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Meta matou Facebook Watch, abriu DMs por anúncios da Netflix

Processo revela que Meta cedeu à Netflix acesso a mensagens privadas de usuários do Facebook, e Watch foi encerrado, pelo dinheiro em anúncios

01/04/2024 às 12:42

Meta, Apple, Google e Amazon, as "quatro grandes" companhias de tecnologia dos Estados Unidos, enfrentam vários processos antitruste em casa, de órgãos como o Departamento de Justiça e a FTC (Comissão Fedreal de Comércio).

No caso da companhia de Mark Zuckerberg, a ação movida pela agência de comércio acusa a empresa de estabelecer um monopólio que prejudica a concorrência em redes sociais e mensageiros instantâneos, graças às aquisições de concorrentes com grande alcance, especificamente Instagram e WhatsApp.

Usuários do Facebook tiveram suas mensagens privadas vasculhadas pela Netflix, com aval do Meta (Crédito: Dado Ruvic/Reuters)

Usuários do Facebook tiveram suas mensagens privadas vasculhadas pela Netflix, com aval do Meta (Crédito: Dado Ruvic/Reuters)

O processo já revelou como o Meta usou o Onavo como uma "escuta" contra Snapchat, YouTube e Amazon, e agora, novas informações apontam para como a empresa matou o Facebook Watch, sua tentativa de entrar no mercado de streaming de vídeo, e abriu o acesso às mensagens privadas de usuários na rede social, para não perder um cliente de grande porte: a Netflix.

Facebook Watch, ou ads da Netflix? Hummm...

Eu não te culpo se você não se lembra do Watch; eu mesmo não me recordava dele, mesmo tendo escrito alguns artigos sobre no Meio Bit. Introduzido em agosto de 2017, ele fazia parte do esforço antigo do Zuck em manter os usuários 24/7 dentro do Facebook, que ele posicionava como um "app de tudo" (qualquer semelhança com como Elon Musk vê o X, não é coincidência). Mesmo hoje, uma boa parcela do público vê o "Face" como "a internet".

O Watch nasceu como um agregador de criações em vídeo, sejam em VoD ou streaming ao vivo, centralizando tudo em uma única interface, no desktop, mobile, e Smart TVs. Posicionado como um concorrente da Netflix, Amazon Prime Video e principalmente YouTube, que havia começado a investir pesado em produções originais, com um formato de monetização baseado em contratos e anúncios.

Criadores pequenos e individuais, como streamers independentes, teriam acesso à grana dos ads veiculados, no formato "mid-break" (interrupção da transmissão), exatamente por isso, conteúdos em VoD não poderiam ter menos que 90 segundos, e streamings teriam que durar mais que 6 minutos, para serem monetizados.

Criadores grandes, por outro lado, ganhariam um adicional via contratos formais, que o Meta fechou com veículos como o The New York Times, a National Geographic e o The Wall Street Journal, plataformas como o Buzzfeed, agências governamentais como a NASA, ligas e clubes esportivos como a MLB e o FC Barcelona, e celebridades como Elizabeth Olsen, Shaquille O'Neal, Kevin Hart, Michael Phelps, Russell Wilson, Gordon Ramsey, dr. Deepak Chopra, DJs Armin Van Buuren e Hardwell, Logan Paul, etc.

Pois bem, não durou. Meros 4 meses depois, em dezembro de 2017, a empresa entrou no modo Darth Vader e alterou o acordo, ao revelar que a partir de 2018, não renovaria nenhum dos mais de 300 contratos firmados até então, e todos os criadores de grande porte foram colocados na mesma posição que o populacho: que fizessem dinheiro com anúncios, e tão somente.

Meta lançou Facebook Watch em 2017, cortou pagamentos a criadores em 2018, e deixou de investir no serviço em 2023 (Crédito: Reprodução/Meta/Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Meta lançou Facebook Watch em 2017, cortou pagamentos a criadores em 2018, e deixou de investir no serviço em 2023 (Crédito: Reprodução/Meta/Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

O motivo para essa mudança repentina, acreditava-se na época, era de que o Meta, uma vez que já havia conseguido atrair vários criadores de peso para o Watch, não mais teria que pagar um por fora, e os "parceiros" que se resignassem ao mesmo formato de monetização padrão do YouTube. Porém, não é bem isso que um documento submetido à corte em 2020 (cuidado, PDF) no processo da FTC, mas que chamou a atenção agora, através de uma carta e pedido de intimação contra Reed Hastings, CEO da Netflix.

O documento original menciona que o Meta, na época Facebook, fechou "acordos secretos" com diversos apps e serviços, para o compartilhamento de dados sensíveis e remoção de restrições para a veiculação de anúncios (basicamente, uma inclusão em uma "lista branca"). Os dados sensíveis em questão, no caso, seriam mensagens as privadas dos usuários, trocadas via Inbox (não se sabe se isso envolve outros serviços, como Messenger, WhatsApp ou Instagram).

Ao mesmo tempo, a carta que pede que Hastings compareça ao tribunal menciona sua relação com o Meta, do qual ele era membro do conselho, e sua proximidade com Mark Zuckerberg e a então COO (chefe de operações) Sheryl Sandberg, a N.º 2 da gigante. Facebook e Netflix vivam em uma relação simbiótica, graças ao enorme investimento em anúncios que a plataforma de streaming despejou na rede social, entre 2011 e 2019 (o documento é datado de 2020).

Meta deu acesso a mensagens dos usuários

O acordo daria à Netflix o acesso à API Titan, uma ferramenta oferecida a parceiros na "lista branca", que permite o compartilhamento cruzado de conteúdos, e à API da Inbox, que gerencia as conversas privadas. Em troca, a plataforma de streaming continuaria investindo pesado em anúncios na rede social, mas a introdução do Watch teria incomodado Hastings, o que Zuck não poderia permitir.

Como consequência, o Facebook foi aos poucos depreciando seu próprio produto, de modo a não prejudicar a boa relação com a Netflix, que beneficiava ambas empresas; o app dedicado do Watch foi descontinuado no mobile e Smart TVs em 2022, e o Meta deixou de viabilizar a produção de conteúdos originais em abril de 2023, na mesma época em que demitiu mais de 10 mil funcionários.

No fim, o Facebook Watch se tornou um cadáver que esqueceram de enterrar, já que as produções legadas continuam no ar, e só podem ser acessadas abrindo o Facebook no desktop, tudo para Zuck não perder a grana em anúncios da Netflix, que teve um concorrente tirado da equação.

Produções originais para o Facebook Watch, como Sorry for Your Loss (acima), só podem ser assistidas pelo desktop (Crédito: Divulgação/Starkeeper/Suzy B./Brillstein Entertainment Partners/Big Beach/Meta)

Produções originais para o Facebook Watch, como Sorry for Your Loss (acima), só podem ser assistidas pelo desktop (Crédito: Divulgação/Starkeeper/Suzy B./Brillstein Entertainment Partners/Big Beach/Meta)

A carta anexada ao processo menciona ainda que o Meta comemorou acordos de licenciamento em 2018, que lhe permitiria exibir conteúdos como Dawson's Creek, no qual teria injetado US$ 200 milhões, apenas para no mesmo ano, o Watch sofrer um corte brutal de US$ 750 milhões no orçamento; na época, Mark Zuckerberg disse que a mudança foi tomada "com base no que eu (Zuck) sei agora, sobre nossas estratégias".

Em janeiro do mesmo ano, Sheryl Sandberg teria sido "convidada" a participar de uma reunião com Hastings e a cúpula da Netflix, em que o assunto foi a estratégia do Meta em concorrer com o serviço, o que não teria sido visto com bons olhos pela parceira de negócios.

A estratégia do Meta de negociar os dados do usuário com terceiros não é nenhuma novidade, e o Watch, assim como experimentos do YouTube e Snapchat, que também encerraram suas produções originais, mostram que estabelecer uma plataforma de streaming de vídeo, seja em VoD ou ao vivo, não é para qualquer um.

Por outro lado, a proximidade entre a Netflix e a companhia de Mark Zuckerberg será outro ponto negativo que Lina Khan, a detestada (pelas big techs) comissária-chefe da FTC, vai assinalar na carteirinha da rede social, lembrando que um dos objetivos do processo é forçar o Meta a vender o Instagram e o WhatsApp, entre outras resoluções.

Fonte: Gizmodo, Ars Technica

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