Ronaldo Gogoni 7 anos atrás
Neste fim de semana a Gerdau promoveu o seu primeiro Hackathon, aquela maratona onde desenvolvedores são desafiados a criar uma solução funcional em algumas horas, com direito a prêmios e apoio na hora de tirar o projeto do papel, promovendo trabalho em equipe e também chances para profissionais fazerem novos contatos.
Entretanto, embora a iniciativa seja boa é importante apontar alguns escorregões dados nessa primeira edição.
O evento foi realizado durante o fim de semana na sede da FIAP em São Paulo, no bairro da Aclimação. 45 desafiados, divididos em nove grupos foram incumbidos de apresentar novas soluções com o intuito de fortalecer as relações entre empresas e clientes, seja B2C ou B2B (com foco nesse último) e onde a Gerdau seria a primeira escolha. Todos os participantes são estudantes de graduação, pós ou MBA e não havia limites por instituição.
Com os grupos já definidos uma semana antes e as diretrizes passadas, os desenvolvedores puseram a mão na massa. O interessante dos Hackathons é que ele não é voltado apenas para programadores e outros profissionais de TI, e isso é importante até na hora de definir os times: profissionais e estudantes das áreas de design, vendas, publicidade e desenvolvimento foram todos mesclados para um melhor resultado final apresentado. A gente sabe que um produto final feito só por programadores pode ser excelente, mas dificilmente será user friendly; da mesma forma o profissional de vendas também não entenderá de código, mas saberá se o app pode ser comercializado em seu estado ou não.
No fim das 36 horas de maratona ininterruptas os grupos apresentaram seus projetos. Os vencedores foram os membros do Nerdau Steel, que levaram para casa cada um um iPhone 6 de 64 GB, um voucher de R$ 1 mil para uso com os cursos de curta duração Shift da FIAP e a possibilidade de incubação do projeto pela Gerdau, no valor de até R$ 100.000,00. O segundo e terceiro lugares também receberam prêmios como vouchers dos cursos e vale-compras da Fast Shop. E como um todo os participantes tiveram a opotunidade de interagir com profissionais e fortalecer seus contatos.
Só que nem tudo é perfeito, e a Gerdau deu uma bela pisada na bola. Ao observar o regulamento (cuidado, PDF) você irá esbarrar em algumas regras bem curiosas, que não condizem com o espírito do Hackathon. Na 10ª cláusula, que trata da propriedade intelectual lê-se no segundo item:
“Os participantes se obrigam a ceder à Gerdau, de forma não onerosa e exclusiva, todos os direitos patrimoniais decorrentes dos projetos desenvolvidos durante o Evento, sempre reservando para si os direitos morais a eles associados. Os participantes ainda declaram ser livres de quaisquer ônus ou embaraços à Gerdau os direitos patrimoniais ora cedidos.”
Curioso. Todos os direitos sobre as ideias desenvolvidas são de propriedade da Gerdau e não dos desenvolvedores. Embora ao conversar com participantes e ter constatado que a negociação não inclui o código-fonte (e empresa só faz uso dos PPTs e do .APK finalizado), isso não é um procedimento padrão de outros Hackathons. A criação é dos devs e só deles, o procedimento normal é oferecer aporte e projetos de incubadoras.
No terceiro item, temos:
“Os participantes do Evento declaram expressamente ceder a sua imagem, nome e som de voz à Gerdau e à FIAP, de forma completamente gratuita, sem qualquer tipo de ônus, em caráter irrevogável, irretratável, com prazo indeterminado, em território nacional ou internacional. A concessão de uso de imagem, nome e som de voz não constitui direito de qualquer espécie ao participante, podendo ser utilizado ou não pela Gerdau e/ou FIAP.”
A Gerdau e a FIAP detém também os direitos de imagem dos participantes, e estes não poderão reclamar sobre uso posterior de suas fotos, nomes e gravações de áudio e vídeo.
Por fim, o quarto item:
“Os participantes serão responsáveis pela utilização de suas ideias e pela elaboração de seu projeto, assumindo total e exclusiva responsabilidade decorrente de eventuais reivindicações de terceiros relativos a direitos de propriedade intelectual ou de direito autoral, sendo preservado o direito de regresso ou de denunciação à lide em razão de eventuais questionamentos de terceiros.”
Opa, os desenvolvedores ficam com alguma coisa sim: a responsabilidade legal sobre suas criações. A Gerdau se exime de responsabilidade e qualquer problema posterior, como acusações de plágio não será ela que irá responder, e sim os devs.
Resumindo a história: a Gerdau utilizou o nome Hackathon para absorver ideias dos participantes sem custo, não vai pagar direitos de propriedade intelectual e nem de imagem, e se der problema quem responde são os criadores e não ela. É exatamente a mesma coisa que a Samsung fez cinco anos atrás, com um concurso para desenvolvimento de apps para SmartTVs. É um contrato leonino.
Sugiro um acompanhamento à Gerdau:
Não nego a importância dos Hackathons, eles são importantes não só para permitir a descoberta de novos talentos como também fomenta trabalho e equipe, e muita gente de outros setores que não o de TI passam a ver a área com outros olhos. O que não pode é um desvirtuamento da ideia original para coletar ideias alheias como a Gerdau fez em sua primeira edição do evento.
Ainda que o evento seja importante pelo aprendizado e networking, esperemos que os próximos patrocinados pela Gerdau não sejam assim.
O Meio Bit realizou a cobertura do evento a convite da Gerdau.