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"Robôs" celulares são capazes de regenerar tecidos

Pesquisa usa células do pulmão para criar "robôs" biológicos não-programados, que podem auxiliar na regeneração de traumas neurológicos

12 semanas atrás

A robótica possui uma série de divisões e campos de estudo. A Nanorobótica, por exemplo, estuda o desenvolvimento de "robôs" em escala nanométrica (1 nm = 10−9 m), mas sem circuitos. Sua "programação" segue a dinâmica comportamental das proteínas, para incutir comportamentos desejados. A Microbótica, por sua vez, usa escalas maiores, geralmente do tamanho de células, ou pouca coisa menor.

O conceito de "máquina molecular" pode parecer esquisito, mas é preciso lembrar que cada célula sua possui inúmeras delas: os ribossomos, estruturas responsáveis pelo processamento de proteínas, são por definição mecanismos biológicos, que realizam movimentos repetitivos para realizar uma função, exatamente como uma engrenagem.

Um "antrobô" de 7 dias; os cílios são usados para locomoção (Crédito: Gumuskaya Et Al, Advanced Science/10.1002/Advs.202303575)/robôs

Um "antrobô" de 7 dias; os cílios são usados para locomoção (Crédito: Gumuskaya Et Al, Advanced Science/10.1002/Advs.202303575)

Basicamente, um nanorrobô ou microrrobô, para ser considerado como tal, deve ser composto de fragmentos de proteínas, átomos ou moléculas, de modo que ele siga um comportamento pré-determinado, da mesma forma que um robô em escala visível. A manipulação de componentes biológicos é a programação per se, por isso, o experimento conjunto do Instituto de Tecnologia de Nova Jérsei e da Universidade Tufts, nos Estados Unidos, não se enquadra muito bem no conceito de microbótica, mas é interessante mesmo assim.

O estudo, descrito no artigo da revista Advanced Science, usou células do epitélio pulmonar humano, que reveste as paredes internas do órgão, para criar o que chamaram de "antrobôs" (anthrobots em inglês), o que pode ser entendido como "robôs (feitos com tecidos) humanos". Cada unidade é composta por uma certa quantidade de células, cultivadas por aproximadamente duas semanas.

Após esse período, as células formam pequenos aglomerados, com tamanhos que variam de menores do que a ponta de um lápis, à espessura de um fio de cabelo. Os cílios das células pulmonares são todos estimulados a crescer para fora, ao invés de para dentro, o que oferece ao aglomerado a mesma mobilidade de uma única célula.

Robôs celulares restauram neurônios

A pesquisa criou dois tipos de antrobôs, o Tipo 1, redondo (foto acima), e o Tipo 2, de forma elíptica. O primeiro é bem menos móvel, basicamente é capaz de se "balançar", o que os cientistas descrevem no artigo como resultado da ação dos conjuntos de cílios, com "um cancelando outro". Os elípticos, por sua vez, são bem mais móveis no ambiente controlado usado na pesquisa, em placas de petri.

Como deu para perceber até aqui, o processo de cultivo das células pulmonares para a criação dos aglomerados não envolve nenhum tipo de manipulação de proteínas ou átomos, ou seja, ele consiste em pegar um punhado delas e amontoá-las, formando bolotas. O comportamento dos antrobôs não pode ser direcionado ou mesmo previsto, mas a pesquisa demonstrou algumas possíveis aplicações.

"Ponte" formada por antrobôs, no espaço criado por lesão em neurônios (Crédito: Gumuskaya Et Al, Advanced Science/10.1002/Advs.202303575)

"Ponte" formada por antrobôs, no espaço criado por lesão em neurônios (Crédito: Gumuskaya Et Al, Advanced Science/10.1002/Advs.202303575)

Na pesquisa, os cientistas criaram uma lesão em neurônios, abrindo um espaço na estrutura, e inseriram ali os antrobôs. Estes, por sua vez, estimularam a criação de uma "ponte" entre as duas partes, permitindo que os neurônios fechassem a ferida em alguns dias. Eles cresceram ao redor de um amontoado dos aglomerados celulares, chamado de "super-robô", e restabeleceram suas funções normalmente.

Aqui vem o ponto criticado por cientistas de fora, ao revisarem a pesquisa: o time da doutoranda Gizem Gumuskaya (curiosidade, ela é também arquiteta), e do prof. Michael Levin, não compreende ainda como os antrobôs fizeram isso, o processo de estímulo dos aglomerados para fazer os neurônios se regenerarem é desconhecido, o que põe em cheque a denominação de "robôs" para eles, pois eles não foram programados, apenas amontoados e jogados na ferida, para "ver o que acontecia".

Por outro lado, a pesquisa abre uma possibilidade para o uso de células humanas, muito menos propensas à rejeição, no tratamento de traumas neurológicos em diversos graus, ou em outras estruturas do corpo humano. Gumuskaya diz que rearranjar células a assumirem novas formas seria comparável a como usamos pedras e tijolos em diferentes estruturas, de pontes a prédios.

No mais, o tempo dirá se os "robôs" biológicos de Gumuskaya poderão ter aplicações reais na medicina, especialmente para o tratamento de lesões neurológicas, o que seria muito bem-vindo.

Referências bibliográficas

GUMUSKAYA, G., SRIVASTAVA, P., COOPER, B. G. et al. Motile Living Biobots Self-Construct from Adult Human Somatic Progenitor Seed Cells. Advanced Science, 2023, 2302575, 20 páginas, 30 de novembro de 2023. Disponível aqui.

Fonte: ExtremeTech

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