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Martha is Dead: censura no PlayStation e o limite do terror

Estúdio italiano anuncia que o Martha is Dead foi censurado no PS4/PS5 e reacende debate sobre até onde um jogo de terror pode ir

2 anos atrás

Quem gosta de jogos ou filmes de terror está acostumado a ver as maiores atrocidades sendo cometidas na tela, mas quando o Martha is Dead for lançado, nem tudo o que seus criadores planejaram nos será mostrado. Quer dizer, pelo menos não se estivermos jogando em um PlayStation 4 ou PlayStation 5.

Martha is Dead

Crédito: Divulgação/LKA

Martha is Dead é um jogo de terror psicológico cujo desenvolvimento há algum tempo vem chamando a atenção dos apaixonados pelo gênero. Ambientado na Itália no final da Segunda Guerra Mundial, nele assumiremos o papel de Giulia, a filha de um soldado alemão que precisará lidar com a brutal morte de sua irmã, a garota que dá nome ao título.

Abordando temas como superstição, folclore e transtorno do estresse pós-traumático, o jogo promete entregar uma recriação fiel da Toscana da época, com a dublagem dos personagens respeitando inclusive a língua local. Segundo o diretor de criação Lucas Dalco, apesar daquela região ser conhecida pela sua beleza, ela também possui um lado sombrio, como, por exemplo, ter sido o palco de diversos crimes cometidos nas décadas de 80 e 90 por um serial killer que ficou conhecido como o Monstro de Florença.

Diante de uma atmosfera tão pesada, era de se esperar que o Martha is Dead tivesse uma classificação indicativa alta e isso de fato aconteceu. Para a ESRB, o jogo não deveria ser consumido por menores de 17 anos, afinal ele traz sangue, violência, nudez parcial, palavrões e em determinado momento até um diálogo que fala sobre estupro. Mesmo assim, o título teria conseguido fugir do tão temido selo Adult Only, o que o impediria de ter sua caixa exposta nas prateleiras das lojas nos Estados Unidos.

A morte, tema central do jogo da LKA (Crédito: Divulgação/LKA)

Contudo, existe ao menos uma passagem na criação do estúdio LKA que parece ter incomodado bastante os executivos da Sony, a ponto de a empresa impor uma censura e exigir que ela fosse retirada da versão final. Mesmo com o Martha is Dead estando há poucos dias do seu lançamento, a desenvolvedora anunciou que terá que adiar sua versão física, tudo para poder se adequar as ordens da empresa japonesa.

Na conta oficial do jogo no Twitter, os criadores se defenderam:

Martha is Dead é uma aventura narrativa recomendada apenas para o público adulto, com o jogo consistindo em cenas potencialmente desconfortáveis e temas que podem estressar alguns jogadores. Tanto a [editora] Wired Productions quando a LKA sempre foram abertas e honestas em relação ao conteúdo do Martha is Dead, com as representações sensíveis no jogo sendo constantemente comunicadas à mídia desde que o jogo foi anunciado, em 2019. Esse conteúdo também é sinalizado de forma clara e repetida no próprio jogo antes dele começar.

 É com pesar que tivemos que modificar a experiência nas versões para PS5 e PS4, com alguns elementos não podendo mais serem reproduzidos.

Além de confirmar o lançamento digital para o dia 24 de fevereiro, a nota não especificou o tipo de conteúdo que foi removido nos consoles da Sony, mas fez questão de confirmar que tanto no PC quanto no Xbox One e no Xbox Series S|X o jogo será disponibilizado sem qualquer censura.

Algumas pessoas até começaram a especular o que teria chamado a atenção da fabricante do PlayStation e uma das hipóteses levantada pode ser vista no vídeo abaixo. Nela temos uma sequência do Martha is Dead em que o jogador precisa cortar a pele do rosto de um cadáver e depois usá-la como uma máscara. A cena é perturbadora, provavelmente deixará muitas pessoas incomodadas, mas será que foi por isso que a Sony resolveu se intrometer na criação da LKA?

Há quem afirme ter visto coisas muito piores em diversos jogos e sem que a Sony tivesse impedido suas publicações. Outro argumento defendido por aqueles que não gostaram da censura é: se o Martha is Dead pode ser publicado na íntegra nos consoles da família Xbox, porque o mesmo não acontecerá no PlayStation?

Vale dizer que outro jogo da mesma desenvolvedora, o The Town of Light, está disponível para o PlayStation 4 e até para o Nintendo Switch, sem que qualquer corte tivesse ocorrido e com ele igualmente abordando temas sensíveis como saúde mental, violência e abuso sexual. Isso me faz questionar o que poderia ter acendido o alerta entre os executivos da Sony e sem saber o conteúdo removido, é difícil afirmar se a empresa teria sido exageradamente cautelosa.

Em Martha is Dead protagonista sofrerá com a morte da irmã (Crédito: Divulgação/LKA)

Talvez a LKA tenha conseguido minimizar o estrago, com a cena da remoção do rosto deixando de ser interativa para se tornar apenas uma animação, por exemplo. De qualquer forma, a situação já foi suficiente para despertar a ira nos jogadores, além de ter iniciado uma estúpida guerra entre os fanboys — embora convenhamos, não é preciso muito para isso acontecer.

Porém, o que considero mais importante aqui é que o Martha is Dead deverá ser mais um jogo que nos colocará para pensar até onde o terror pode (ou deve) ser explorado nos games. Em 2018 algo parecido aconteceu com o Agony, jogo que prometia nos levar ao inferno e que teve que modificar algumas cenas para poder ser lançado nos consoles. Já no PC a situação foi diferente, com um patch permitindo que o estúdio entregasse sua visão original.

Enquanto nos livros e filmes é relativamente comum vermos os mais diversos temas serem abordados, a mesma tolerância não se estende para os jogos eletrônicos. A explicação para isso estaria na própria interatividade característica da mídia, mas a partir do momento em que temos um órgão regulador o avaliando e o aviso de que um título tratará de assuntos que podem ser considerados gatilhos, é justo que uma fabricante de consoles decida o que podemos ou não consumir?

Eu jamais concordarei com pessoas que se escondem atrás do véu da liberdade de expressão para propagar os mais absurdos discursos de ódio, mas desde que o Martha is Dead (ou qualquer outro jogo) não faça isso, acredito que deveria caber ao consumidor decidir se aquela obra deveria ser consumida por ele ou não.

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