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Raspberry Pi 10 anos: o PCzinho barato que serve para tudo

Confira a história do Raspberry Pi, o computador de placa única simples de usar e barato, que se tornou imensamente popular

2 anos atrás

O Raspberry Pi, o computador de placa única (SBC) mais popular do mundo completou 10 anos em 2022. Desenvolvido como um produto pera entusiastas, estudantes e usuários de menor poder aquisitivo, graças ao seu custo final irrisório em comparação a PCs tradicionais, ele se tornou uma sensação e a espinha dorsal de diversos projetos comerciais, educacionais e independentes.

Da esq. para a dir.: Raspberry Pi 4 de 8 GB de RAM, Raspberry Pi 4 de 4 GB e Raspberry Pi 3; à frente, Raspberry Pi Zero W (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Da esq. para a dir.: Raspberry Pi 4 de 8 GB de RAM, Raspberry Pi 4 de 4 GB e Raspberry Pi 3; à frente, Raspberry Pi Zero W (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Vamos dar uma olhada em tudo começou, e como o Raspberry Pi e seus vários modelos se tornaram populares.

Nos primórdios...

O Raspberry Pi foi desenvolvido por um time do departamento de TI do St. John’s College, parte da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. Eben Upton, Rob Mullins, Jack Lang e Alan Mycroft notaram que o número de inscritos nos cursos de computação estava caindo, e os que ingressavam vinham com cada vez menos conhecimentos básicos, praticamente "virgens" em informática.

O grupo atribuiu o fenômeno à falta de computadores acessíveis no mercado britânico, como o ZX Spectrum, projetado por Clive Sinclair, e o BBC Micro, desenvolvido por Sophie Wilson, um dos primeiros computadores pessoais embarcado com um processador ARM, também desenhado por ela.

Embora PCs sejam relativamente acessíveis, não dá para comparar os custos de centenas de dólares, libras ou euros, com projetos do passado que raramente batiam a casa dos US$ 100, que permitiram a muita gente entrar na área da computação, principalmente quem não tinha grana sobrando.

Eben Upton, co-fundador da Raspberry Pi Foundation, e seu xodozinho (Crédito: Divulgação/Raspberry Pi Foundation)

Eben Upton, co-fundador da Raspberry Pi Foundation, e seu xodozinho (Crédito: Divulgação/Raspberry Pi Foundation)

Após Upton conseguir um emprego como arquiteto de SoCs na Broadcom, ele e os demais, que fundaram a organização sem fins lucrativos Raspberry Pi Foundation em 2009, começaram a desenvolver o projeto que viria a se tornar a primeira geração do Raspberry Pi. O dispositivo em questão deveria ser uma solução em si mesma, com o máximo de componentes integrados, de modo a permitir que ele fosse usado bastando conectar teclado, mouse, monitor/TV e internet.

O custo final para o consumidor deveria ser o menor possível, e exatamente por isso o SBC em si nunca contou com armazenamento próprio. O usuário deve adicionar unidades externas, seja um cartão microSD, a opção padrão, ou HDs/SSDs conectados via porta USB.

Lançado oficialmente em 29 de fevereiro de 2012, o Raspberry Pi Mobel A possuía um form factor ligeiramente diferente das gerações atuais. Além da porta HDMI, ele contava com outra RCA, para uso com TVs de tubo (CRT) antigas.

O conector GPIO (General Purpose In/Out, ou Entrada e Saída para Uso Geral), portas programáveis que conectam a entrada e saída de dados e energia de forma direta, entre microcontroladores da placa e dispositivos externos contava com apenas 26 pinos, contra 40 dos modelos mais novos.

Por fim, o primeiro Raspberry Pi contava com apenas duas portas USB 2.0, e não possuía conectividade sem fio, seja Bluetooth ou Wi-Fi, adicionados apenas no Raspberry Pi 3.

O mais importante, no entanto, era fixar o preço final em uma faixa que tornasse o Raspberry Pi acessível a qualquer um. Ele foi disponibilizado pelo preço original de US$ 35, no modelo mais modesto com 256 MB de memória RAM (havia também um com 512 MB). O processador era um Broadcom BCM2835, com clock de 700 MHz e GPU VideoCore IV.

O objetivo de Upton e cia. era fornecer um dispositivo completo, para estimular jovens a estudar programação e desenvolvimento com um computador barato, como o ZX Spectrum e o BBC Micro foram em tempos passados. Ao mesmo tempo, a plataforma seria flexível o bastante para permitir que fuçadores e entusiastas encontrassem usos inovadores para o SBC, embora esse não fosse o foco principal.

Raspberry Pi Model B original: porta RCA, apenas 2 USB 2.0, sem Wi-Fi (Crédito: Divulgação/Raspberry Pi Foundation)

Raspberry Pi Model B original: porta RCA, apenas 2 USB 2.0, sem Wi-Fi (Crédito: Divulgação/Raspberry Pi Foundation)

No mesmo ano de 2012, a Raspberry Pi Foundation lançou uma revisão mais modesta, o Raspberry Pi Model A, especificamente para usuários avançados, sem a porta Ethernet e apenas uma USB, mas por um preço menor, US$ 25.

Com o tempo, o Model B recebeu revisões e mudou de formato, assumindo hoje o visual mais conhecido, com 4 portas USB-A (2 delas 3.0) e um conector GPIO de 40 pinos, expansão essa que custou a porta RCA; o sinal analógico de vídeo é hoje fornecido com o de áudio, pela porta P2 de 3,5 mm.

Os modelos mais recentes contam com CPU de 1,8 GHz, 1, 2, 4 ou 8 GB de RAM, duas portas microHDMI com suporte a 4K e conectividade sem fio, sempre com o modelo mais em conta custando US$ 35.

Raspberry Pi para as massas

O que Eben Upton e o time da Raspberry Pi Foundation não anteciparam, era que o Raspberry Pi fosse se tornar tão popular, e atendesse inúmeros casos de uso não planejados. Os planos eram direcionados para o uso como um computador de mesa, tanto que a instituição desenvolveu uma distro Linux própria baseada no Debian, chamada Raspbian, hoje Raspberry Pi OS.

Não obstante, o Raspberry Pi era uma resposta de baixo custo e funcional aos netbooks, e algo mais próximo do OLPC (Um Laptop Por Criança), o projeto de Nicholas Negroponte, promovenod a distribuição do produto para países em desenvolvimento.

Bastaria instalar o SO em um cartão microSD, adicionar teclado, mouse, uma TV via cabo HDMI ou RCA (na época), uma fonte de energia adequada (embora não seja ideal, qualquer fonte de celular serve), e sair usando.

No entanto, o computador de placa única foi massivamente adotado entre micreiros, curiosos e fuçadores, e implementado em projetos dos mais variados. Entusiastas de robótica estão entre os mais criativos defensores do micro PC, que também já foi usado como o cérebro de um equipamento amador de astrofotografia, por um custo bem baixo.

O Raspberry Pi 3 (na foto, o modelo B+) foi o primeiro com Wi-Fi e Bluetooth integrados (Crédito: Divulgação/Raspberry Pi Foundation)

A comunidade gamer também adorou o SBC. Diversos forks do Raspbian foram desenvolvidos, com foco em emulação de uma enorme quantidade consoles antigos, desde os mais conhecidos aos mais improváveis e obscuros, tornando o Raspberry Pi uma das mais poderosas, e baratas, máquinas de emulação.

Oficialmente a Raspberry Pi Foundation não dá muito enfoque nas capacidades para games antigos do seu produto, por razões óbvias, mas estimula desenvolvedores a criarem títulos novos 100% compatíveis.

Fazendo mais com (e por) menos

Em 2013, a fundação recebeu um aporte de US$ 1 milhão de ninguém menos que o Google, de modo a financiar a produção dos PCzinhos e sua distribuição em todo o globo, especialmente para usuários com menos poder aquisitivo. Segundo Eben Upton, na época ele foi questionado por Eric Schmidt, ex-CEO da gigante das buscas e na época diretor da holding Alphabet Inc., sobre o que eles fariam a seguir.

Upton respondeu que sua equipe planejava lançar uma versão mais poderosa do Raspberry Pi, que deveria custar entre US$ 50 e US$ 60, o que acabou lhe rendendo um puxão de orelha do executivo. Ao invés de ir na direção de todo o mercado, e oferecer algo mais potente e mais caro, que não seria interessante para boa parte da base instalada original, Schmidt apontou na direção contrária:

"Ele (Schmidt) disse ser muito difícil competir no mercado de computadores baratos (...). O ideal seria lançar um produto mais potente pelo mesmo preço, e então desenvolver uma versão tão potente quanto o original, mas mais barata (...). Ele apresentou um ponto bem convincente. Foi uma conversa reveladora."

De fato, havia poucos produtos similares e concorrentes diretos disponíveis, mas eles estavam começando a aparecer. Um projeto que chamou muito a atenção foi o CHIP, um SBC de apenas US$ 9, e nos anos seguintes, empresas como ASUS e Huawei também tentariam morder o mercado, mas sem entender que o preço baixo era um fator decisivo.

Em 2015, o Raspberry Pi 2 Model B chegou com CPU mais potente, 1 GB de RAM e outras melhorias, pelo mesmo preço de US$ 35, estratégia que se manteve com as gerações seguintes. No mesmo ano, a instituição chutou o balde e introduziu o Raspberry Pi Zero, um dispositivo ultracompacto e ligeiramente mais potente do que a 1ª geração do Model B, com um preço irrisório de CINCO DÓLARES.

O valor foi tão amortizado que ele foi encartado em todas as edições da revista The MagPi, no mês de lançamento, totalmente de graça. Claro que a edição (e todas as outras que repetiram o feito) evaporaram em minutos.

As variações do Pi Zero contam com Wi-Fi e Bluetooth, ausentes no original, e uma delas, a WH, traz a pinagem instalada e completa da porta GPIO, que no original conta apenas com os conectores abertos.

Primeira versão do Raspberry Pi Zero; lata de balas para escala (Crédito: Reprodução/acervo internet)

Primeira versão do Raspberry Pi Zero; lata de balas para escala (Crédito: Reprodução/acervo internet)

Hoje, a linha conta com o RPi Model B, o tradicional para uso principalmente como desktop, o Model A, para projetos mais direcionados, o Zero, de baixíssimo custo, e o Pico, um microcontrolador de US$ 4 que segue a mesma proposta do Arduino. Correndo por fora há o Compute Module, uma versão do Pi 4 para aplicações industriais.

Em 2020, a família foi completa com a chegada do Raspberry Pi 400, um kit de US$ 70 (US$ 100 com mouse, cartão SD, cabo HDMI e fonte) com 4 GB de RAM, CPU Broadcom de 1,8 GHz (o Pi 4 originalmente usava uma de 1,5 GHz, depois adotou a mesma deste modelo) e teclado integrado, fechando o ciclo e homenagem aos computadores baratos de outrora.

Para conferir dicas de projetos, recomendamos o The Official Raspberry Pi Handbook, um guia completo sobre o que fazer atualizado anualmente, e distribuído digitalmente de graça, pelo site oficial.

Raspberry Pi 400 (Crédito: Divulgação/Raspberry Pi Foundation)

Raspberry Pi 400 (Crédito: Divulgação/Raspberry Pi Foundation)

Para quem tem tempo para ler e fuçar, uma boa pedida é baixar todas as edições da revista The MagPi, e todos os livros publicados pela fundação, tudo absolutamente digrátis.

Claro que há algumas limitações para o Raspberry Pi. Embora seja desenvolvido para uso primário como um desktop barato, ele apresenta restrições quando precisa lidar com sistemas diferentes do que o originalmente desenvolvido, ou seus diversos forks. A distro Ubuntu, embora a Canonical ofereça suporte, exige mais do hardware por trazer mais recursos.

Nem vamos entrar no mérito de experimentos completamente fora da curva e não suportados oficialmente, como rodar Windows no SBC. Por outro lado, a Microsoft oferece suporte para usuários do VS Code via repositório, o que enfureceu os usuários Linux mais xiitas (leia-se a ala freetard, que digita Ruindow$).

Raspberry Pi 4 é o atual carro-chefe (Crédito: Laserlicht/Wikimedia Commons)

Por fim, e especificamente para o consumidor brasileiro, o preço de qualquer unidade do Raspberry Pi se tornou bem salgado, visto a desvalorização tresloucada do real e a escassez de componentes, como tudo relacionado a computação e dispositivos móveis, embora não tão caro quanto o mais modesto dos notebooks.

Na data de publicação deste texto, apenas o Raspberry Pi 400 se encontrava disponível, via revenda oficial e homologado pela Anatel, no que US$ 70, ou ~R$ 350,46 em conversão direta (cotação de 18/03/2022), se tornam absurdos R$ 1 mil.

Ainda assim, o Raspberry Pi e suas várias variáveis oferecem inúmeras possibilidades de uso, para os mais variados perfis de usuário, desde quem procura um PCzinho acessível para estudar programação, a projetos de fim de semana para estmular o Espírito Hacker, ou quem está a fim de montar um dispositivo para emular todos os games do passado.

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