Carlos Cardoso 5 anos atrás
Que a mídia tem memória de peixe dourado azul não é novidade, mas as pessoas também não colaboram, vivem batendo palma pra bobagens, deslumbradas com as mesmas manchetes sensacionalistas de sempre. É o caso do “carro voador” da startup bancada por Larry Page, do Google.
Até o deslumbrado do Casey Neistat se deslumbrou, fez um vídeo intercalando as imagens do bicho voando com cenas d'Os Jetsons. HELLO?
Ele batizou o vídeo de “Eu pilotei o primeiro carro voador”
Err… hello?
Carros voadores não são novidade, eles só nunca foram e continuam não sendo práticos. Isso que o pessoal da Kitty Hawk está vendendo nem chega a ser um carro, até porque NÃO TEM RODAS, é um brinquedo, só isso.
Como demonstrado ao contrário de Ruby, drones escalam, mas por causa da Lei dos Quadrados e dos Cubos, você precisa de muito mais energia e isso se reflete nos números de performance.
O Flyer tem nada menos que DEZ motores. Mesmo assim ele só consegue velocidade de 32 km/h, altitude máxima de 3 metros e autonomia de 20 minutos, que convertidos em distância dão 10 km.
O tempo de vôo é bem pior do que um drone decente, e é exatamente isso que o Flyer é. Um dronão.
Eles removeram toda a complexidade, usaram provavelmente os mesmos chips que controlam automaticamente drones, cuidando de toda a parte de estabilização e orientação. E removeram todo o peso extra.
O Flyer tem dois controles, uma manete de potência e um manche que faz a movimentação esquerda direita frente trás. Mais nada. Sem telas, indicadores, painéis. Isso significa também que ele não tem qualquer redundância. Uma falha catastrófica em um dos motores, e você já era.
Máquinas de voar nada práticas não são exatamente novidade:
A Hiller VZ-1 Pawnee, chamada de Rosquinha Voadora foi desenvolvida em 1953, era surpreendentemente estável e atingia 26 km/h, voando a 10 metros de altura, mas não foi considerada prática e acabou abandonada.
Já o de Lackner HZ-1 Aerocycle humilhava o brinquedo do Page. Ele voou pela primeira vez em 1954, atingia 121 km/h, autonomia de 45 minutos ou 24 km e tinha teto de 1.500 metros. Em 1954.
Óbvio que as pessoas não se entusiasmaram muito com a idéia de fiar precariamente em cima de duas hélices girando a milhares de RPM prontas para Thanosificar o infeliz que escorregasse da plataforma, e por esse entre outros motivos o projeto foi cancelado. O piloto de testes chegou a ganhar uma medalha por ter sobrevivido a dois acidentes graves.
Lembram daqueles projetos de moto voadora, revolucionário que ia mudar o mundo?
Este é o Piasecki VZ-8 Airgeep, voou pela primeira vez em 1959, tinha velocidade máxima de 136 km/h, alcance de 56 km e teto de 914 m.
Millenials estão firmes e fortes reinventando a roda, com uma dose de deslumbramento que chega a ser comovente, mas como vamos avançar esquecendo do passado e repetindo tudo num loop infinito Dormammu eu vim barganhar?
E sim, claro que eu acho divertidíssimo o brinquedo do Larry Page, eu adoraria que fizessem uma versão com mais uns 50 motores e lançassem a Blogueiro Edition, mas é um brinquedo, nada mais. E essa é a questão. “Incrível e revolucionário carro voador do fundador do Google” é uma manchete muito mais simpática do que “investidor bilionário fomenta empresa que cria brinquedo caro pra gente rica”.
De resto, o Aerocar, que voou pela primeira vez em 1949 é muito mais carro voador do que o Dronão.