelizmente, essa liberdade também acabou dando voz àqueles que se sentem protegidos atrás de uma tela para desferir todo tipo de estupidez, fazendo com que as redes sociais ou espaços de comentários em sites sejam vistos como terras de ninguém e que devem ser evitados. No entanto, isso não pode servir para desqualificar uma ferramenta tão poderosa quanto a internet, especialmente a partir do momento em que ela nos permitiu ser, também, os emissores.

Quanto a qualidade que Dear David nos entregará, pode ser que ele se mostre apenas mais um filme de terror medíocre, com uma história rasa e sem situações realmente assustadoras. Porém, eu estou disposto a lhe dar uma chance, nem que seja pela curiosidade, até porque, não é todo dia que vemos um fio do Twitter sendo levado para as telonas.

Leia mais sobre: , , , .

relacionados


Comentários