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Grandia: a aventura que conquistou uma geração

Um dos RPGs mais fantásticos de todos os tempos, Grandia é uma obra de arte que rompeu com alguns padrões e mostrou como oxigenar um gênero tão popular

3 anos atrás

Fundada em 1985, a Game Arts iniciou sua história nos games com o Thexder, um título para NEC PC-8801 em que controlávamos um robô que tinha a habilidade de se transformar em avião. Pelos anos seguintes a empresa seguiu lançando jogos que fizeram algum sucesso, como Alisia Dragoon ou Silpheed, mas a história do estúdio mudaria mesmo em 1992, quando eles decidiram se aprofundar no mundo dos RPGs e lançaram o fantástico Lunar: The Silver Star.

Grandia

Crédito: Reprodução/Orioto/DeviantArt

Apontado até hoje como um dos melhores títulos a terem aparecido no Sega CD, a história de Alex e seus amigos fazia muito bem o uso do CD-Rom daquele videogame e graças ao fenomenal trabalho de localização da Working Designs, pudemos saber que existia vida nos RPGs além da Enix e da Square. Dois anos depois a série ganharia uma continuação, o Lunar: Eternal Blue e quando este chegou ao acessório que melhorava o Mega Drive, a Game Arts decidiu que estava na hora de investir numa nova franquia.

Encabeçado por Yoichi Miyaji, o projeto tinha como objetivo manter a estratégia da empresa de “fornecer aos jogadores bons jogos em vez de apenas seguir tendências do mercado” e para isso ele contaria com a co-direção de Toshiaki Hontani. Tendo iniciado sua carreira como programador chefe dos inimigos em um jogo chamado AX-6, Miyaji tinha uma larga experiência e isso foi fundamental para o caminho que o desenvolvimento seguiria.

Outros que também chegariam para colaborar com o desenvolvimento seriam o diretor de arte Hidenobu Takahashi e o compositor Noriyuki Iwadare. Com o grupo formado, inicialmente eles optaram por continuar focando no Mega CD, mas conforme a Sega começava a abandonar a plataforma e voltar suas forças para o Saturn, a equipe achou que seria melhor fazer o mesmo.

O que buscamos para este jogo não é simplesmente diversão,” disse Miyagi numa entrevista pré-lançamento do Grandia. “Estamos tentando trazer uma vibe teatral com cenas e eventos. Você conhece teatro encenado, como musicais, certo? Este é o tipo de sentimento que eu quero evocar, mas usando polígonos em um jogo. Fazer isso requer muito trabalho detalhado no que diz respeito à maneira como os personagens se movem, ângulos de câmera e assim por diante.

Ainda de acordo com o diretor, outro objetivo que eles tinham em mente era garantir que os cenários fossem divertidos de se interagir. Títulos que usavam polígonos nos cenários eram relativamente comuns, mas se você chegava em uma cidade, via um barril e nada acontecia ao tentar mexer nele — atitude natural entre os jogadores de RPG —, perdia-se boa parte da imersão.

Já o título Grandia teria vindo de um carro de Fórmula 1 e segundo Hidenobu Takahashi, a inspiração surgiu porque assim como era preciso profissionais de diversas áreas para chegar ao carro mais rápido possível, aquele projeto tinha “diversos especialistas se reunindo para se desafiarem com um novo design.” Para ele, a pergunta que a equipe sempre se fazia enquanto estava desenvolvendo o jogo era como eles poderiam criar algo incrível e para conseguir isso, os envolvidos tiveram que trabalhar muito duro.

Grandia

Crédito: Reprodução/Moby Games

E conforme a criação do Grandia prosseguia, Yoichi Miyagi percebeu que dois conceitos seriam fundamentais para o seu sucesso: fazer dele um RPG da próxima geração e entregar um mundo que parecesse o mais vivo possível. Contudo, em relação ao primeiro ponto, o diretor acreditava que o simples ato de utilizar polígonos não significava muita coisa. Na sua opinião, pouco importava o quanto os gráficos fossem melhorados se  eles não estivessem diretamente conectados com a jogabilidade. O foco então passou a ser em como aproveitar o poderio técnico do Saturn para melhorar a diversão.

Já em relação ao mundo em que aquela história se passaria, a ideia era criar um lugar que deixasse a clara sensação de que humanos realmente viviam ali e ao contrário de muitos títulos do gênero, eles optaram por não nos colocar em um ambiente pós-apocalíptico. Outra escolha de design foi evitar explicar tudo através de palavras, pois segundo o diretor, apenas dizer ao jogador que o mundo precisa ser salvo é algo que não funciona muito bem.

A equipe então escolheu fugir do padrão “espada e magias” tão comuns aos RPGs da época, mas eles também não queriam recorrer à ficção científica, onde a atmosfera tende a ser mais sombria e distópica. A solução foi situar o Grandia em uma era pós-Explorações e pós-Revolução Industrial, onde as pessoas viveriam na prosperidade. Assim eles poderiam fazer com que os personagens tivessem um pensamento otimista, sempre focando no futuro e buscando aventuras, o que passou a ser a força motriz do protagonista.

Grandia é uma jornada inesquecível com mais de 80 horas de jogabilidade,” diz a descrição do jogo no site da Game Arts. “O jogador assume o papel de Justin, um jovem garoto obcecado em se tornar um grande aventureiro e que herda uma pedra mágica que o leva à uma épica jornada para descobrir o mistério de uma civilização há muito perdida. Ele encontra outros aventureiros que se juntam a ele em sua busca e conforme desvenda os fios de uma antiga lenda, chama a atenção da Forças Galyle, que planeja esquemas diabólicos para pará-lo.

Mas além do mundo em si e dos personagens que, de acordo com o próprio Miyagi nunca são essencialmente ruins, algo que contribuiu para esta aura de otimismo presente em Grandia é sua bela trilha sonora composta por Noriyuki Iwadare. Com uma abordagem mais cinematográfica e combinando com cada situação que vivemos, o compositor tratou de fazer com que cada melodia se adequasse ao lugar que estivermos visitando, o que exigiu inclusive a utilização de diversos instrumentos.

Para Miyagi, a música e os efeitos sonoros eram fundamentais para levar emoção ao jogador, algo que nem mesmo os melhores gráficos poderiam fazer. Eles então puderam aproveitar a tecnologia de compressão de áudio ADX, o que lhes garantiu tocar as faixas em loops infinitos sem que houvesse interrupções, além de poderem tocar as músicas mesmo enquanto o jogo estava carregando a próxima parte.

Crédito: Reprodução/Moby Games

Passado o período de criação, estava na hora daquele tão promissor RPG chegar às lojas japonesas e isso aconteceu em dezembro de 1997. Disponível apenas para o Sega Saturn, a recepção por parte tanto da crítica quanto do público foi muito boa, com o título tendo vendido quase 345 mil cópias e se tornado o 4º jogo mais vendido para o console no país naquele ano. Tal número pode não parecer muito grande, mas temos que levar em consideração a base instalada do videogame da Sega e o fato de que em janeiro daquele mesmo ano a Square lançou um titã chamado Final Fantasy VII.

Porém, talvez até mais importante do que as suas vendas no Japão, foi o quanto aquele RPG chamou a atenção do público ocidental, que sem uma localização, viu-se obrigado a importar e jogar o Grandia em japonês. Parte deste interesse até pode ser creditado à Sega of America, que anunciou que não lançaria o jogo por estas bandas, mesmo com uma petição online na época tendo reunido mais centenas de assinaturas. No entanto, isso não quer dizer que ele nunca chegaria ao nosso mercado.

Crédito: Reprodução/Moby Games

Em março de 1999 a Game Arts foi à Tokyo Game Show mostrar como o jogo estava rodando no PlayStation e anunciou que ele poderia ser lançado em inglês. Restava saber quem faria o trabalho de localização e embora aqueles que haviam aprendido a gostar dos jogos do estúdio japonês com o Lunar: The Silver Star esperassem que a missão fosse dada novamente ao competentíssimo pessoal da Working Designs, coube à SCEA (Sony Computer Entertainment America) a responsabilidade pela publicação.

No novo videogame o Grandia ainda contaria com recursos inéditos, como suporte às alavancas analógicas do DualShock e vibração, assim como compatibilidade com o PocketStation, onde podíamos utilizar os dados do jogo em um mini-game. Por outro lado, devido a problemas técnicos na hora da adaptação, no PlayStation o título apresentava uma taxa de frames um pouco inferior àquela vista no Saturn, além de polígonos não tão bonitos e uma dublagem menos nítida.

Ainda assim, aquela foi a maneira como muitos jogadores tiveram a oportunidade de conhecer um dos RPGs mais fantásticos de todos os tempos, uma aventura que se diferenciava de quase tudo o que tínhamos na época. Com o passar dos anos a Game Arts lançou diversas continuações, incluindo um MMORPG que funcionou entre 2009 e 2012, mas mesmo com alguns destes títulos tendo sido muito bons, não seria exagero afirmar que aquele que deu início à franquia nunca foi superado.

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