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Houston, o Falcão Pousou!

Houston, o Falcão pousou! Elon Musk faz história com o primeiro pouso vertical de um foguete reutilizável.

8 anos atrás

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Imagine que você fosse viajar do Rio pra São Paulo. Você entra em um A320 e só há mais dois passageiros: o avião decola, pousa no destino e é destruído. Sairia extremamente caro voar assim, mas é exatamente essa forma com que vamos ao espaço atualmente.

Na exploração espacial atual a única coisa reutilizável são os astronautas e nem assim a taxa é 100%. Shuttles assim como Lamborghinis são lindos em pôsters de quartos de adolescentes mas o custo real de manter um bicho daqueles é absurdo. Um lançamento de Shuttle custava mais de US$ 450 milhões. Exigia meses de preparação e meses de estaleiro para a nave decolar de novo. 

Ontem isso mudou. Ontem um programa espacial começado em 2002 fez História. Depois de 2 testes quase bem-sucedidos no mar, e vários testes de reentrada, a SpaceX convenceu a Força Aérea de que era capaz de controlar o foguete na descida, e conseguiu permissão para tentar um pouso em terra.

Isso é importante, bases de pouso no solo tendem a se mover bem menos que plataformas no mar, e o Falcon 9 não tem segunda chance. Como o único motor Merlin ligado durante a descida é potente demais, e só pode ser acelerado entre 70% e 100% da potência, eles tem que regular a descida para que o foguete chegue a altitude zero com velocidade vertical zero.

É mais fácil quando a altitude zero é uma constante, não uma variável.

Mesmo assim a analogia da SpaceX mostra a complicação: você tem que atirar um lápis por cima do Empire State, ele faz a volta, desce desacelerando e cai em pé em uma caixa de sapatos.

Eles conseguiram. 6 meses atrás uma cápsula Dragon foi perdida quando um Falcon 9 explodiu durante o lançamento. Ao invés de dar uma de Brasil e chorar pitangas por 13 anos, a SpaceX sentou a bunda, descobriu o erro, corrigiu, upgradeou o foguete e terminou com um Falcon 9 com 30% a mais de potência, entre inúmeras melhorias.

Ontem, 21 de dezembro de 2015, fizeram um novo lançamento, levando onze satélites da Orbcomm, uma empresa que presta serviços de comunicação M2M (machine to machine, tipo Skynet).

Precisamente no momento T + 2 min 26 s de vôo o primeiro estágio cumpriu sua função, acelerando o segundo estágio a uma velocidade de 5.970 km/h. A uma altitude de 77,1 km eles se separaram. O resto do Falcon 9 prosseguiu para cumprir a missão de colocar em órbita os 11 satélites.

O primeiro estágio executou um giro de 180 graus e, acionando 3 dos 9 motores Merlin, começou a desacelerar em uma curva ascendente chegando a quase 100 km de altitude.

Na descida ele fez uma primeira queima para perder velocidade. Nessa hora as aletas de controle que a SpaceX chama de X-Wings foram acionadas. O Falcon começou uma descida via propulsão gravitacional, em uma manobra conhecida no Kerbal como descida suicida, até que nos últimos segundos o motor foi novamente ligado, até o pouso, perfeito. Veja o momento emocionante da chegada:


SpaceVids.tv — Historic Landing of Falcon 9 First Stage at Landing Zone 1

Nesta longa exposição, a decolagem e o pouso. Você NUNCA viu nada assim antes.

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Para ter uma idéia do tamanho do bicho:

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O que isso representa em termos práticos?

Bem, um Falcon 9 custa US$ 16 milhões para ser construído. O combustível para reabastecer o foguete custa US$ 200 mil. Metade do custo de abastecer um Boeing 747. Ao não jogar fora o primeiro estágio, ele pode ser inspecionado, reabastecido, um novo segundo estágio encaixado e lançado de novo.

Os planos da SpaceX são inclusive no caso dos pousos nas balsas, que ocorrerão quando a carga lançada por pesada demais e não sobrar muito combustível, reabastecer o foguete e mandá-lo voando para a base em terra.

Aqui o pouso visto de um helicóptero:


SpaceX — Falcon 9 First Stage Landing | From Helicopter

Mesmo com todos os custos de inspecionar e certificar o foguete para novos vôos, estima-se que na pior das hipóteses, ruim mesmo, o custo de um lançamento cairá 75%. Há quem chute pra casa de 90%.

Musk quer agora uma frota de foguetes, seu plano de colonizar Marte está se encaminhando perfeitamente, já deve até ter comprado as sementes, ou seja lá como se plantam batatas.

Quanto ao Falcon 9, assim como os ratos que sobreviveram aos primeiros vôos espaciais será totalmente dissecado, provavelmente nunca voará de novo. Descobrirão o que funcionou e o que deu defeito, e como todo projeto de engenharia, algo com certeza deu defeito. Tudo será consertado, reforçado ou reprojetado, e o próximo Falcon 9 que subir será melhor ainda.

Para dar uma idéia da manobra, veja este gráfico do vôo:

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Ida e volta foram quase 300 km, altitude de uns 140 km e um pouso perfeito, mirando no centro do alvo, com direito a um estagiário pra ajudar na baliza:

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Qual a precisão que conseguiram? Veja esta imagem:

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Finalizando, parte da mídia, principalmente a brasileira está dizendo que o Falcon 9 foi o segundo foguete a pousar verticalmente, por causa do vôo do Blue Sheppard, mas como expliquei neste vídeo aqui, não é assim que a banda toca.

O Blue Sheppard fez um vôo vertical mal atingindo o limite do espaço, as forças envolvidas no Falcon 9 são ordens de magnitude maiores. Sem falar no tamanho.

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O foguete de Jeff Beezos tem que subir e descer em linha reta, o do Musk tem que colocar uma carga útil em órbita, dar ré e pousar num campo a 9 km de distância do ponto de origem. Veja a diferença, neste gráfico que o Wallacy achou pra gente:

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A manobra do Falcon 9 não é muito mais fácil do que fazer a travessia de Kessel em menos de 12 Parsecs, mas ele conseguiu. É o mínimo que se espera de um foguete batizado em homenagem ao Millennium Falcon. A Força é forte nele.

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