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Yamato: 75 anos do triste fim do maior de todos os navios de guerra

O Yamato foi o maior e mais poderoso encouraçado da Segunda Guerra Mundial, e 75 anos depois ele ainda é lembrado. Vamos conhecer um pouco mais sobre ele...

4 anos atrás

Em 27 de Maio de 1905 os russos descobriram da pior forma que é mau negócio subestimar o inimigo. Foi o auge da guerra russo-japonesa, mais precisamente a Batalha de Tsushima, quando a orgulhosa e moderna marinha russa enfrentou uma força japonesa mais ou menos equivalente. Do alto de sua superioridade, os russos achavam que seria uma barbada, mas o resultado foi o oposto.

Os japoneses perderam três lanchas torpedeiras, num total de 450 toneladas, e 117 mortos. Do lado russo foram seis dos outro couraçados afundados, 4380 mortos e 126 mil toneladas em navios afundados, somando 14 outros, fora embarcações menores.

Essa batalha consolidou o Japão como uma potência naval, o couraçado como a arma definitiva e foi a gênese do Yamato.

Durante o começo do século XX, os encouraçados reinaram supremos. Navios com casco extremamente espesso, canhões poderosos controlando os mares e garantindo a supremacia de suas nações. Tratados foram feitos para limitar a quantidade de encouraçados ("couraçado" é um sinônimo, vou usar ambos) que cada país poderia construir, mas todo mundo que assistiu Star Trek: Deep Space Nine sabe que Inter Arma Enim Silent Leges - Em tempos de guerra, as Leis se silenciam.

O Japão, que não é bobo nem nada sabia que não teria como competir com o poder industrial dos Estados Unidos, no tempo em que eles construiriam um encouraçado, os americanos fariam cinco, sem se preocupar com recursos naturais limitados.

Então, qual a solução? Como você combate um inimigo com um número imenso de navios? Simples: Você constrói o maior e mais monstruosamente poderoso encouraçado que o mundo já viu: O Yamato.

O Yamato começou a ser construído em 1937, em Hiroshima. A doca seca teve que ser ampliada, guindastes especiais foram instalados para lidar com as peças muito acima do peso normal. O projeto todo correu em segredo de Estado. Uma rede de camuflagem foi estendida por sobre a doca, para que vôos de reconhecimento não identificassem o que estava sendo construído.

Entre os engenheiros, somente o projetista-chefe tinha acesso aos planos completos, o resto trabalhava projetando partes sem saber como seria o navio completo. O que todo mundo sabia era que o bicho seria grande, muito grande. E blindado. O convés era protegido por uma camada de 22 cm de puro aço, em alguns locais como as torres de canhão a blindagem chegava a incríveis 65 cm.

Blindagem de 65Cm de um navio classe Yamato achada no Japão e usada para testes de tiro a queima-roupa nos EUA

Toda essa blindagem tornava o Yamato pesado, e seu tamanho também ajudava. Ele era maior do que um porta-aviões classe Yorktown, como o USS Enterprise. Com 256 metros de comprimento, 71659 toneladas de deslocamento e 39 metros de largura, o Yamato era monstruoso se comparado a encouraçados da época, como o USS Arizona, afundado no ataque de Pearl Harbor:

Comissionado em 16 de Dezembro de 1941, o Yamato se tornou o orgulho da frota japonesa, com a certeza de seu armamento superior o tornar praticamente invulnerável, podendo atingir alvos muito antes que eles chegassem perto o bastante para usar as próprias armas.

O armamento principal consistia de três torres triplas, cada uma pesando 3 mil toneladas, totalizando nove canhões de 18 polegadas, disparando um projétil de duas toneladas a uma distância de até 42Km. Eram os maiores canhões já instalados em um navio, e ainda detém esse recorde.

Qual o tamanho de um projétil de 18 polegadas? É deste tamanho:

Depois de missões de certificação, teste, treinamento, o Yamato finalmente viu seu primeiro combate durante a Batalha de Midway, quando se tornou a nau-capitânia do almirante Yamamoto, e por ver seu primeiro combate eu quero dizer que ele ficou honrosamente muito distante da ação, enquanto a aviação americana afundava quatro porta-aviões japoneses, no momento que efetivamente mudou o rumo da Guerra no Pacífico.

Depois disso o Yamato voltou para o porto, se revezando entre Kure, no Japão e Truk, na Micronésia, mas na maior parte do tempo ficava em Kure mesmo, pois era extremamente caro em recursos mandar o Yamato pro mar.

Mover um navio de 70 mil toneladas a 50Km/h consumia óleo a rodo, e ainda havia o adicional da escolta. O Yamato precisava viajar com uma esquadra de caça-minas, destróiers anti-submarinos, navios especializados em proteção antiaérea, etc. A Japão nunca teve muitos recursos e com a guerra se virando contra eles, com os submarinos americanos exercendo um bloqueio naval total, não havia petróleo sobrando.

Ironicamente o maior e mais poderoso encouraçado do mundo era tão precioso que ninguém queria arriscar perdê-lo, então o Yamato se tornou um ás na manga. Os tripulantes dos outros navios o chamavam de Hotel Yamato, pois seus marinheiros só faziam comer e engordar, sem chegar perto da guerra de verdade.

Com o tempo o Yamato e seu navio-irmão Musashi foram usados como transportes de tropas e equipamentos, mas eventualmente ele acabou combatendo. No Natal de 1943 ele foi torpedeado pelo submarino USS Skate, um rombo de 5 metros no casco deixou entrar 3 mil toneladas de água, mas nada sério, reparos de emergência o deixaram bem o bastante para viajar até Kure, aonde seria consertado.

O Yamato passou um bom tempo no estaleiro recebendo reparos e upgrades, ganhando mais armamento antiaéreo. Era evidente que os encouraçados eram vulneráveis a aviões, algo que os próprios japoneses demonstraram de forma didática em 7 de Dezembro de 1941.

A Batalha do Mar de Sibuyan, entre 23 e 26 de Outubro de 1944 foi fatal. Os americanos tinham decidido afundar os super-encouraçados japoneses, e os aviões do USS Essex fizeram 259 ataques contra o Yamato e o Musashi.

O Yamato foi atingido por duas bombas, já o Musashi foi alvo de fogo concentrado, e afundou depois de ser atingido por 17 bombas e 19 torpedos.

Em 25 de Outubro, na Batalha de Samar pela primeira e única vez o Yamato disparou suas armas contra navios inimigos, mas teve que fazer uma retirada estratégica, não tinha como enfrentar seis porta-aviões e sete destróiers.

De novo o Yamato foi para o estaleiro para ser reparado e ganhar mais upgrades, mas já era 1945 e a situação do Japão era desesperadora, kamikazis eram uma realidade e a população estava sendo preparada para lutar até o fim.

Não havia mais combustível para o Yamato e suas escoltas. As ilhas do Pacífico estavam sendo invadidas e o Japão ficava sem bases de apoio. Em primeiro de Abril de 1945 os americanos invadiram Okinawa, e o Japão criou um plano desesperado, a Operação Ten-Go.

Segundo o plano o Yamato e nove navios de escolta receberiam combustível suficiente para chegar em Okinawa, e não mais que isso. Era uma missão só de ida para todos os envolvidos. O Yamato deveria navegar até a ilha, se aproximar até encalhar, tornando-se assim inafundável. Desse ponto em diante o navio deveria usar suas baterias principais para atingir as tropas americanas em terra e/ou navios se aproximando, lutariam até o fim.

O que o Japão não sabia é que os americanos acompanhavam todas as comunicações, e organizaram um mega-ataque para interceptar a esquadra antes que ela chegasse em Okinawa.

Com uma frota de encouraçados como backup, vários porta-aviões cercaram o Yamato e suas escoltas. No dia 7 de Abril de 1945 280 aviões, com bombas e torpedos atacaram de forma implacável, saturando as defesas antiaéreas do inimigo.

Uma bomba americana explode ao lado do Yamato

Os navios de escolta foram um a um afundados, o Yamato recebia fogo de todo lado, bombas explodiam danificando radares e forçando a tripulação a mirar manualmente a artilharia antiaérea. Torpedos abriam buracos no casco e o navio começava mais e mais a se inclinar, deixando armas fora de ação e diminuindo sua velocidade.

Foram três ondas de ataque. Incêndios descontrolados assolavam vários compartimentos, homens ficavam presos dentro de compartimentos estanques, que só adiavam o inevitável. O Yamato estava afundando e às 14h02min foi dada a ordem: Abandonar o navio. Depois de ser atingido por 11 torpedos e 6 bombas, o Yamato estava perdido, mas ele não iria sem um protesto.

14h23min: Já sem energia, o Yamato adernou 180 graus, expondo seu fundo. As torres de canhões se desprenderam, e no processo o paiol principal de munição se incendiou. Centenas de toneladas de alto-explosivo detonaram em uma explosão, o Yamato não iria para o fundo do mar em silêncio.

A maior explosão marítima não-nuclear da História criou uma nuvem em cogumelo com mais de 6Km de altura, e foi vista a mais de 160Km dali.

A explosão final do Yamato

Dos 3332 tripulantes, 3055 perderam a vida. Para adicionar insulto à injúria, os sobreviventes foram mantidos isolados, e o Japão levou um mês para admitir publicamente a perda do Yamato.

Perdido, mas não esquecido. Culturamente o Yamato é um nome venerado entre historiadores e entusiastas. O Museu Yamato, em Kure é extremamente popular, e para você ter ideia de quão grande o navio era, o modelo em escala do Yamato por si só é um barco de tamanho considerável:

46 anos atrás, em 1974, o Yamato se firmou de vez na cultura popular, quando se tornou o centro do anime Space Battleship Yamato, que no Brasil passou como Patrulha Estelar. No primeiro episódio os derradeiros minutos do primeiro episódio são recontados os minutos finais do navio. Essa cena não passou na versão americana ou brasileira:

O anime teve dezenas de versões, e a história ainda é recontada, há algo de fascinante no conceito da Terra devastada, os oceanos desaparecidos e das cinzas a Humanidade deposita suas esperanças em uma nave espacial construída no formato e dentro dos destroços do há muito afundado Yamato.

Em todas as versões, o Yamato renasce como uma Fênix, ao som da empolgante canção-tema cantada por Isao Sasaki:

Infelizmente, o Yamato nunca teve uma versão cinematográfica à altura. Tanto o navio de verdade quanto a série de ficção renderam filmes que ficaram bem aquém do merecido, mas isso não é problema. Com filme ou sem filme, o Yamato nunca será esquecido.

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