Carlos Cardoso 5 anos atrás
Entre os vários efeitos da greve dos caminhoneiros a parte divertida é ver millennials em desespero achando que estamos vivendo o mesmo desabastecimento de países como Venezuela, ou então que estamos nos encaminhando pra uma distopia Mad Max. Claro, caminhões tanque com escoltas armadas não colaboram para diminuir essa imagem, mas o mundo e até mesmo o Brasil já enfrentou escassez de combustível bem pior, com saídas bem mais criativas.
O auge da escassez de combustível foi na Segunda Guerra Mundial, onde em alguns lugares como Inglaterra e Alemanha carros particulares estavam basicamente proibidos de comprar gasolina, que era racionada e usada somente por veículos oficiais (Churchill e Göring não iam andar a pé) e pelo esforço de guerra.
Para sorte dos envolvidos em 1920 um engenheiro químico francês chamado Georges Imbert havia inventado o gerador de gás de madeira. O conceito é simples: matéria orgânica como carvão ou madeira, quando aquecidos a altas temperaturas na ausência de oxigênio liberando gases como metano e hidrogênio que, como muita gente descobriu dia 6 de maio de 1937, é bem inflamável.
Desde a virada do século XIX que esses gases eram usados, mas eram considerados gases pobres (não que gases nobres queimem melhor) e não tinham grande uso, mas com a Guerra passaram a fazer sentido.
Graças ao gerador de Imbert carros particulares e mais tarde ônibus, caminhões, bondes e até trens e tanques foram convertidos para usar gás de madeira, aliviando os problemas da falta de gasolina e diesel.
Haviam dois modelos principais: no primeiro o gás era produzido em usinas e os veículos usavam grandes bolsas de lona emborrachada para armazenar o suficiente para seu uso. Apesar de não-pressurizado ainda havia uma boa quantidade de gás nas bolsas, e lembrando que na década de 40 todo mundo fumava, os acidentes não eram raros.
Óbvio que esse monte de tralhas presas no teto acabavam com a aerodinâmica, aumentavam o peso e pra piorar o gás comia 50% da potência dos motores, mas é o que temos pra hoje.
O outro modelo era o veículo com o gerador de gás de madeira instalado.
Além dos países diretamente em guerra, essa tecnologia foi usada em vários outros lugares. Um onde foi mais popular foi… o Brasil.
Aqui o gerador de gás de madeira ficou conhecido como gasogênio, e usando métodos diferentes do de Imbert desde 1910 instalações industriais usavam a tecnologia, mas foi só no começo da década de 1930 que o Brasil começou a investir mesmo em gasogênio. Com a guerra se aproximando e o petróleo escasseando, o governo fez de tudo pra popularizar a tecnologia.
O primeiro poço de petróleo brasileiro só foi perfurado em 1939, 100% de nossos derivados de petróleo eram importados, então sem gasogênio o Brasil iria parar.
Mas não parou, no final de 1944 só em SP havia 3.676 gasogenistas formados e certificados, 15.545 veículos movidos a gasogênio percorriam as estradas do estado e 300 toneladas de carvão vegetal eram consumidas só na cidade de São Paulo diariamente. Ah sim, como aqui é Brasil, em 1943 o saco de carvão vegetal subiu de Cr$ 12,00 para Cr$ 20,00.
Com o fim da guerra o gasogênio saiu rapidamente de moda, não era preciso Greenpeace pra dizer que queimar carvão não era uma forma muito eficiente de alimentar um carro. Hoje o gasogênio sobrevive no interior, em algumas propriedades rurais. Na China em algumas cidades ele foi usado até a década de 1990 para abastecer ônibus.
Mesmo hoje o gasogênio é apresentado como solução para países de terceiro mundo com disponibilidade de lenha. A ONU tem um documento detalhado explicando toda a teoria e a engenharia por trás da tecnologia. Guarde esse link, ou melhor, imprima a apostila. Vai que…
Fontes: