Ronaldo Gogoni 2 anos e meio atrás
Na última quinta-feira (19), o OnlyFans pegou criadores que distribuem conteúdo adulto de surpresa, ao anunciar que a partir de 1º de outubro de 2021, passará a bloquear vídeos e fotos com pornografia e nudez explícita. A plataforma teve um crescimento exponencial no último ano, puxado principalmente por profissionais do ramo de entretenimento adulto, em busca de novas formas de monetizar seu trabalho.
A medida tomada pelo OnlyFans veio por pressão de bancos e operadoras financeiras, que impuseram restrições ao site enquanto este busca crescer e atingir mais públicos. Medidas semelhantes foram tomadas ao longo dos anos por Tumblr, Patreon e Pornhub, como forma de não perderem oportunidades de negócios.
O OnlyFans se tornou a plataforma preferencial para criadores de conteúdo adulto, por trazer um modelo de monetização direto entre ele e o consumidor, sem atravessadores, em um periódo onde muitos não podem trabalhar normalmente, devido a pandemia da COVID-19. Ele permite tanto o modelo de assinatura simples, quanto suporta a venda individual de postagens com fotos e vídeos.
Por exemplo, um criador pode ter uma conta de acesso gratuito, mas trancar todas as postagens mediante pagamentos separados, ou liberar todas com a assinatura, ou mesmo usar um modelo misto, em que os espectadores pagam por mês e mesmo assim, teriam que desembolsar uma quantia extra para acessar certos materiais. O criador é livre para administrar seu canal da maneira que achar melhor.
Por design, o OnlyFans não é um site voltado exclusivamente ao compartilhamento e venda de materiais explícitos, e qualquer um pode criar uma conta lá e compartilhar o que quiser. A comunidade é formada tanto por criadores de material adulto, sejam amadores ou profissionais da indústria do entretenimento pr0n, como também conta com artistas, esportivas e celebridades em geral. A cantora brasileira Anitta, por exemplo, tem um perfil na plataforma.
De qualquer forma, a reputação do OnlyFans foi construída ao redor do pr0n, e a plataforma se tornou lucrativa graças a ele. O serviço se tornou sinônimo de conteúdo explícito, com mais de 130 milhões de usuários pagantes e 2 milhões de criadores, onde uma minoria são de conteúdos seguros (SFW). Ainda assim, a plataforma decidiu focar nestes para crescer e aumentar seu alcance, visto que sexo em geral ainda carrega uma série de estigmas.
Isso e a boa e velha pressão externa, principalmente daqueles que controlam o fluxo do dinheiro: bancos e operadoras financeiras.
Recentemente, o OnlyFans deu indícios de que buscava se distanciar do pr0n, como forma de se tornar uma plataforma mais atraente para investidores. Um desses movimentos levou à criação do OFTV, um serviço de streaming focado em conteúdo original de seus criadores, com acesso gratuito por parte dos usuários, onde conteúdo adulto, mesmo sugestivo, não entra. O app está disponível em diversos dispositivos, incluindo iOS, Apple TV, Android e Android TV, lembrando que Apple e Google não permitem pr0n em suas plataformas.
O serviço é focado em comentários de bastidores e entrevistas dos criadores, enquanto que os mesmos continuariam monetizando suas páginas pessoais. Ainda assim, muitos perceberam a predileção do OnlyFans por focar o OFTV naqueles que não vendem material explícito, mesmo que uma das estrelas seja a ex-atriz do mercado adulto (e profissional de saúde no combate à COVID-19, segundo certas pessoas) Mia Khalifa.
No dia 19 veio a explicação, na forma do anúncio da remoção do conteúdo explícito em outubro. O OnlyFans não escondeu o fato de que a medida se deu por pressão de bancos e operadoras de cartões, que têm um comportamento conservador e anti-pr0n recorrente, mas o fato é que a medida foi encarada como todos, dentro e fora da plataforma, como traição. Em resumo, criadores pr0n teriam sido usados e descartados, tão logo o serviço julgou que eles não seriam mais necessários para seu crescimento.
Detalhe, os criadores não foram notificados pelo OnlyFans, e ficaram sabendo da decisão através de publicações em sites. Muitos não acreditaram até a empresa vir a público.
O problema é que esse movimento, independente do motivo, é estúpido por uma simples razão: ele aliena boa parte do público consumidor, que acessa o OnlyFans única e exclusivamente pelo pr0n. Com a decisão do serviço em não mais atendê-los, estes procurarão outras plataformas que o façam.
Foi o que aconteceu com o Tumblr, ainda que a decisão de remover o pr0n tenha sido motivada pela leniência do serviço em lidar com compartilhamento de conteúdo criminoso, algo que também afetou o PornHub. Ambos tomaram medidas drásticas após ameaças de desmonetização, o primeiro banindo todo o conteúdo adulto, o segundo fechando o acesso apenas para criadores verificados, em geral produtoras e independentes já estabelecidos no mercado.
O PornHub conseguiu se manter sem vídeos enviados por amadores, afinal o pr0n continua lá, mas o Tumblr pagou caro: a companhia, que custou US$ 1,05 bilhão ao Yahoo!, foi vendida para a Auttomatic, a dona do WordPress, por míseros R$ 2 milhões, sob condição de não restaurar o compartilhamento de material explícito. Hoje, o serviço é um deserto.
O Patreon também sofreu com o moralismo dos bancos e empresas de cartões, mas quem pagou o pato foram os criadores. Em 2017, a plataforma restringiu o alcance de campanhas de páginas adultas, mas a princípio não removeu tudo. Em 2018, por pressão das financeiras, o serviço voltou atrás e se transformou no que o OnlyFans passará a ser em outubro, um site que suporta no máximo conteúdo erótico/sugestivo.
O OnlyFans tem sua própria leva de problemas legais, mas a percepção geral é de que independente da pressão das companhias financeiras, as responsáveis pelo processamento de pagamentos dos usuários, a empresa em si não fez grandes esforços para defender os interesses de grande parte de seus criadores, considerando que todos eles passariam a apenas vender materiais autorizados.
A verdade é que a maioria esmagadora já está migrando de serviços, anunciando a seus assinantes que encerrarão suas contas, e claro, a grande maioria do público vai deixar o serviço. Quando o OnlyFans percebeu isso, tratou de colocar panos quentes na situação:
Dear Sex Workers,
The OnlyFans community would not be what it is today without you.
The policy change was necessary to secure banking and payment services to support you.
We are working around the clock to come up with solutions.#SexWorkIsWork
— OnlyFans (@OnlyFans) August 21, 2021
A decisão de "encontrar uma solução" veio tarde, e para a maioria dos criadores de conteúdo pr0n, não vai resolver grande coisa. O Patreon, mesmo tendo permitido material sugestivo, perdeu um grande número de assinantes desde que as mudanças entraram em vigor, e o Tumblr então nem se fala. Mais do que isso, a maioria não confia mais na empresa, mesmo que ela encontre uma alternativa que se mostre viável.
Oficialmente, Visa e Mastercard afirmam que o OnlyFans não foi pressionado a mudar seus Termos de Serviço, ainda que o mesmo processo já tenha sido visto antes.
Fonte: Bloomberg, The Next Web