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Kalgash? Cientistas descobrem estranho exoplaneta em um sistema com três sóis

O exoplaneta HD 131399Ab é um dos mais estranhos já descobertos: orbita três sóis, tem um ano equivalente a 550 terrestres e dias que duram 140 anos!

8 anos atrás

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Reconstituição artística do sistema ternário, com HD 131399Ab em primeiro plano e os três sóis visíveis

O espaço é um lugar esquisito, disso não há dúvidas. Quando pensamos já ter observado maluquices o suficiente a realidade volta a nos pregar peças, mostrando que não somos mais do que um bando de crianças brincando na margem de um lago. A última? Um time de cientistas anunciou a descoberta de um novo exoplaneta a 320 anos-luz da Terra, com características tão estranhas que até mesmo o mais experimentado dos astrônomos deve ter ficado surpreso.

HD 131399Ab é um planetinha jovem (calcula-se que tenha só 16 milhões de anos) bem esquisito. Quer dizer, chamá-lo de “planetinha” também não pega bem, já que estamos falando de um gigante gasoso quatro vezes maior que Júpiter. Como se isso não bastasse sua órbita é bem maior do que a de Plutão, e cada ano no planeta equivale a 550 anos terrestres. O time de pesquisadores misto a Universidade do Arizona utilizou imagens do VLT (Very Large Telescope) operado pelo ESO (European Southern Observatory) no deserto do Atacama, no Chile (sabe, aquele projeto de que o Brasil, o país que odeia ciência em breve será chutado) enquanto procurava por exoplanetas relativamente jovens. HD 131399Ab se situa próximo à constelação de Centauro e é um dos primeiros observados diretamente.

O que está intrigando os cientistas é que o planeta faz parte de um sistema ternário, composto por três estrelas que orbitam umas às outras. HD 131399Ab orbita a maior delas, identificada como HD 131399A (vamos chamá-la de “Sol A” para descomplicar um pouco), que possui 80% mais massa que nosso Sol. Esta por sua vez orbita as menores HD 131399B (“Sol B”) e HD 131399C (“Sol C”). Ao mesmo tempo Sol B e Sol C também orbitam uma à outra, Sendo Sol C bem menor que Sol B.

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Representação artística das órbitas de HD 131399Ab (vermelho) e das estrelas (azul)

É isso que está deixando os cientistas encafifados: sistemas ternários não são tão raros no universo, já haviam sido detectados antes mas a presença de HD 131399Ab é intrigante. Em situações normais as forças geradas pelas órbitas de Sol B e Sol C em torno de Sol A lançariam o planeta longe, já que suas forças gravitacionais competem entre si (nesse jogo os planetas e quaisquer outros objetos sempre perdem), portanto os cientistas acreditam que ele está preso na borda do poço gravitacional de Sol A, de tal forma que ele está longe demais para ser atraído violentamente, mas perto o suficiente para permanecer onde está e não ser ejetado pelas forças concorrentes. É como um elástico esticado até o limite do rompimento e mantido assim.

O planeta está a 80 Unidades Astronômicas de distância de Sol A (sendo que 1 UA = a distância entre o Sol e a Terra; para fins de referência Plutão está entre 30 e 49 UA do Sol, a variação causada por sua órbita excêntrica), enquanto a estrela orbita Sol B e Sol C a uma distância de 300 UA. Já estas estão separadas por 10 UA.

De qualquer forma, os cientistas acreditam que HD 131399Ab não foi formado neste sistema, instável demais para propiciar tais condições; é provável que se trate de um planeta órfão que foi capturado por Sol A, e há a crença que ele não permanecerá assim por muito tempo. Qualquer flutuação, por mais sensível que seja será o suficiente para aniquilar ou ejetar o planeta.

Tem vídeo? Sim senhor:


European Southern Observatory (ESO) — Artist’s impression of planet orbiting in the HD 131399 system

A natureza da órbita dos três sóis acaba por impor características pitorescas ao estranho exoplaneta: como se não bastasse a temperatura média de 580 ºC (ainda assim ele é um dos menores e mais frios já observados), em metade de sua curiosa órbita (cerca de 275 anos) as três estrelas são visíveis no céu. Sendo a dança estelar tão curiosa o aparente distanciamento entre Sol B e Sol C em relação a Sol, vista de HD 131399Ab varia conforme o ano.

Mais: há períodos em que a mesma face do planeta fica voltada para os três sóis, o que cria um dia de longuíssima duração: cerca de 140 anos terrestres de luz, enquanto o outro lado do planeta jaz na mais completa escuridão. Isso acontece porque quando uma estrela se põe, as outras imediatamente nascem no horizonte. Imagine 140 anos sem uma noite.

O doutorando Kevin Wagner, um dos autores do artigo (que você pode conferir aqui, mas tem paywall) e que descobriu HD 131399Ab, diz que o curioso exoplaneta está ajudando a jogar luz sobre como os sistemas planetários são formados em cenários mais extremos. A descoberta levanta a possibilidade de que a existência de planetas em sistemas estelares múltiplos pode não ser tão rara como se pensava.

nightfall

Embora todo mundo esteja comparando HD 131399Ab com Tatooine de Star Wars, o planeta fictício mais similar a ele é Kalgash, o mundo do dia eterno banhado por seis sóis descrito em Nightfall (O Cair da Noite), uma das histórias mais sensacionais de Isaac Asimov e considerado o melhor conto de FC de todos os tempos. Nele, a população do planeta entra em pânico quando os astrônomos não só constatam a existência de uma lua, invisível a seus olhos como descobrem que haverá um eclipse, que trará algo completamente desconhecido àquela civilização: a noite.

Claro que por ser um gigante gasoso e extremamente quente o exoplaneta não sustenta a menor possibilidade de ter vida, mas é interessante imaginar como seria a vida em um planeta cujo dia dura a sua vida inteira, e qual seria a reação daqueles que nunca viram a noite contempla-la a cada 140 anos. Não deixa de ser um cenário muito legal.

Fonte: Science.

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