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Crate Entertainment, independência e os RTSs

Para CEO da Crate Entertainment, vácuo deixado pelas grandes editoras pode ser uma boa oportunidade para apostar no "gênero nerd" RTS

15/05/2024 às 10:20

Fundada em 2008, a Crate Entertainment pode ser considerada um caso raro na atual indústria de videogames. Do pequeno úmero de funcionários que possui até a resistência às investidas das grades editoras, a desenvolvedora segue atuando de maneira independente e isso tem lhes permitido trabalhar em títulos que muitos não enxergam como potenciais sucessos.

Crate Entertainment

Crédito: Reprodução/Vollhov/DeviantArt

Nascida das cinzas da Iron Lore Entertainment, o estúdio conseguiu adquirir os direitos para usar a engine que àquela empresa usou para criar o Titan Quest, o que lhes permitiu desenvolver o título que os colocariam no mercado, Grim Dawn.

O projeto contou com uma bem-sucedida campanha de financiamento coletivo e o dinheiro arrecadado dessa forma permitiu que a Crate Entertainment contratasse mais funcionários — inicialmente eram apenas dois — e após alguns anos, em 2013 aquele jogo chegou ao Steam através do programa de Acesso Antecipado.

Algumas expansões e milhões de cópias vendidas depois... Em 2021 foi a vez do estúdio anunciar uma nova propriedade intelectual, um jogo de construção de cidades chamado Farthest Frontier. Aquela era uma mudança de ares interessantes, mas os responsáveis pela companhia queriam se arriscar ainda mais.

Enquanto prepara seu atual projeto para tirá-lo do Acesso Antecipado e se dedica à expansão Fangs of Asterkarn, para o Grim Dawn, a Crate Entertainment também está produzindo um jogo de estratégia em tempo real (ou RTS, de real-time strategy) e foi sobre a dificuldade em trabalhar com o gênero que falou o CEO Arthur Bruno.

Crate Entertainment

Crédito: Divulgação/Crate Entertainment

Voltados para um nicho de jogadores, os RTSs costumam ser evitados pelas grandes empresas e isso ficou claro para Bruno quando ele foi procurado pelo Embracer Group, que tinha intenção de adquirir sua desenvolvedora. Mesmo sem querer trabalhar para outras pessoas, ele aceitou o convite para conversarem.

“Aceitei ir à reunião para ver o que havia para ouvir e eles perguntaram no que estávamos trabalhando e quando mencionei um RTS, as pessoas visivelmente reclamaram, tipo: ‘Ah, porque você trabalharia em um RTS?’,” contou Arthur Bruno. “Sabe, eles disseram: ‘Um RTS é como se fosse exclusivo para PC por natureza, porque você trabalharia em um jogo para uma plataforma, quando pode criar algo multiplataforma e de outro gênero?’”

Pois aquela conversa serviu para iluminar o raciocínio do executivo. Segundo ele, o fato de uma editora como a Embrace não querer fazer um RTS era justamente a razão para eles quererem se arriscar pelo gênero.

Outro ponto interessante levantado por ele diz respeito a tentativa dos desenvolvedores de tornar os jogos de estratégia mais populares. “Sinto que os RTSs nunca serão tão populares,” defendeu. “Quer dizer, lamento dizer isso, mas por mais que eu o ame, é um gênero nerd, há apenas uma parcela limitada da população que sempre está interessada nesse tipo de jogo, a menos que você o mude a ponto de deixar de ser o tipo de RTS que quero jogar.”

Porém, isso não significa que Bruno não tenha esperança de alcançar um bom público, com um milhão de cópias vendidas já sendo suficiente para que a Crate Entertainment tenha um retorno financeiro. Já no caso de uma empresa muito maior que a dele, esse número teria que ser muito maior, o que estaria fazendo com que os figurões não invistam mais no gênero.

Crédito: Divulgação/Slavic Magic

Além disso, acredito que o gênero ainda precisa lidar com outro problema, que é convencer os fãs a investirem muito tempo em jogos assim. Aqui vai muito da minha experiência com eles, pois mesmo adorando esses títulos, costumo evitá-los justamente porque sei que ao iniciar um, perderei a noção do tempo e ficarei em seu universo por semanas.

Isso também vale para os jogos de construção de cidades, como o próprio Farthest Frontier — que confesso, não conhecia, mas já entrou no meu radar. Para mim, há algo de fascinante em gerenciar uma cidade e vê-la crescendo conforme as nossas decisões e sempre que coloco as mãos em um título assim, a sensação é de que nenhum outro gênero me agrada tanto.

E talvez seja por isso que eu dê muito menos atenção do que deveria aos jogos de estratégia. Recentemente comecei o Manor Lords e embora só tenha conseguido dedicar alguns minutos a ele, volta e meia me pego pensando em formas de melhorar minha vila e no quanto o sucesso que o jogo tem feito é justificável.

Mas assim como eu, imagino que muitos fãs dos jogos de gerenciamento de cidade ou RTS também se encontrem numa encruzilhada criada pela falta de tempo. Logo, naqueles momentos em que temos apenas poucas horas (e às vezes nem isso), o melhor seria abrir títulos que podem ser aproveitados em pequenas sessões ou entrar de cabeça em algo que precisará de muito tempo para vermos alguma evolução?

Talvez esse desabafo nem seja compartilhado por aqueles que adoram o gênero, mas o fato é que esse é um estilo voltado para um público relativamente pequeno e a explicação de Arthur Bruno serve para entendermos por que tão poucos jogos assim são produzidos.

Crédito: Divulgação/Paradox Interactive

Pois uma saída para reduzir o custo de produção e consequentemente o risco envolvido na criação desses jogos é a utilização de inteligência artificial. Porém, empresas que estão apostando nessa estratégia estão recebendo críticas e uma delas é a Paradox Interactive. Mesmo deixando um aviso na página da expansão The Machine Age em que admite a utilização dessa tecnologia no desenvolvimento, o estúdio tem lidado com reclamações.

No conteúdo lançado para o jogo Stellaris, a empresa afirma ter aproveitado a IA para gerar materiais visuais de referência, dublagens para dois personagens e textos que serviram de inspiração. Já no Reddit, o diretor do jogo, Stephen “Eladrin” Muray, explicou como essas ferramentas foram aproveitadas de maneira que ele considera justa.

“O uso ético da tecnologia de IA é muito importante para nós — somos muito bons em explorar ficção-científica distópica e não queremos acabar nela.

Pessoalmente, usei ferramentas de geração de imagens para criar esboços básicos de coisas nas quais os designers de sistema e eu estávamos pensando, já que sou péssimo em arte, mas bastante decente em fazer com que os computadores façam o que estou pensando.”

Crédito: Divulgação/Paradox Interactive

Muray então afirmou que depois os artistas do estúdio aproveitaram essas ideias e as usaram (ou não) como inspiração para o que vemos no jogo. Ele garante que nenhuma das artes que gerou acabaram na versão final da expansão.

Quanto as dublagens, os atores que serviram como modelo receberam royalties por cada linha gerada artificialmente, já os textos produzidos com IA seriam conteúdos básicos que os designers usaram apenas para se inspirarem. Por fim, o diretor disse que a Paradox Interactive possui “algumas rígidas diretrizes em vigor sobre como as ferramentas de IA podem ser usadas de forma legal e ética.”

O tema é polêmico, mas não há como negar que essa tecnologia pode ajudar a diminuir o custo de desenvolvimento dos jogos. Se isso levará a mais demissões, é aí que reside o principal argumento de quem é contra a utilização de IA na indústria.

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