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Antes dos Disquetes: 3 formas arcaicas de armazenamento de dados

Armazenar dados era fundamental para a microinformática, e fazíamos isso mesmo antes dos disquetes. Vamos conhecer alguns desses métodos.

29 semanas atrás

Disquetes por décadas foram a forma básica de troca de informação entre computadores, quando você queria passar algo para alguém, um documento, fotos ou vírus, usava disquetes, mas como armazenávamos dados antes deles?

Tabuleta de escrita precoce registrando a alocação de cerveja; 3100-3000 AC, provavelmente do sul do Iraque. (Crédito:BabelStone wikimedia commons)

Hoje em dia para o Jovem™ médio, disquetes são estranhas representações físicas do ícone de salvar, e quando alguém pede “passa isso pra mim”, o ato de transferir um arquivo é essencialmente sem-fio, tudo é feito via Whatsapp, OneDrive, às vezes email, se quem pediu tem mais de 70 anos.

Essa mudança foi especialmente rápida, poucos anos atrás tudo era feito via pendrive, e o advento dos smartphones gerou a criação dos pendrives híbridos, com conectores USB-A e MicroUSB (ou Lightining), e mais tarde USB-C.

Esses pendrives eram essenciais, por virtualmente todo mundo perde os adaptadores OTG para usar dispositivos USB no celular.

Antes deles o método preferido de compartilhar dados era o CD-R, seguido pelo DVD-R, mas ainda era algo muito democrático, se seu PC não estivesse num bom dia, iria perder vários DVDs nas tentativas de gravação. Por isso, sempre que possível a gente preferia disquetes, mas nos primórdios, primórdios mesmo, disquetes ou não existiam ou eram inacessíveis para jovens entusiastas pré-adolescentes.

Vamos então conhecer três tecnologias do passado distante:

1 – Fita Perfurada

O cartão perfurado talvez seja o meio de armazenamento de dados que durou mais tempo, depois do livros de papel. Criado em 1725 para guardar padrões de bordados em teares, o cartão perfurado durou até pelo menos o final dos Anos 1980, quando a IBM finalmente parou de produzir novas unidades.

Em uma espécie de prova de sua imortalidade, cartões perfurados continuam sendo usados hoje em dia, em... máquinas de crochê.

Logo os cartões foram adaptados em fitas perfuradas, inicialmente eram usadas em teares também, depois apareceram em pianolas, como na abertura de Westworld. Com a invenção do telégrafo, eventualmente a fita perfurada foi utilizada para armazenar mensagens pré-preparadas.

A tecnologia evoluiu, padronizando-se uma codificação de 5 (mais tarde 8) bits para representar os caracteres do alfabeto. Essa tecnologia foi usada em terminais de TELEX, onde ao invés de código-morse, um terminal de teletipo conversava com outro terminal remotamente, os dados transmitidos eram perfurados na hora em uma fita de papel local, ao mesmo tempo em que eram impressos em caracteres normais em uma folha. No outro lado, o processo se revertia.

Veja que coisa linda:

Nos primórdios da microinformática, quando os micros eram basicamente montados em casa usando kits, e por montados em digo soldando CIs nas placas, os primeiros equipamentos não tinham nem tela nem teclado, no máximo um conjunto mínimo de teclas para entrar dados em hexadecimal, e alguns LEDs de notificação. Uma grande idéia que alguém teve foi incluir uma interface serial nesses computadores, e fazê-la compatível com fitas perfuradas.

Fitas perfuradas, codificadas em 5 e 8 bits. (Crédito: TedColes / Wikimedia Commons)

Assim os hobbystas, na maioria das vezes estudantes universitários ou profissionais de informática, podiam usar os terminais em seus empregos ou faculdades e escrever código para seus computadores, que seriam mais tarde lidos com um leitor de fita perfurada.

Quando Bill Gates e Paul Allen criaram o BASIC para o Altair 8800, o primeiro computador pessoal vendido em larga escala, eles distribuíram o software em fita perfurada. O Altair era tão primitivo que era preciso inserir manualmente o bootstrap, a sequência de comandos de boot que instruía a CPU a iniciar a interface serial e carregar o BASIC em memória. Aqui uma recriação desses passos:

Por um tempo todo mundo usava fita de papel, mas era incômodo e caro, terminais de teletipo custavam uma fortuna, então pouca gente tinha um em casa. Felizmente os computadores evoluíram rapidamente, em 1976 Steve Jobs e Woz lançaram o Apple I, que vinha com uma saída para TV e possibilidade de conexão de um terminal de teletipo ou um teclado ASCII.

2 - Fita Cassete

Para baratear o armazenamento de dados, pelo equivalente a US$400 em 2023 você podia comprar uma interface para fitas K7, que gravava dados em fitas a uma velocidade de 1,2kbps. Não, não dava pra fazer streaming em 4K.

Isso foi um produto imensamente popular. No ano seguinte o Apple II já vinha com uma interface de K7 incorporada, e todo microcomputador vendido na face da Terra replicou a idéia.

O primeiro drive de disquetes da Apple, o Disk II, foi lançado em 1978 pelo equivalente em 2023 a US$2316,40, fora do alcance para a maioria dos mortais. Já a interface de cassete usava algo que todo mundo tinha em casa, um gravador K7, que custava uma ninharia, e as fitas não eram caras, também.

Mesmo o IBM PC, em suas primeiras encarnações, vinha com uma interface para fita K7, mas era um dos produtos menos populares da IBM. Virtualmente ninguém usou o recurso, quem tinha dinheiro para um PC, tinha dinheiro para duas unidades de disquete, o padrão era deixar o disco do DOS na unidade A: e usar a B: para os disquetes com os programas que você queria executar.

 

Na periferia disso tudo, longe dos IBM PCs, Vaxes e outros computadores de verdade, surgiu todo um ecossistema de jovens entusiastas, a maioria adolescentes, que conseguiram convencer seus pais da importância de um computador para seu futuro. Com isso dezenas de milhares de Commodores PET, Commodore 64, Amstrads, Sinclair ZX80/81 e muitos outros computadores de baixo custo foram vendidos.

Em comum, a interface de K7, pois virtualmente todo mundo tinha um gravador em casa.

O setup padrão de todo garoto britânico rico (Crédito: Marcin Wichary / Wikimedia Commons)

Rapidamente a gente ia acumulando uma invejável coleção de fitas, copiando aplicativos e jogos de amigos, em visitas individuais ou em “clubes”  de usuários. Programas mais raros eram disputados, principalmente versões “alternativas” de jogos com esquemas de proteção.

No ZX Spectrum, kibado no Brasil como TK-90X, a velocidade da interface de cassete era de 1200 bauds, que dá para ser transcrito mais ou menos diretamente para 1.2Kb por segundo.

Ou seja: Esta imagem, com 118KB...

Imagem genérica -mesmo- (Crédito: Stable Diffusion)

Levaria 12.8 minutos para ser carregada de uma fita K7.

Alguns jogos usavam sistemas de proteção baseados em rotinas próprias, que contornavam a ROM do Spectrum, e faziam todo o trabalho de I/O.  Esses programas aumentavam a velocidade da gravação, subindo para 2400, 4000 e até 9600 bauds, o que tornava o carregamento do programa extremamente rápido, mas muito sujeito a falhas, como cabeçote sujo, ou desalinhado, o famoso Azimute.

Não, não essa.

A fita magnética deve passar perpendicular à cabeça de leitura/gravação, mas equipamentos diferentes tinham posições ligeiramente diferentes, em alguns casos era preciso usar o parafuso de azimute para alterar a inclinação da cabeça. Na imagem abaixo, é o parafuso do lado direito da cabeça, com uma mola.

Parafuso de azimute. (Crédito: Raimond Spekking / Wikimedia Commons)

Copiar fitas exigia dedicação, os mais sortudos tinham tape decks de alta qualidade, com equalizadores e outros equipamentos, que conseguiam recuperar as fitas mais teimosas e desgastadas.

3 - ZX Microdrive

Quando migramos para o CP-400, Amiga, MSX, alegremente abandonamos de vez as fitas K7, era uma eternidade o tempo para carregar um programa, e usar as fitas para gravar dados era algo por demais desajeitado e sujeito a erros.

A história do MSX no Brasil, e como uma interface de disco não-oficial e criada na gambiarra se tornou padrão nacional por si só daria um artigo inteiro, mas neste vamos finalizar falando de uma tecnologia que não conseguimos copiar, ficou restrita ao Reino Unido, mas foi uma alternativa aos disquetes por demais interessante: O Microdrive.

Proposto em 1974, o ZX Microdrive ficou na gaveta até começar a ser desenvolvido pela Sinclair Research em 1982, como uma alternativa à fita K7 do ZX Spectrum.

ZX Microdrive (Crédito: Jzh2074 / wikimedia commons)

O conceito é lindamente simples: Em um cartucho de 44 mm × 34 mm × 8 mm, uma fita magnética contínua de 5m consegue armazenar até 85KB de dados, com uma velocidade de leitura de 15KB/s, 100 vezes mais rápido que o gravador cassete.

O ZX Microdrive era extremamente inteligente (pra época), você podia salvar programas e arquivos de dados sem se preocupar com a posição deles na fita. Era possível listar o diretório de tudo gravado no microcassete, e trocar de cassete era uma brisa.

O mais revolucionário era que quem quisesse e tivesse grana, poderia encadear oito ZX Microdrives, acessados individualmente.

Isso tudo em um computador com 48KB de RAM.

Infelizmente o Microdrive não vendeu muito. Ele pegou fama de dar muito problema, a vida útil dos microcassetes ser curta e o kit de expansão, com interface, leitor e microcassete em 1985 custava £99.95, equivalente a US$371,37 em 2023. Além da mesada da maioria das crianças.

O ZX Spectrum, quando lançado em 1982, custava o equivalente em 2023 a US$754.60. Ou seja, o ZX Microdrive sozinho custava quase metade do preço do computador.

Por esse motivo o Microdrive era mais raro que dentes em galinhas, em terras tupiniquins, e eu mesmo nunca vi um ao vivo.

Conclusão:

Hoje vivemos o ocaso da mídia física para usuário final. No máximo temos um pendrive para entregar arquivos quando o Whatsapp não quer cooperar. Somente nerds e administradores de Datacentres se preocupam com discos e transportes de dados. Para o resto, está tudo na nuvem, no máximo naquele MicroSD que veio com o celular e hoje está desesperado sem conseguir armazenar mais nada, depois de 7500 horas de mensagens de voz.

A parte ruim é que por mais arcaica que seja a fita de papel, por mais lenta que seja a fita cassete, ou pouco-confiável o Microdrive, os dados ainda são seus, estão contigo. Já a nuvem, bem, não existe nuvem, é só o computador de outra pessoa.

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