Dori Prata 11/09/2024 às 10:21
Desenvolver um novo capítulo para uma franquia como Star Wars não é uma tarefa simples. Ao mesmo tempo em que o seu rico universo abre espaço para que a criatividade floresça, a exigência por parte dos fãs costuma ser implacável, sendo esta muito mais rígida que a vista com outras marcas. Por isso existia uma grande curiosidade em relação ao Outlaws, jogo produzido pela Massive Entertainment e lançado pela Ubisoft.
O primeiro motivo de empolgação relacionado ao jogo estava na sua história, que se passa entre os eventos ocorridos em O Império Contra-Ataca e O Retorno de Jedi. Nela seremos Kay Vess, uma jovem ladra que tem a companhia de Nix, um simpático merqaal que se mostrará extremamente útil na vida de crimes da protagonista.
Nascida no planeta Cantonica e criada na cidade-cassino de Canto Bight, com o passar do tempo a garota criou muitas inimizades, mas foi acolhida por Bram Shano, dono do bar The Broken Hoof. O sonho de Kay sempre foi sair daquele fim de mundo, mas para isso ela precisaria tirar a sorte grande, realizando um roubo muito maior que os praticados diariamente.
Com a impaciência (e irresponsabilidade) típica dos jovens, certo dia ela aceita um trabalho perigoso, o que a coloca no caminho de Zerek Besh, um dos sindicatos do crime mais perigosos daquela galáxia muito, muito distante. Comandado por Sliro Barsha, o grupo ganhou força logo após a Batalha de Hoth, quando o sujeito marcou um encontro e assassinou os líderes dos sindicatos rivais.
O objetivo de Kay era invadir a mansão de Barsha e roubar o conteúdo presente em um cofre, mas após conseguir quebrar o sistema de segurança, descobre que foi enganada. O problema é que o seu contratante era um espião da Aliança Rebelde, cujo real objetivo era liberar um prisioneiro e antes que fosse capturada pelos capangas do dono do lugar, a garota consegue fugir.
Contudo, aquele seria apenas o início de uma longa jornada. Com sua cabeça posta a prêmio, Kay rouba uma valiosa espaçonave de Barsha, a Trailblazer, e no desespero, faz um salto para Toshara. Esse será um dos quatro planetas (os outro são Tatooine, Akiva e Kijimi) que visitaremos durante a aventura e onde encontraremos uma grande quantidade de atividades para “passar o tempo”.
Ao nos colocar na pele de uma caçadora de tesouros e que não segue a lei, Star Wars Outlaws aproveita o conceito de mapa aberto para fazer da exploração — incluindo a espacial, a bordo da Trailblazer — sua principal (e melhor) característica. Com o passar dos anos a Ubisoft se especializou em criar mundos enormes, mas poucos foram os seus jogos em que explorar pareceu se encaixar tão bem quanto na história de Kay Vess.
Enquanto andamos pelos planetas, seja conhecendo as movimentadas ruas de Morigana, principal cidade de Toshara, seja visitando a icônica Mos Eisley, eventualmente esbarramos em itens para serem coletados, mas esses achados não serão sempre aleatórios. Aproveitando a perspicácia de Kay (e do próprio jogador), podemos nos esgueirar para ouvir conversas, encontrar anotações feitas por outras pessoas ou vasculhar computadores para saber onde estão escondidos alguns suprimentos.
Saber escutar o que as cidades têm a nos dizer é uma parte importante de Star Wars Outlaws e a Massive Entertainment soube vincular isso à exploração. Com uma infinidade de NPCs interessantes para serem encontrados, é fácil passarmos horas e mais horas apenas conversando com esses personagens, acompanhando suas atividades ou reparando nos detalhes do cenário, sem falar nos minigames que encontramos pelo caminho.
Do ato de quebrar travas usando um grampo que deve ser acionado seguindo um ritmo sonoro, ao hackeamento de computadores que usa um sistema parecido com o do jogo de palavras Wordle, os desenvolvedores certamente dedicaram muito tempo e carinho na criação desses jogos. Porém, o destaque mesmo vai para o Sabacc, um jogo de carta que pode ser encontrado nas principais cidades e que se tornou um dos meus preferidos.
E conforme avançamos pela campanha, a protagonista adquirirá novas habilidades, como poder hackear armas para atuarem a seu favor, desabilitar câmeras de segurança, destravar portas ou usar seu blaster para ligar motores. Mesmo Nix se tornará mais útil, podendo detectar baús ou chamar a atenção de mais inimigos.
Essas habilidades serão adquiridas após conhecermos especialistas e preenchermos alguns requisitos e/ou adquirimos determinados itens. Essa lista de missões acaba trazendo mais variedade ao jogo e garantindo que estaremos sempre ocupados, na busca para preencher a lista e assim ganharmos algumas vantagens importantes, como fazer menos barulho ao caminhar ou ter um tempinho para agir quando formos detectados pelos inimigos.
Aliás, a porção stealth do Star Wars Outlaws é aquela que mais causará discordância entre os jogadores. Durante boa parte do tempo estaremos em locais em que não deveríamos e como qualquer ladrão que se preze, Kay Vess não deseja ser notada. O problema é que em muitas situações, ser visto pelos inimigos resultará numa falha instantânea da missão, o que inevitavelmente resultará em frustração.
Ciente das reclamações, o diretor de criação do jogo, Julian Gerighty, afirmou que eles mudarão esse sistema, fazendo com que se tornasse menos punitivo. Isso deverá agradar o mais impacientes, mas para quem gosta de se esgueirar por instalações, um ponto positivo é que no geral elas contam com level designs muito legais, proporcionando várias rotas e que, dependendo da criatividade do jogador, podem resultar em caminhos mais ou menos desafiadores.
Outro detalhe interessante que contribui para a jogabilidade é o sistema de afinidade com as facções criminosas. Com várias delas disponíveis e todas se odiando, as missões que realizarmos poderão nos deixar mais bem vistos por alguns grupos — e menos por outros. Assim teremos descontos em vendedores ou mesmo a possibilidade de adquirirmos itens exclusivos, mas também acesso livre a áreas controladas por esses bandidos.
Contudo, realizar atividades suspeitas nessas áreas fará com que a nossa imagem fique manchada com uma determinada facção, o que nos obriga a ficarmos alerta durante quase todo o tempo. Também contribui para a imersão as escolhas que devemos fazer em certas missões: você prefere jogar a culpa em uma facção ou em outra? Acha melhor entregar um determinado item para esse chefe do crime ou para o seu principal rival? Apenas lembre que para agradar um, terá que desagradar o outro.
Simultaneamente, o Império estará tentando controlar tudo e todos. Isso faz com que incursões em áreas sob seu domínio se tornem ainda mais perigosa, já que um enorme alvo será colocado sobre as nossas costas ao as invadirmos e as poucas maneiras de nos livrarmos dele será subornando soldados corruptos ou invadindo os computadores para apagar o nosso rastro.
Resumindo, em Star Wars Outlaws estaremos sempre caminhando a margem da lei, visitando lugares sujos frequentados por sujeitos da pior espécie, caçando itens que muitas vezes foram desviados ou realizando trabalhos para facções criminosas que só querem se tornar mais poderosas. Consequentemente, poucos são aqueles em que podemos confiar, com a aventura quase sempre nos mostrando como o submundo deste universo pode ser fascinante.
Sim, é justamente esse lado mais sombrio e incomum o que mais me agradou no trabalho da Massive Entertainment. Ao fugir do lugar-comum e não nos deixar no controle de um Jedi, o jogo entrega uma experiência muito divertida e que confesso, não sabia que queria tanto. Tuto bem, é legal ver o balé de Cal Kestis ou a agilidade de Galen Marek empunhando seus sabres de luz durante as batalhas, mas nem só de super-heróis precisa vive essa mitologia e poder assumir o papel de uma pessoa comum, também tem seus méritos.
Em um universo como o de Star Wars, Kay Vess seria gente como a gente, alguém com mais defeitos que virtudes e que, até pela sua origem humilde, está a todo momento se autodepreciando. Essa é uma protagonista que está apenas tentando sobreviver mais um dia e que usa toda a sua malandragem para ter alguma chance nisso. Aqui não temos poderes telecinéticos, não daremos saltos duplos no ar, muito menos teremos a graciosidade de um espadachim — o que considero algo positivo.
Mesmo não sendo o primeiro jogo a evitar um Jedi como protagonista, não estamos acostumados com essa abordagem e se ela funcionou em séries e filmes recentemente, por que não poderia ser aproveitada também de uma forma interativa? Para muitas pessoas, videogames são uma forma de escapismo, são sobre nos colocar no papel de seres poderosos e tudo bem, mas eles não precisam ser apenas sobre isso.
Ao se dispor a nos contar a história de uma simples ladra, Star Wars Outlaws mostra o quão rico é esse universo, fazendo com que possamos nos sentir mais imersos, mas sem ignorar toda a fantasia, o que inclui estar entre seres alienígenas convivendo de maneira relativamente harmoniosa, motos flutuantes, androides e espaçonaves.
Mas acima de tudo, esse é um jogo que me divertiu pelos personagens interessantes que encontrei pelo caminho, pelas missões variadas que não passaram a sensação de estarem ali apenas para aumentar a vida útil e pelo desafio proposto ao tentar me manter despercebido durante as invasões.
Star Wars Outlaws não revolucionará a indústria, mas entrega uma boa qualidade e principalmente, é um jogo bacana, independentemente da marca que carrega em seu título. É um jogo que me mostrou que eu adoraria viver naquele universo, mesmo sem um sabre de luz, sem a companhia de um robô e mesmo se aparentemente a força não estivesse comigo.