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China quer usar railgun em lançamentos aeroespaciais

NASA chegou a considerar o uso de railguns no passado; China está construindo pista para lançar shuttles do tamanho de um Boeing 737

26/03/2024 às 11:09

A China, diferente dos Estados Unidos, nunca parou de investir nos estudos acerca da tecnologia das railguns, inicialmente e de forma óbvia como armas navais, mas ao que tudo indica, o governo local quer empregá-la em lançamentos espaciais.

Engenheiros chineses estariam construindo uma pista gigantesca para a aceleração de veículos espaciais, shuttles de dimensões próximas à de um Boeing 737 (de 34 m a 42 m, com base nos modelos MAX 7 e MAX 9, respectivamente), mirando objetivos além de órbitas baixas, por uma fração do custo de missões que usam foguetes, mesmo os reutilizáveis da SpaceX.

Governo chinês estaria voltada a aplicar o conceito de railgun à indústria aeroespacial (Crédito: Reprodução/Weibo)

Governo chinês estaria voltada a aplicar o conceito de railgun à indústria aeroespacial (Crédito: Reprodução/Weibo)

O que é uma railgun?

Uma railgun, ou catapulta/canhão elétrico/eletromagnético, é um conceito que surgiu para minimizar os problemas de se usar artilharia explosiva, principalmente em navios. A eficiência de vasos de guerra do passado, como os couraçados, era garantida pela quantidade de pólvora armazenada em seus paióis, que não eram 100% protegidos, como o HMS Hood pode atestar.

O conceito por trás do canhão elétrico visa eliminar o uso de pólvora, empregando trilhos e eletricidade para acelerar um projétil a uma velocidade hipersônica, de Mach 4 a até Mach 7, com base em testes realizados pela Marinha dos Estados Unidos. O poder destrutivo de uma carga acelerada a essa velocidade é puramente energia cinética, e acredite, o estrago não é pouco.

Evidente que acelerar mesmo uma pedrinha consome uma quantidade obscena de energia, e o maquinário de suporte ocupa muito Espaço, mais do que o disponível nos únicos navios que a US Navy considerou adequados, seus três contratorpedeiros classe Zumwalt, dos quais apenas dois estão ativos. E ninguém nem cogita a ideia de mexer com os quatro couraçados classe Iowa, preservados como museus, mas ainda operacionais (thanks, Ronald Reagan) e prontos para uso, se necessário.

A Marinha testou railguns de tudo quanto foi jeito por anos, até o Congresso cortar a verba, alegando que o retorno não era justificável; a tecnologia foi adaptada para as catapultas eletromagnéticas para lançamento de aviões de combate, equipadas inicialmente no porta-aviões USS Gerald R. Ford, mas após uma série de problemas, e críticas diretas do então presidente Donald Trump, as railguns foram canceladas de vez.

Uma pena, os testes eram sempre um espetáculo:

O grande problema para os EUA, a China também estava estudando o uso de railguns, e o país tem muito menos melindres como restrições com orçamento, principalmente se isso significa ter uma vantagem militar sobre os malditos ianques.

Os primeiros testes teriam sido realizados em navios de carga, e em 2023, Pequim apresentou o projeto de um "super porta-aviões" que poderá, eventualmente, ser equipado com um desses brinquedinhos, e por ser movido via reator nuclear, o problema para a geração de energia estaria resolvido; conversão em cinética é outra história.

Claro, a China nunca mostrou nada oficialmente, tudo que envolve o País do Meio nesse assunto vem dos canais de imprensa estatais, e pessoas mentem, na melhor das hipóteses, recorrem a hipérboles. Ainda assim, a proposta a seguir soa interessante, embora não seja inédita.

China quer dominar lançamentos espaciais

De acordo com uma nota do site South China Morning Post (de novo, veículo estatal) publicada em 14 de março de 2024, engenheiros da Corporação Científica e Industrial Aeroespaciais da China (CASIC) estariam construindo uma pista eletromagnética de 2 km de extensão, na província de Shanxi, que seria capaz de acelerar uma carga a Mach 1,6, podendo chegar a até Mach 5.

A pista seria uma implementação do Projeto Tengyun, lançado em 2016, no que a pista aceleraria um shuttle a uma velocidade considerável, e uma vez projetado, ele acionaria seus próprios motores até atingir velocidade de escape, que diminui conforme a altitude. Isso economizaria enormemente a quantidade de combustível necessária, e reduziria bastante os custos de uma missão. A pista eletromagnética não está sendo projetada para lançar um bólido sozinha, mas para poupar custos.

Agora, os problemas: lançar uma espaçonave do tamanho idealizado, que poderia pesar de 50 t para cima, a uma velocidade de Mach 5, ou mesmo de Mach 1,6, implica em uma quantidade insana de energia gasta, que inevitavelmente viria de um reator nuclear. Não obstante, o projeto dependeria de avanços consideráveis em supercapacitores e conversores, para redirecionar e controlar a energia necessária para o lançamento.

Se a China não estiver blefando, Elon Musk, Arianespace e cia. terão um concorrente de peso no futuro (Crédito: Divulgação/SpaceX)

Se a China não estiver blefando, Elon Musk, Arianespace e cia. terão um concorrente de peso no futuro (Crédito: Divulgação/SpaceX)

Esse foi um dos motivos que fez a NASA desistir da empreitada; nos anos 1990, a agência espacial norte-americana construiu uma pista de testes de 15 m, que apresentou uma série de desafios tecnológicos, mais a má vontade do Congresso, que (finja surpresa) limitou a verba disponível.

Por fim, a China joga com a carta de dominar o mercado aeroespacial através do custo. Cientistas projetam que, caso a pista eletromagnética se prove viável, o custo de lançamentos em órbita cairá vertiginosamente, chegando a uma margem estimada de US$ 60 por quilo; a título de comparação, a SpaceX de Elon Musk, hoje a que cobra mais barato, tem um preço médio de US$ 3 mil/kg.

Se a China está falando sério sobre suas capacidades de usar o conceito de railguns para lançar cargas e shuttles ao Espaço, isso veremos com o tempo, mas em caso positivo, o projeto pode chacoalhar bastante o mercado, e incomodar os investidos na exploração comercial, se o país oferecer seus serviços por uma fração do que os concorrentes cobram.

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