Dori Prata 25/10/2023 às 10:16
Imagine trabalhar num pequeno estúdio localizado em Santiago, Chile. Agora imagine que certo dia lhe foi oferecida a oportunidade de desenvolver um jogo baseado em uma poderosa franquia do entretenimento. Na teoria isso seria um sonho, não é mesmo? Pois para os criadores do Skull Island: Rise of Kong, tal situação ficou mais próxima de um pesadelo.
Desenvolvido pela IguanaBee e publicado pela GameMill Entertainment, Skull Island: Rise of Kong chegou ao mercado em 17 de outubro e rapidamente chamou a atenção das pessoas, mas não pelo melhor dos motivos. Para muitos, estava ali um fortíssimo candidato a pior jogo de 2023, título que já parecia ser do Senhor dos Anéis: Gollum.
Sem uma quantidade mínima de avaliações para formar média no Metacritic, a nota mais alta que o jogo do King Kong recebeu foi um terrível 30, com a percepção do público não sendo muito melhor do que isso. E ao olharmos para as críticas fica fácil entender por que o jogo foi tão mal-recebido.
Por ter se passado quase duas décadas desde o último jogo baseado no personagem, existia alguma expectativa em relação ao que essa nova adaptação nos traria, mas o que vimos foi um show de horrores. Uma jogabilidade rasa e bastante truncada, gráficos que seriam ruins mesmo há três gerações, com texturas e animações de baixíssima qualidade e bugs, muitos bugs!
“Gameplay” of Skull Island: Rise of Kong.
This costs 40 dollars and is made by people that make low effort shovelware with big IP franchises.
The modern LJN pic.twitter.com/YjHqOeoosr
— King Kong Perfect Shots (@KongShots) October 16, 2023
Se um título com tantos problemas fosse lançado por um preço acessível, ele já seria alvo de muitas reclamações, mas aqui estamos falando de algo vendido por R$ 147 na sua versão para Xbox Series ou R$ 200 para quem quiser jogar no PlayStation 5. E repare, o preço bastante elevado não é exclusividade do nosso mercado, já que lá fora ele está saindo por US$ 40.
Mas o que explicaria um jogo tão ruim como o Skull Island: Rise of Kong? Qual a justificativa para um estúdio que nos deu o aclamado What Lies in the Multiverse produzir algo com um padrão de qualidade tão baixo? Pois a resposta é simples: tempo e dinheiro, ou melhor, a falta deles.
A revelação desses problemas foi feita ao The Verge, de forma anônima, por alguns profissionais que trabalham ou trabalharam na IguanaBee. Segundo um deles, o desenvolvimento teria começado em junho de 2022 e precisaria ser entregue até 2 de junho passado, mas essa seria apenas uma parte da dificuldade que os chilenos enfrentariam.
“Era bastante comum não recebermos todas as informações sobre um projeto, o que era bastante frustrante durante o trabalho, porque tínhamos que improvisar com as informações limitadas que tínhamos em mãos,” disse um ex-funcionário que, embora não tenha trabalhado na criação do Skull Island: Rise of Kong, participou de outros projetos tão problemáticos quanto.
Já outra pessoa lembrou de uma ocasião em que um colega foi demitido, mesmo estando trabalhando no estúdio há mais tempo do que ela, provavelmente porque a GameMill Entertainment não havia liberado um orçamento suficiente para manter um certo número de profissionais por mais tempo.
Some a isso a impossibilidade de os envolvidos mudarem aquilo que julgavam não estar bom, afinal eles não teriam tempo para refazer tais partes. Mesmo assim, muitas horas extras precisaram ser feitas, o que afetou diretamente a moral. “O crunch começou realmente em fevereiro,” disse um dos entrevistados. “Eu estava no piloto automático no fim de fevereiro, porque toda a esperança havia sido perdida.”
Caso você esteja se perguntando o que leva um estúdio a se submeter a uma situação assim, basta pensar no dinheiro. Embora exista na IguanaBee a vontade de produzir títulos autorais, de alguma forma a desenvolvedora precisa financiar esses projetos e a maneira encontrada por eles para fazer isso foi terceirizando a produção, especialmente para jogos licenciados.
Isso os levou a criar títulos como G.I. Joe: Operation Blackout, NERF Legends e Star Trek: Resurgence, sendo este aquele que teve o melhor desempenho perante a crítica, com uma média 71. “É uma relação de amor e ódio, porque são eles quem aceitam ou dão projetos e a Iguanabee não tem como desenvolver quase nada sozinha porque bem... dinheiro,” explicou um dos ouvidos.
No caso do Skull Island: Rise of Kong, talvez o que torne a situação ainda pior é lembrarmos que a última vez em que a Oitava Maravilha do Mundo apareceu em um videogame foi com o excelente Peter Jackson's King Kong: The Official Game of the Movie. Eu joguei aquele FPS no PlayStation 2 e mesmo com todas as limitações da plataforma, ele ainda parece bem mais bonito que esse novo jogo.
Diante das declarações feitas por pessoas ligadas a desenvolvedora chilena, entendo que eles tenham feito o melhor que podiam, um sacrifício necessário para poder pagar as contas. Mesmo assim, isso não apaga o fato de o título que eles criaram ser uma tremenda porcaria.