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Putin quer criar console, nuvem e sistema operacional

Putin quer tornar a Rússia autossuficiente, desenvolvendo console, nuvem e sistema operacional próprios. Não vai acontecer

10/04/2024 às 13:58

Console é novidade, mas a ideia do mano Vladmir nem pode ser considerada original ou revolucionária. Na verdade, faz parte da cartilha de todo bom ditador, é um dos princípios básicos para se manter no poder.

Putin no fundo não gosta de console (Crédito: Stable Diffusion)

Controle dos meios de produção é para amadores, o bom mesmo é controlar os meios de comunicação, por isso toda revolução de bananas que se preza, imediatamente toma conta das emissoras de rádio e TV. E hoje em dia, tira internet do ar.

Projetos como esse dos consoles e SOs russos seguem o mesmo caminho. A Melhor Coreia tem o seu sistema operacional próprio, o Red Star OS (붉은별 사용자용체계), uma distro Linux repleta de ferramentas de monitoramento e controle, para que os usuários acessem somente sites e softwares autorizados por Pyongyang.

Red Star OS, segundo a Wikipedia (Crédito: a mesma)

A China tem seu Red Dragon Linux, mas são mais liberais, muita gente roda Windows e macOS por lá, o controle é feito indiretamente, através do Grande Firewall, e de filtros implantados nas empresas, como o Google, onde nenhum resultado aparece para buscas sobre a Praça Tianamen.

Ainda a China, a relação entre o país e videogames é... complexa. Entre 2000 e 2015 consoles estavam banidos. Depois disso foram lançados vários consoles para o mercado local, que conviviam com o importabando generalizado, principalmente vindo do Japão.

Como o governo chinês nunca foi fã de games, impondo restrições severas, censurando conteúdo e banindo games que atentassem contra os valores culturais locais, o que dificultava muito o lançamento de novos títulos.

Claro, a boa e velha hipocrisia do regime marketista-leninista de Pequim deixou surgir empresas como a Tencent, uma das maiores empresas de videogames no mundo.

O seu LoLzinho de fé todo fim de tarde? A Tencent comprou a Riot, você paga para a China agora (Crédito: Divulgação/Riot Games/Tencent)

No campo das redes sociais, a China baniu Twitter, Facebook, Instagram, WhatsApp, YouTube, Snapchat, Reddit, Tumblr e boa parte dos serviços do Google, como Maps e Gmail. Alternativas locais foram oferecidas, como WeChat, Weibo, o Twitter deles, e o YouKu, o YouTube.

Todos esses serviços são censurados e monitorados, um truque sujo muito usado era mandar no chat do game, em chinês, “Massacre Praça Tianamen, 1989”. Em alguns minutos o sujeito era desconectado. Antes do Google implementar filtros diretamente, se você pesquisasse por Tianamen na China, sua conexão cairia em seguida.

Os Simpsons previram isso também (Crédito: Fox, digo, Disney)

Quando Putin fala em produzir consoles, serviços de nuvem e sistemas operacionais, puxa a carta da soberania, e um monte de gente ufanista compra a ideia, sem pensar que um belo dia esse “controle estratégico” poderá se voltar contra eles.

Na prática, essa independência estratégia não existe. O mundo está totalmente globalizado. Nem as superpotências detém todas as tecnologias. A indústria de semicondutores russa, por exemplo, é uma piada. Há vários relatos de russos roubando máquinas de lavar na Ucrânia para reaproveitarem componentes, por causa dos embargos. E os mísseis avançados de Putin? Usam peças feitas nos EUA e em outros países.

Quer dizer, “feitas nos EUA” em termos, podem até ser projetadas nos EUA, mas a manufatura é toda no exterior. Os EUA no momento não possuem nenhuma fábrica de semicondutores de ponta, está tudo concentrado em Taiwan (Com tecnologia dos Países Baixos), e com a China se engraçando, isso pode virar um problema futuro. Por isso, a Administração Biden lançou um programa para que a TSMC monte uma fábrica nos EUA, e o Governo está investindo US$ 6,6 bilhões nisso.

Como disse aquele documentário Armageddom, peças russas, peças americanas, todas feitas em Taiwan.

Essa ilusão de independência tecnológica/controle das comunicações não é de hoje. Em 2009 Hugo Chavez anunciou o Vergatario, um telefone celular “venezuelano” (na verdade, um modelo chinês), que livraria a Venezuela da dependência dos fabricantes americanos e europeus.

Hugo Chavez e o Vergatario, que na Venezuela é gíria para 🍆. A imagem diz muita coisa. (Crédito: Reprodução internet)

Chavez colocou o ufanismo no 12 (o ufanismo dele já vivia no 11) no lançamento:

"É a ciência e a tecnologia a serviço do povo, não das elites... chegará o dia em que fabricaremos telefones para Cuba e para a América Latina"

“Esse telefone será o mais vendido não só na Venezuela, mas no mundo. Quem não tem um Vergatario não é nada.”

Spoiler: Não rolou.

Produzir hardware estatal para controlar as comunicações não é exatamente uma ideia nova. Na Alemanha dos Anos 30 Joseph Goebbels (ou Guebles, segundo um certo Senador da República) criou o Volksempfänger, Receptor do Povo, um programa onde rádios baratos eram vendidos, financiados, e o povo adorou a ideia.

Imagine um governo que do nada sai oferecendo TV de 50 polegadas a R$ 500 para o povo? Adolf Hitler, nunca falei mal!

Claro, os aparelhos vinham com somente estações estatais indicadas no dial, e eram projetados para não pegar transmissões distantes, como a BBC, e a programação das emissoras era 100% voltada para promover os ideais nazistas.

Volksempfänger modelo VE 301 Dyn (Crédito: Domínio Público)

Consoles que só aceitam jogos liberados pela censura estatal, serviços de nuvens que monitoram todos os arquivos enviados pelos usuários, e marcam os suspeitos para posterior avaliação, e sistemas operacionais com root kits impossibilitando ocultar qualquer informação. Isso é um sonho de qualquer governo autoritário, e mesmo de alguns liberais.

Segundo o www.kommersant, um jornal russo, especialistas locais estimam que o país levaria entre 5 e 10 anos para conseguirem produzir consoles próprios, e esses consoles estariam 15 anos atrás da tecnologia ocidental.

Seria o equivalente a alguém lançar em 2024 um PS3.

Claro, seria perfeitamente viável para Putin banir todos os consoles ocidentais, e muita gente concordaria com a ideia, afinal estariam livres dos riscos de espionagem da OTAN através dos videogames. Uma pequena liberdade cedida em troca de segurança.

Algo que também foi previsto por Benjamin Franklin:

“Aqueles que abririam mão da Liberdade essencial, para adquirir um pouco de Segurança temporária, não merecem nem a Liberdade nem a Segurança.”

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