Nick Ellis 5 anos atrás
Chegamos ao terceiro episódio de Chernobyl, que de alguma forma consegue superar os anteriores (que já foram excelentes), e é por si só uma pequena obra de arte, um adjetivo que também se aplica a essa fantástica minissérie. Assim como as minhas resenhas do primeiro e segundo episódios, esta aqui também está repleta de spoilers, assim não continue lendo se não tiver visto Open Wide O Earth, terceiro episódio da série.
No começo do episódio, tudo parece estar resolvido ou ao menos bem encaminhado, a missão dos funcionários da usina (transformados em mergulhadores) acabou sendo bem sucedida, mesmo no escuro, e as coisas parecem que finalmente vão entrar nos eixos. Não é o caso, mas pelo menos temos um momento feliz, o desfecho do final angustiante do último episódio, com a reação de alegria e os aplausos de todos do lado de fora da usina quando os três heróis finalmente saem de lá.
A série então nos leva até um hospital em Moscou, onde vemos Lyudmilla (Jessie Buckley) tentando visitar seu marido Vasily. Ela consegue subornar uma funcionária e obter acesso, e mesmo após ser avisada por uma médica sobre os riscos que está correndo, ela consegue uma autorização para encontrar seu marido por 30 minutos, com a condição de não encostar nele.
A médica ainda pergunta se ela não está grávida, e ela mente dizendo que não. Ao chegar no quarto, ela encontra Vasily com os sintomas de queimaduras, e logo o abraça. O cruel dessa cena é que ele está passando por um bom momento, mas nós sabemos que a radiação em breve irá levá-lo, e da pior forma possível. Lyudmilla vai ver o estado do seu marido piorar terrivelmente em poucas horas, enquanto continua a ser contaminada pela presença dele.
Vemos então a revolta de Legasov com Shcherbina sobre o tamanho da zona de exclusão, que naquele momento era de 30 km2. Os dois então recebem a notícia de que a temperatura aumentou e que o tão temido derretimento começou. Enquanto isso, Gorbatchov está lendo a repercussão do acidente em jornais estrangeiros, e então liga para Shcherbina, que explica a nova complicação que o núcleo pode romper a camada de concreto e atingir o lençol freático do rio Pripyat, e assim envenenar a fonte de água de 50 milhões de pessoas.
Shcherbina explica ao seu chefe a ideia de Legasov de resfriar o local embaixo da camada de concreto para evitar o derretimento, e que irá precisar de todo o nitrogênio líquido da União Soviética para isso. Antes de terminar a ligação, Legasov entra na linha e fala sobre o tamanho insuficiente da zona de exclusão, o que leva o líder soviético a desligar na cara deles.
Os dois vão dar um volta, no qual Shcherbina pergunta o que irá acontecer com as pessoas envolvidas com o acidente, e Legasov explica em detalhes todo o processo que está acontecendo com os bombeiros no hospital, incluindo o período de latência, no qual eles parecem estar se recuperando.
O quadro que Legasov pinta para seu amigo Boris é assustador: "os danos celulares começarem a se manifestar, e a medula óssea falha. O sistema imunológico falha. Os órgãos e tecido mole começam a se decompor. As artérias e veias vazam como uma peneira, ao ponto de não conseguir dar morfina para a dor, que é inimaginável. Dentro de três dias a três semanas, você está morto. É o que vai acontecer com esses rapazes."
Shcherbina então pergunta sobre o que irá acontecer com ele e Legasov, e a resposta é que os dois estão tomando uma dose contínua de radiação, e que apesar de não correrem um risco imediato, com o tempo irão ficar doentes e morrer por consequência disso. Depois Legasov conversa com Ulana e sugere a ela que vá até o hospital em Moscou para tentar descobrir o que houve com os funcionários que estavam na sala de controle na hora do acidente.
Na próxima cena conhecemos os mineiros de Tula, na Rússia Soviética, que recebem a visita do ministro da indústria de carvão, que vai requisitar a ajuda deles para cavarem o túnel embaixo do reator em Chernobyl. A reação deles mostra que os mineiros não são de brincadeira. O ministro explica que eles são basicamente a última esperança para evitar um desastre ambiental, o que leva o chefe dos mineiros Glukhov (Alex Ferns) e seus homens a aceitarem a missão.
A cena deles indo para os caminhões e dando tapinhas sujando o paletó do ministro é excelente, com direito a frase do mineiro vivido pelo ótimo ator James Cosmo (Lorde Comandante Mormont de Game of Thrones), dizendo que agora ele realmente se parece com o ministro do Carvão.
No hospital, Lyudmilla segue grudada no seu marido radioativo, e em uma cena tocante, diz pra ele que está vendo a Praça Vermelha da janela do hospital, quando na verdade não está vendo nada. Ulana chega ao hospital e tenta falar com Dyatlov, que a manda embora.
Ao chegarem a Chernobyl, os mineiros recebem máscaras de ar e encontram Legasov, que tinha aconselhado por Shcherbina a falar a verdade para os chefe deles. Legasov explica que todo o trabalho terá que ser feito manualmente. Após Shcherbina sugerir começar a cavar o túnel no dia seguinte, o chefe dos mineiros diz que irá começar imediatamente, para não deixar seus homens lá nem mais um minuto do que o necessário.
Depois de começarem o trabalho, o chefe descobre que não eles não podem usar ventiladores para amenizar o calor de 50 graus dentro do túnel, o que vai motivar uma cena curiosa, ainda que provavelmente não tenha acontecido de verdade.
Ulana continua sua investigação sobre a noite do acidente, conversando com Toptunov, engenheiro-chefe sênior do controle do reator, que assim como Vasily, está em um estado avançado dos efeitos da radiação. Ela mostra todo o espanto de nós espectadores ao ver que ele exercia um cargo de tamanha importância na usina com seus 25 anos de idade.
Luydmilla encontra com a médica que tinha recomendado que ela ficasse lá por só meia-hora. A médica explica a ela o que está acontecendo, e pede a ela para ficar do outro lado do plástico, ou irá pedir a segurança para retirá-la do hospital. É claro que ela não obedece, mais uma vez.
Shcherbina encontra Legasov, e avisa a ele que o incêndio acabou, e que os mineiros disseram que o trabalho vai terminar em quatro semanas. Os dois são chamados para ver os mineiros, que por conta do calor, estão trabalhando pelados. O chefe dos mineiros então pergunta a Shcherbina se eles irão ser cuidados depois de terminarem o trabalho, e Boris responde que não sabe.
A olhada que Glukhov dá pra Legasov é possivelmente um dos motivos para o personagem ter tomado a decisão de tirar sua vida no começo da série, dois anos depois do acidente, já que o plano de colocar eles nessa situação tinha sido dele.
O pior dessa história é que, de acordo com o ótimo podcast que acompanha a série, o criador Craig Mazin conta que todo esse trabalho e sacrifício dos mineiros foi em vão, pois não houve o derretimento, e todo o risco que eles enfrentaram foi baseado na probabilidade de 50% de chance de acontecer o pior.
No hospital, Toptunov conta a Ulana que no teste feito na noite do acidente, informou o aumento súbito de temperatura a Akimov, que apertou o botão para o desligamento de emergência, e foi aí que tudo explodiu. Ulana vai confirmar isso com Akimov, que confirma que apertou o botão antes da explosão, e diz a ela que não entende por qual motivo o acidente aconteceu.
Ulana então encontra Lyudmilla e a retira do quarto, e fica chocada com isso. Ela pergunta a médica se sabe que ela está grávida, e avisa que todo mundo vai ouvir sobre o que está acontecendo naquele hospital. Nesse momento, se materializa um agente da KGB, que demonstra preocupação com a frase de Ulana, e quer saber o que é que todo mundo irá saber.
Shcherbina e Legasov se encontram antes de uma reunião do comitê, e Boris conta a ele que Ulana foi presa na noite anterior, mas que já está tentando resolver a questão. Na reunião, Shcherbina informa a todos de seus progressos aparentes, e se dirige diretamente ao vice-diretor da KGB, Charcov (vivido pelo ator Alan Williams), perguntando se eles contam com o seu apoio.
Legasov então lembra a todos que a área de 260 km2 ao redor da usina está com detritos radioativos e contaminação, e precisa ser evacuada, e todos os animais nessa área precisarão ser destruídos, e que eles precisarão construir uma estrutura para conter a usina, e que tudo isso vai se traduzir em ainda mais mortes.
Shcherbina conta que eles irão precisar de três anos e 750 mil homens incluindo médicos e engenheiros para fazer o que ficou conhecido como a liquidação. Gorbatchov autoriza que eles prossigam e convoquem os liquidantes.
Ao final da reunião, Legasov interpela a Charcov para pedir a ele que liberte Ulana da prisão, e reclama que eles estão sendo seguidos. Charcov explica a Legasov como as coisas funcionam na KGB, e mostra que existem pessoas seguindo todo mundo, até ele mesmo: "a KGB é um círculo de responsabilidade, nada além."
Ele também diz que confia em Legasov e Shcherbina, mas como diz um velho provérbio russo: "confie, mas verifique". Charcov ainda faz uma piada de como os americanos acham que Ronald Reagan teria inventado o ditado.
Legasov vai tirar Ulana da prisão, em uma cena que foi gravada dentro de uma prisão real da KGB (mais uma informação do podcast de Chernobyl). É lá que Ulana conta a Legasov que Akimov não tinha mais rosto, algo que felizmente não foi mostrado em cena. Ulana explica a Legasov que o botão de cancelamento foi apertado antes da explosão, o que indicaria que a falha não teria sido humana, e sim de projeto.
Legasov diz a ela que ela deve prosseguir na sua investigação, e conta que ordenou que os mineiros fizessem a escavação, que ele mesmo não tem certeza que será necessária. Esse episódio tem várias cenas incríveis, e a da prisão da KGB certamente é uma delas, mas nada que se compare ao impacto do final, no qual vemos o destino dos bombeiros do primeiro episódio.
Em uma montagem que intercala a convocação dos jovens que irão trabalhar na liquidação do acidente, com uma Lyudmilla desnorteada enquanto os caixões dos bombeiros são preparados para o enterro. O clima é sombrio, assim como a música da compositora Hildur Guðnadóttir.
Os caixões são então colocados em um buraco e cobertos por cimento, e o diretor nos mostra o rosto de Lyudmilla e dos demais parentes das vítimas. É impossível não se sentir preso e angustiado na cena final na qual o concreto vai sendo despejado em cima dos caixões.
Pra mim, todos os finais de episódios dessa minissérie foram bem fortes, mas até agora, esse foi o que me deixou mais abalado. Eu assisto aos episódios que resenho algumas vezes antes de escrever, e digo a vocês que essa cena não perdeu em nada o impacto, mesmo na segunda ou terceira vez que eu vi.
É claro que a história mostrada na série é bem diferente do que o que aconteceu na vida real, alguns personagens como Ulana nem existiram de verdade, enquanto outros foram totalmente modificados, mas acredito que a essência do que aconteceu esteja sendo mostrada e respeitada.
Como uma história dramática, Chernobyl é realmente excelente, e também tem o mérito de chamar a atenção para a história real, que pode ser descoberta através dos vários livros e documentários sobre o acidente, alguns dos quais já estão na minha lista.
Leia nossa resenha do quarto episódio, The Happiness of All Mankind.