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7 profissões que foram praticamente eliminadas pela tecnologia

Dizem que tecnologia tira empregos, mas temos cada vez mais gente no mundo, e cada vez mais empregos. Vamos entender melhor isso

27 semanas atrás

Tecnologia tem suas vantagens, que o diga o primeiro proto-humano que descobriu que acertar um osso de javali no cocuruto do vizinho garantia acesso a alimento, fêmeas e monolitos. Mesmo assim, tecnologia também afeta negativamente a vida das pessoas, mesmo as que não levam um osso no cocuruto.

Pense em quantos carregadoes a roda desempregou. (Crédito: StableDiffusionXL)

A grande discussão no momento é que a Inteligência Artificial vai eliminar empregos. Segundo a Fortune, 12 milhões de postos de trabalho serão substituídos por IA, por volta de 2030. E dessa vez a gritaria está grande, pois a IA não está substituindo a peãozada de chão de fábrica, e sim postos “nobres”,  como povo do marketing, jornalismo, datamining e, principalmente, artes.

Óbvio que nenhuma IA vai substituir um Alex Ross ou um George R.R. Martin, mas não são esses reclamando. A IA vai,sim, afetar o povo que escreve press releases, sumários executivos, que faz “Storytelling” em agências de propaganda.

Existe todo um ecossistema no Tumblr onde jovens artistas aceitam encomendas e criam ilustrações de personagens, em geral de anime. Em geral imagens XXX mas melhor omitir essa parte. Esses jovens cobram pouco, alguns pouco mais de US$15 por uma imagem. A qualidade e o talento variam muito, mas há um consenso:

Não exatamente o tipo de fanart que o povo encomenda, mas este é um blog de família. (Crédito: Stable Diffusion)

Esses jovens serão dizimados como moscas pela IA. A tecnologia de geração de imagens como o Stable Diffusion consegue superar tudo que o Tumblr produz, com u’a mão de dedos tortos nas costas.

Não chega nem a ter graça, gente sem a menor habilidade artística, incapaz de desenhar uma linha reta sem o Autocad, que se desenhar uma casa de psicotécnico ela desaba, gente como eu consegue produzir imagens lindas em segundos (muitos segundos, com minha GPU arcaica).

Óbvio que não é a primeira vez que uma nova tecnologia eliminou ou colocou à beira da extinção toda uma categoria de profissionais. Em comum em todos os casos, os profissionais migraram para outras áreas, e a tecnologia acabou gerando mais postos de trabalho do que foram eliminados.

Basta pensar na migração de carroças para automóveis. Os carros quebravam o tempo todo, sua baixa autonomia gerou a criação de postos de serviço, com combustível, lanche, bebidas. Toda uma indústria de autopeças floresceu em volta das fábricas, e se a grande maioria dos fabricantes de carroças faliu, algumas, como a Studebaker, aplicaram seu conhecimento na construção de carroças e passaram a produzir carrocerias, e mais tarde carros inteiros.

O posto de gasolina moderno só foi aparecer nos EUA em 1920, antes disso haviam postos improvisados, mas nos primórdios as pessoas compravam gasolina em farmácia, como se fosse Plutônio. (Crédito: Toronto History / Wikimedia Commons)

A transição não é fácil para o indivíduo, e demanda sacrifícios. Nos EUA, por exemplo, um grupo, que obviamente não é a IBM acha que mineiros podem sim programar, então estão ensinando Programação e Ciência da Computação para mineiros de carvão, que estão sistematicamente perdendo seus empregos.

A mão torta da IA tira, a mão torta da IA dá; empregos que nem têm nome ainda serão criados por causa da IA, e profissionais tradicionais se beneficiarão das ferramentas. Já aconteceu antes, e acontecerá de novo, já dizia o filósofo Baltar.

Então, vamos ver algumas das profissões dizimadas pela tecnologia, e o que aconteceu com elas:

1 – Digitador

No passado computadores eram a exceção. Basicamente tudo era feito em papel, os dados só eram digitalizados no último momento. Imagine toda a movimentação de uma pessoa ou uma empresa, todas as contas, cadastros, folhas de ponto, tabelas de horários, tudo em papel.

Quando esses dados precisavam ir para o computador, era necessário que fossem digitalizados, e não havia OCR. Fileiras e fileiras de operadores liam tabelas de números e textos e os digitavam em terminais, sem tela. Os dados eram gravados em cartões perfurados.

Uma digitadora transcrevendo dados do Censo de 1950 nos EUA para cartões perfurados. (Crédito: U.S. Census Bureau employees / Wikimedia Commons)

Mais de um digitador digitava o mesmo texto, os cartões eram automaticamente comparados e em caso de discrepância, retornavam como erro. Eles eram usados para tudo, de contabilizar salários a gerenciar contas de luz.

Com o tempo a quantidade de dados que já existiam e forma eletrônica foi aumentando, os grandes salões com centenas de pessoas digitando incansavelmente desapareceram. Ainda há usos para digitadores, mas são raros. Segundo fontes em 2022 havia 769 digitadores no Estado de São Paulo.

2 – Computadoras

Uma das cenas divertidas na ótima, mas pouco conhecida série Manhattan é logo no começo, um personagem leva um recém-chegado para conhecer os escritórios do Projeto Manhattan, e fala “nesta sala aqui temos os Computers”, que em inglês é um termo de gênero neutro. Ele abre a porta e temos um monte de mulheres com máquinas de calcular.

Antes da invenção dos computadores de uso geral, por décadas projetos que demandavam muitos cálculos usavam pessoas, em geral mulheres, para fazer contas. Eram processos repetitivos, grandes problemas eram quebrados em operações mais simples, e as mulheres resolviam os problemas, e passavam adiante os resultados.

Grupo do Túnel de Vento da NASA, por volta de 1950; Na primeira fila, as computadoras. Mary Jackson, de Hidden Figures, é a primeira à direita (Crédito: NASA)

Isso também é mostrado no excelente fanfic Hidden Figures, que também mostra a chegada dos primeiros IBMs, e é um exemplo didático de como encarar uma nova tecnologia. Dorothy Vaughan comandava um grupo de “computadoras” da NASA. Quando ela viu que um IBM 7090 estava sendo instalado, percebeu que ela e suas meninas perderiam o emprego.

Dorothy começou a estudar os manuais do computador e aprendeu FORTRAN sozinha. Mais ainda: Ela ensinou seu grupo, e como eram todas formadas e matemática, física e similar, pegaram rapidinho. Quando a NASA percebeu, tinha um monte de profissionais qualificadas para operar seus computadores.

Hoje em dia ninguém faz mais conta na mão, muito menos como as computadoras de antigamente.

3 - Técnico de TV

O povo gosta de dizer que TVs hoje são descartáveis, mas vou contar um segredo: São milhares de vezes mais confiáveis que antigamente. Existiam autorizadas de fabricantes de TV por todos os lados, no tempo das TVs de tubo era comum você receber visita de um técnico uma vez por mês.

Os problemas variavam. Resistores queimados, tubo desajustado, válvulas que queimavam e eram a alegria das crianças, que ganhavam as válvulas velhas para brincar. Ninguém estranhava chegar na casa de um amigo e ter um sujeito agachado atrás da TV, com um multímetro. O único horror era quando o técnico dizia que não dava pra consertar ali, e (você) teria que levar a TV pra loja.

Yes, sexista pra caramba. (Crédito: Reprodução Internet)

O técnico de TV era a Profissão do Futuro, como bem promoviam os anúncios do Instituto Universal Brasileiro, em revistas mil.

Quando a tecnologia evoluiu, e as TVs deixaram de ser valvuladas, transistorizadas e passaram a usar chips customizados, a quantidade de problemas caiu sensivelmente, agora só ocorriam problemas graves, daí a percepção de que as tvs modernas “duram pouco”.

Já os técnicos, migraram para outras áreas, como refrigeração, máquinas de lavar e principalmente impressoras e Xerox, essas sim quebram o tempo todo e garantem emprego.

4 - Caixa de Banco

Calma, eu sei que ainda existe caixa de banco, mas hoje em 99% dos casos o caixa humano é opcional. Você resolve basicamente tudo no aplicativo do celular, e no caixa eletrônico, mas antigamente, acredite, você não conseguia nem saber seu saldo.

Com muita sorte você telefonava para o banco e achava alguém disposto a te ajudar. Aí, ele faria o mesmo procedimento se você estivesse ao vivo na boca do caixa e perguntasse quanto tem na conta:

Ele iria até uma listagem de computador, impressa, procuraria seu nome e o “saldo do dia”. Você poderia sacar dinheiro com base naquele valor, mas se no final do dia quando o banco contabilizasse as entradas e saídas e o saldo estivesse negativo, azar o seu.

Caixa eletrônico, estilo anime. (Crédito: StableDiffusionXL)

Transferências entre bancos, o famigerado DOC, era caro, complicado e demorado. Imagine todas as informações do seu aplicativo, tendo que ser perguntadas e confirmadas presencialmente.

Era a treva. Se os bancos, que já vivem cheios, tivessem que usar humanos no lugar de aplicativos e caixas eletrônicos teriam mais atendentes do que clientes.

5 - Telegrafistas

A idéia de um telégrafo elétrico existia desde meados do Século XVIII, e vários projetos foram criados, mas a universalização e padronização de uma única forma de codificação, o Código Morse, só ocorreu em 1865.

Curiosamente, o código original de Samuel Morse só codificava números, que correspondiam a palavras em um livro de códigos. Em teoria seria bem mais rápido de transmitir uma mensagem, mas a decodificação seria bem mais complicada. Em 1840 um tal de Alfred Vail incluiu letras e criou o Código-Morse “moderno”, que é usado e ensinado em academias militares até hoje.

Consistindo de sinais longos e curtos, convertidos em pontos e traços, o Morse exige mão firme e bom ouvido, quando não há uma impressora por perto. Samuel Morse produziu um dos primeiros receptores com uma fita, que “gravava” as mensagens recebidas.

O problema aqui é que o Código Morse exigia um operador treinado. Um belo dia alguém descobriu que era possível criar máquinas capazes de codificar e decodificar sinais em Código-Morse. Assim ao invés de ter que usar o pica-pau (nome em português do equipamento) para escrever:

.-- . .----. .-. . / -. --- / ... - .-. .- -. --. . .-. ... / - --- / .-.. --- ...- . / -.-- --- ..- / -.- -. --- .-- / - .... . / .-. ..- .-.. . ... / .- -. -.. / ... --- / -.. --- / .. / -.--. -.. --- / .. -.--.-

O operador escreve o texto em caracteres alfabéticos normais, e do outro lado um receptor faz o caminho inverso. Estava inventado o TELEX, e a comunicação digital em geral.

Com a simplificação do Código Morse, muitos telegrafistas perderam vaga para operadoras hábeis em digitação, mas ao mesmo tempo as empresas ampliaram seus serviços, o que exigiu mais técnicos em campo.

6- Copistas

Em O Nome da Rosa, excelente filme baseado no pretensioso livro de Humberto Eco, um monte é envenenado com uma substância aplicada nas margens do livro que ele está copiando. O monge lambe o dedo para lubrificar, passa naquela parte da página para virar, e envenena aos poucos.

O tal monge é um copista, uma atividade que ajudou a preservar o conhecimento da Europa durante a Idade das Trevas, mas não podemos mais chamar assim.

Como a tecnologia da Xerox ainda era muito primitiva por volta do Século VI, a única forma de reproduzir um livro era copiando. Isso era feito manualmente, e podia levar anos. Livros mais elaborados custavam uma fortuna, antes de Gutemberg aparecer e destruir a indústria editorial com sua prensa de tipos móveis.

Copista medieval (Crédito: Domínio Público)

Os monges copistas trabalhavam em salas chamadas Scriptorium, “local de escrever”, e nem precisa explicar a etimologia que isso gerou.

Eles copiavam livros, manuscritos, cartas, tratados. Por Séculos eles preservaram Conhecimento, até que a popularização da impressora de Gutemberg facilitou a reprodução de obras em grande escala, mas se você quisesse uma cópia de um livro elaborado, cheio de ilustrações, ainda precisaria de um copista.

De um jeito ou de outro a profissão sobreviveu até à invenção da Xerox, e mesmo hoje em alguns lugares você ainda encontra gente oferecendo serviços de datilografia para reproduzir documentos, quando xeroxes não são aceitas.

7 - Telefonistas

Gostamos de zoar o Jovem™ lembrando que ele não consegue usar uma tecnologia tão simples quanto o telefone de disco, mas é bom lembrar que houve uma época em que ninguém sabia, era uma tecnologia nova e revolucionária, as operadoras chegavam a veicular filmes de treinamento explicando ao público como tudo funcionaria:

Para que o telefone de disco funcione, é preciso uma tecnologia bem mais complexa: A central automática, que não estava nos planos quando o telefone foi inventado.

Originalmente todos os telefones estavam conectados a uma central; você tirava o telefone do gancho, falava com uma telefonista e dizia para quem desejava ligar. A telefonista então puxava um cabo e fechava a ligação, fisicamente, entre o seu telefone e o de destino.

Claro, a telefonista sabia tudo que todo mundo falava, e a fofoca rolava solta. Todos os casos extra-conjugais, mesquinharias, era tudo do domínio delas, mas isso não era o pior.

Central telefônica em Paris, circa 1900. (Crédito: Domínio Público)

Um sujeito chamado Almon Brown Strowger era um agente funerário em Kansas City, quando percebeu que estava perdendo clientes, por causa de alguém muito vivo. Uma das telefonistas da área era esposa de outro agente funerário, então todas as ligações que ele interceptava e eram para Strowger, ela redirecionava para o trabalho do marido.

Strowger subiu nas tamancas, pegou um profundo e completo ódio por telefonistas.

Com ajuda de um sobrinho e outros funcionários, ele fundou uma companhia telefônica e pesquisou uma forma de gerenciar ligações sem o auxílio de telefonistas. Eles desenvolveram um sistema onde uma interface com 4 chaves, para milhar, centena, dezena e unidade.

Assim o número 3342 seria “discado” apertando:

  • Chave 1 – 3 vezes
  • Chave 2 – 3 vezes
  • Chave 3 – 4 vezes
  • Chave 4 – 2 vezes

Strowger dizia que sua invenção foi criada para “se vingar” das telefonistas, e desempregar pelo menos uma. Todo mundo sabia qual era.

Sua companhia telefônica tinha 75 assinantes, era razoavelmente próspera, mas Strowger acabou vendendo sua patente em 1896 pelo equivalente a US$52 mil em valores atuais. Em 1916 a Bell comprou a patente do dono atual pelo equivalente a US$43 milhões.

Strowge nunca soube, mas sua patente desempregou hordas de telefonistas, e bilhões de pessoas nunca mais tiveram que falar com telefonistas para fazer ligações locais.

Quanto às telefonistas, arrumaram outros empregos, e hoje vemos milhões de telefonistas em potencial falando com pessoas, atendendo em Callcentres.

Mas elas que se cuidem, atendentes de Callcentres estão entre os empregos que a tecnologia da IA irá eliminar mais rapidamente.

 

 

 

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