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Uma boa noite de sono e uma "faxina" no cérebro

Estudo revela que dormir bem permite aos neurônios "limparem" detritos do cérebro, que aumentam chances de doenças degenerativas

15/04/2024 às 10:27

Todo mundo precisa de uma boa noite de sono, isso é fato; as 8 horas recomendadas pelos médicos têm razão de ser, e agora, um novo estudo revela o quão essencial é para o cérebro que nós descansemos direito: enquanto você dorme, seus neurônios trabalham para se livrar do lixo acumulado enquanto esteve acordado.

De certa forma, o cérebro roda uma rotina de "soft reboot" para eliminar detritos, que caso se acumulem, podem aumentar as chances de você sofrer com doenças degenerativas no futuro.

Enquanto você descansa, seu cérebro faz uma faxina caprichada, e necessária (Crédito: iStock)

Enquanto você descansa, seu cérebro faz uma faxina caprichada, e necessária (Crédito: iStock)

Cérebro joga o "lixo" fora

É fato conhecido que o cérebro não exatamente "dorme", ao invés disso, nossos neurônios executam certas atividades que não entendemos completamente. Nossos sonhos, por exemplo, são gerados durante o sono R.E.M. (sigla em inglês para movimento rápido dos olhos), em que nossos miolos trabalham como se nós estivéssemos acordados, mas continuamos dormindo.

Em outros momentos, os neurônios realizam atividades percebidas como ondas rítmicas, ligadas à fase do sono em que realmente descansamos, e estas foram o objeto de estudo de pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Washington em St. Louis, nos Estados Unidos. Segundo o artigo (cuidado, PDF), enquanto dormimos, o cérebro executa uma operação de "faxina", para eliminar detritos criados ao metabolizar a energia necessária para operar, durante o dia.

Lembrando das aulas de Biologia, o cérebro responde por apenas 2% de nossa massa, mas consome cerca de 500 calorias por dia, o que equivale a 25% de uma dieta diária saudável. Ele é de longe o órgão mais comilão do corpo humano, o que se justifica com ele sendo o responsável por gerir todo o funcionamento do nosso organismo. Porém, gerar a energia necessária deixa "sujeira" para trás, na forma de fragmentos de proteínas.

Estudos anteriores já ligaram a presença desses detritos no cérebro, a uma maior chance do paciente desenvolver doenças degenerativas sérias, como o Mal de Alzheimer, e os neurônios por si só reconhecem sua permanência como algo nocivo. É aqui que entra o sistema glinfático (não confunda com o linfático), uma rede de vasos cuja função é eliminar resíduos do Sistema Nervoso Central (SNC).

Exatamente por não ter vasos linfáficos, o SNC pode acumular resíduos facilmente, assim, a troca de fluidos entre ele e o sistema glinfático é importante para não permitir que essa sujeira cause danos. Ele permite uma troca entre o líquido cefalorraquidiano (LCR) e o líquido intersticial (LI), para se livrar desses detritos.

É aqui que uma boa noite de sono entra como um fator essencial.

Uma boa noite de sono é essencial para que o cérebro mantenha tudo funcionando (Crédito: Shutterstock)

Uma boa noite de sono é essencial para que o cérebro mantenha tudo funcionando (Crédito: Shutterstock)

Bons sonhos e boa faxina

A pesquisa da Universidade de Washington consistiu em observar como neurônios atuam na eliminação de detritos, e para isso fizeram testes em cérebros de ratos, implantando eletrodos nos espaços entre os neurônios. As cobaias foram então anestesiadas com cetamina, para dormirem.

Uma vez que os ratinhos apagaram, seus cérebros dispararam longas ondas, que embora lentas, induziram ondas correspondentes no LCR, movimentando-o em direção à dura-máter, a mais externa das três camadas da meninge, e levando todo o lixo para fora com ele.

Os pesquisadores comprovaram que os neurônios eram os responsáveis pela ativação das ondas cerebrais longas, alterando o cérebro de alguns ratos para que eles não tivessem quase nenhum tipo de atividade neuronal (mas não a ponto de causar morte cerebral), enquanto estivessem dormindo, e de fato, o sinal não foi disparado.

Com isso, os pesquisadores demonstraram que os neurônios precisam estar ativos, e o indivíduo dormindo, para que o cérebro entre no modo "faxina" para se livrar de todo o lixo metabólico. Eles também levantaram a hipótese, ao observar espécimes não alterados, de que os neurônios lançam ondas mais rápidas em algumas ocasiões, supostamente, para eliminar as "sujeiras" mais resistentes.

Ao mesmo tempo, o tipo de anestésico usado em pesquisas anteriores importa; os que afetam a atividade neuronal retornarão resultados diferentes, o mesmo valendo para métodos mais agressivos e invasivos, que chegaram a ferir os ratinhos. O uso da cetamina, uma substância que vem sendo recentemente empregada no tratamento da depressão, e sujeita a um controle rígido no Brasil, devido os riscos envolvidos em seu uso de forma indiscriminada, foi o que fez a diferença nessa pesquisa.

O estudo ainda abre lacunas para observações mais detalhadas do processo, mas ele de cara demonstra que dormir bem, e pelo tempo recomendado pelos médicos, pode fazer a diferença a longo prazo em sua qualidade de vida.

Referências bibliográficas

JIANG-XIE, L.F., DRIEU, A., BHASIIN, K. et al. Neuronal dynamics direct cerebrospinal fluid perfusion and brain clearance. Nature, volume 627, 8 páginas, 28 de fevereiro de 2024. Disponível aqui.

Fonte: Ars Technica

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