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Nightdive Studios e a arte da preservação

Para diretor do Nightdive Studios, preservar jogos antigos é também uma arte e como tal, as pessoas que os criaram devem ser tratadas como artistas

25/03/2024 às 10:37

Quando o assunto é relançar títulos que estrearam há 30, 40 anos, algumas pessoas enxergam nisso uma mera forma de lucrar com o saudosismo dos fãs, enquanto outros preferem encarar a situação como um esforço de preservação histórica. Para o pessoal do Nightdive Studios, isso é arte!

Star Wars: Dark Forces - Nightdive Studios

Star Wars: Dark Forces, um clássico, ainda melhor (Crédito: Divulgação/Nightdive Studios)

Fundado em 2012 por Stephen Kick, quando este estava na Guatemala e descobriu que não poderia jogar o System Shock 2 porque seu CD parou de funcionar e não havia maneira legal de adquirir legalmente outra cópia do jogo, desde então o estúdio se tornou uma referência em resgatar jogos que estavam perdidos no passado e a explicação para isso está na maneira como seus executivos enxergam os clássicos.

“Acho que a questão de os jogos serem arte foi respondida mais do que suficiente,” disse o diretor de negócios da Nightdive Studios, Larry Kuperman. “Mas passando para o próximo nível, se todos nós concordamos que os jogos são arte, então as pessoas que criam os jogos são artistas e merecem ser lembradas dessa forma e merecem ter seus nomes incorporados no que fizermos daqui para frente.”

Mas como isso poderia ser feito? Como uma desenvolvedora pode contribuir para manter vivos não apenas os jogos, mas a história daqueles que trabalharam nas suas criações? Pois eu diria que respeitando aquilo que esses profissionais fizeram e considerando um exemplo citado por Kick, é justamente isso o que sua empresa tem se esforçado para fazer.

Quake II continua lindo (Crédito: Reprodução/Dori Prata/Nightdive Studios)

O projeto em questão foi aquele dedicado a relançar o Quake II, um jogo adorado por muitas pessoas e que graças a dedicação da Nightdive, retornou com partidas online, uma nova expansão chamada Call of the Machine, suporte à resolução 4K, WideScreen, melhorias nas animações, inteligência artificial e o interessante conteúdo Vault.

“Eles nos deram acesso a arquivos do trabalho do passado e foi sugestão deles que incorporássemos aquilo ao lançamento do Quake II,” revelou Stephen Kick. “Então assim o Vault foi concebido e ele foi recebido tão bem pela comunidade.”

Disponível no menu principal do jogo, o que esse “cofre” traz é um passeio pelos bastidores da criação do jogo, nos apresentando a materiais como artes conceituais, inimigos que nunca chegaram a ser aproveitados e mapas que não tiveram a oportunidade de aparecer na versão final.

Quake II Vault - Nightdive Studios

O Vault, no Quake II (Crédito: Reprodução/Dori Prata/Nightdive Studios)

Para boa parte das pessoas, esse é o tipo de recurso irrelevante, algo que elas provavelmente nem chegarão a acessar. Já para quem se interessa pela preservação de jogos ou gosta de conhecer detalhes sobre suas criações, algo no estilo do Vault funciona como um baú do tesouro, com sua ausência sendo sentida por todos em relançamentos que se dispõem a apenas oferecer um jogo antigo.

Outro exemplo é o Star Wars: Dark Forces Remaster, que conta com um estágio chamado The Avenger. Criado para a demo que estava disponível durante a CES 1995, somente com essa remasterização as pessoas que não participaram daquela feira ganharam a chance de jogar a fase, algo que exigiu que algumas mudanças fossem implementadas e obviamente, demandou tempo e mão de obra do Nightdive Studios.

Mas restaurar esse tipo de material desconhecido ou mesmo os jogos que fizeram sucesso no passado não é apenas uma questão de dedicação. Para Kick e Kuperman, infelizmente o interesse em preservar a história é algo que só ganhou força recentemente e por causa disso, muita coisa está perdida.

Vez ou outra a sorte acaba batendo na porta dos estúdios que tem investido nesta área, como aconteceu com eles mesmos e o primeiro System Shock. Recriar aquele influente FPS da LookingGlass Technologies era algo que eles queriam muito, mas o trabalho só pode ser realizado após o código-fonte para PC ser encontrado em uma pasta guardada em um velho Mac que pertenceu ao cofundador do estúdio, Paul Neurath.

System Shock - Nightdive Studios

O belo remake do System Shock (Crédito: Divulgação/Nightdive Studios)

Há também a questão do quão mal estão preservados esses conteúdos, seja pela maneira como foram armazenados, seja pelos contratos que protegem os detentores dos direitos sobre o produto. Neste caso, estamos falando de contratos que foram impressos e guardados fisicamente ou de marcas transferidas para outras pessoas, sendo muito difícil rastrear quem as controlas atualmente.

Mas para a sorte de quem não se interessa apenas por gráficos de ponta ou se diverte mesmo com mecânicas que hoje podem parecer ultrapassadas, pessoas como Larry Kuperman seguem apostando na preservação como algo importante e comercialmente viável.

“Eu estava fazendo remasterizações antes mesmo de me juntar à Nightdive. Uma das primeiras foi o Total Annihilation, com a qual estive envolvido quando estava na Stardock. Tivemos muita resistência das pessoas. Quero dizer, ela foi encarada como um projeto de arte, não um projeto comercial, porque o pensamento era, bem, quem compraria esses jogos antigos?

Eles eram ótimos naquela época e são ótimos agora e as companhias começaram a perceber isso e certamente tivemos um papel de liderança neste sentido. Mas não somos a única companhia fazendo isso atualmente. Todo mundo está.”

Os clássicos não podem estar fadados apenas aos museus (Crédito: Reprodução/EsaRiutta/Pixabay)

Aliás, o fato de “todo” mundo estar remasterizando, refazendo e relançando seu catálogo é algo que vez ou outra incomoda o público, já que algumas empresas parecem estar preocupadas apenas em fazer mais dinheiro com títulos que nem são tão antigos.

Mas ganância a parte, sempre baterei na tecla de como é importante facilitarmos o acesso aos jogos, permitindo que novas gerações possam experimentar títulos que tanto nos divertiram. Podemos nem nos dar conta disso, mas um jogo lançado no início do ciclo de vida do Xbox 360 ou PlayStation 3 é mais velho que meu filho, que já tem 13 anos. Ou seja, já temos por aí uma leva de adolescentes que nunca tiveram contato com produções criadas já na era da alta resolução.

Para quem viveu aquele período, pode parecer desnecessário relançar agora jogos que permanecem bonitos. Porém, há títulos para aqueles consoles que continuam exclusivos e como adquirir um daqueles aparelhos atualmente não é muito chamativo, os relançamentos podem ser ótimas maneiras de permitir que tais jogos voltem a ser consumidos. E se tais obras voltarem com algumas melhorias, até nós, “veteranos”, podemos nos interessar.

Queremos a volta do Siren: Blood Curse! (Crédito: Divulgação/SCE Japan Studio)

Mesmo que você não considere um jogo da sétima geração como um clássico, não vejo problema em eles retornarem e poderia citar como exemplos de alguns que considero que seriam compras garantidas, como a série Resistance, Siren Blood Curse ou Folklore.

São títulos que talvez não tenham um grande apelo comercial, mas casos os seus criadores voltem a vendê-los, isso abriria as portas para um novo público e se o trabalho fosse bem-feito, ainda poderia chamar a atenção de quem os jogou na época. Mas acima de tudo, garantiríamos a preservação de uma parte da história e ainda honraríamos os nomes das pessoas que tornaram essas obras possíveis.

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