Meio Bit » Internet » UE: Google e Apple levam novas marteladas

UE: Google e Apple levam novas marteladas

Google terá que pagar 2,4 € bilhões à UE por abuso de poder referente ao Shopping; Apple perde apelação por recolher menos impostos na Irlanda

10/09/2024 às 10:25

A Comissão Europeia, o braço executivo da União Europeia (UE), continua sendo um estorvo para as grandes companhias de tecnologia dos Estados Unidos, em especial as gigantes Google e Apple.

Em decisões separadas, ambas perderam apelações em processos movidos pelo bloco, a primeira por prejudicar a concorrência com seu Google Shopping, e a segunda, por evasão fiscal ao usar um loophole na Irlanda, que recolhia menos taxas, uma prática ilegal. Em ambos os casos, não cabe mais recurso.

UE continua apertando o cerco contra Google e Apple (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

UE continua apertando o cerco contra Google e Apple (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Google perde caso na UE de abuso com Shopping

O Google já foi multado várias vezes pela UE, por práticas abusivas envolvendo o Android e o Ads (ex-Adsense). Somando-as à do Shopping, Mountain View deve ao todo 8,64 € bilhões (~R$ 53,27 bilhões, cotação de 10/09/2024). A multa por práticas abusivas envolvendo o Google Shopping é a segunda maior, 2,4 € bilhões (~R$ 14,8 bilhões), e foi imposta em 2017.

Na acusação original, movida por concorrentes como Yelp, TripAdvisor e FairSearch, o Google foi acusado de favorecer os resultados do Shopping, destacado-os à frente dos demais e minando o alcance destes, exibindo-os menos nos resultados de busca do Search. A Comissão Europeia concordou, aplicando a multa e forçando a empresa a adequar seus algoritmos, dando igual destaque a todos.

O Google protestou, defendendo que o Shopping é líder por ser "o melhor produto" de sua categoria (puxando o tapete da concorrência, quando você é o dono da bola e do campo, é fácil), recorreu à Corte Geral da UE, que se recusou a reavaliar o caso em novembro de 2021. O Google então recorreu à Corte de Justiça (CJEU), a instância jurídica máxima do bloco, equivalente à Suprema Corte dos EUA, e ao Superior Tribunal Federal (STF) do Brasil.

Pois com zero surpresa, nesta terça-feira (10) a corte superior também se recusou a acolher o caso, e manteve a decisão inicial da Comissão, dessa forma, ao Google não resta outra opção a não ser pagar o que deve. A companhia não respondeu a contatos para comentar o assunto.

Sundar Pichai, CEO do Google, vai ter que desembolsar mais grana com multas da UE (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Sundar Pichai, CEO do Google, vai ter que desembolsar mais grana com multas da UE (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Vale mencionar que o Google também está passando por maus momentos em casa. Após perder dois processos antitruste, onde a Justiça entendeu que a companhia opera monopólios referentes ao Android e o Search, um terceiro julgamento movido pelo Departamento de Justiça dos EUA (DoJ) começou nesta segunda-feira.

Este mira em práticas anticompetitivas envolvendo o Ads, e tem potencial de ser o mais danoso à gigante, pois atinge a ferramenta que responde por mais de 90% de sua receita. Julia Tarver Wood, advogada do órgão, entende que Mountain View opera uma "trinca" de monopólios, uma máquina muito bem sincronizada entre anúncios, Search e Android, para cobrir todos os casos de uso de distribuição de conteúdo, propagandas, apps, busca e mais, dita suas próprias regras, e mina o alcance dos concorrentes.

Ao defender a ideia de que oferece os melhores produtos, o Google tenta se safar de todos os processos que questionam seu domínio incontesto do mercado, e é entendimento tanto da UE quanto dos EUA, que o melhor curso de ação é fragmentar a gigante tal como foi feito com o antigo Bell System, separando seus principais produtos (Search, Android, Chrome e Ads) em companhias distintas, e mais importante, fora do guarda-chuva da holding Alphabet Inc., para nivelar o campo e dar chances a todos.

Apple pagou menos impostos na Irlanda

O caso da Apple data de 2016. Na época, a companhia foi condenada por operar suas vendas fora dos Estados Unidos, em especial as realizadas na Europa, através da Irlanda, que concedeu incentivos fiscais a várias empresas de tecnologia, de modo a movimentar a circulação de dinheiro interna. O problema é que, como membro da UE, o governo local não pode oferecer condições diferentes dos demais 26 países-membros, estas estabelecidas e monitoradas pela Comissão Europeia.

A marmotagem, que data de 1991, durou até 2014 e envolveu uma pletora de empresas, todas as gigantes tech, como Apple, Google, Meta, Amazon, Microsoft e outras, exploraram a brecha para pagar menos impostos e lucrarem mais, e quando a Comissão acordou, desceu o sarrafo em todo o mundo, empresas e governo irlandês

Michael Noonan, então Ministro das Finanças e defensor do loophole, foi pressionado e acabou renunciando ao cargo, e se aposentou da política, em maio de 2017. Ele foi substituído pelo mais alinhado com Bruxelas Paschal Donohoe, que ficou no cargo até 2022; hoje é Ministro das Finanças Públicas, Desenvolvimento e Reforma da Irlanda.

A Irlanda foi obrigada pela Comissão Europeia a cobrar adicionais 13 € bilhões (~R$ 80,34 bilhões) da Apple em impostos atrasados, o que fez deste o processo por evasão fiscal mais custoso da História. A companhia pagou o montante de forma antecipada, na esperança de rever a grana caso uma decisão judicial superior revertesse o veredito da UE, o que de fato aconteceu:

Em julho de 2020, a Corte Geral anulou a decisão, dizendo que a Comissão Europeia não conseguiu provar de que a Apple e a Irlanda conseguiram vantagens com a prática. Esta, claro, recorreu à CJEU.

A UE também não deu moleza para Tim Cook, CEO da Apple (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

A UE também não deu moleza para Tim Cook, CEO da Apple (Crédito: Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Já se sabia que a decisão seria anunciada nesta terça-feira (10), tanto que a Apple antecipou o evento de lançamento da linha iPhone 16 em um dia (tradicionalmente, os keynotes são sempre realizados na segunda terça-feira de setembro), de modo que a UE não atrapalhasse os planos de Cupertino em gerar buzz (com um smartphone cuja grande "novidade revolucionária" é um botão dedicado para a câmera, mas divago) por pelo menos um dia. De fato, o veredito não lhe foi favorável.

A CJEU também ficou a favor da Comissão Europeia, ao manter a decisão original que obriga a Apple a pagar os impostos devidos, e o dinheiro já depositado em juízo, que estava congelado aguardando todos os recursos serem julgados, poderá agora ser aplicado como o governo irlandês achar melhor. A maçã, assim, não verá nenhum centavo dos 13 € bilhões novamente.

Em um e-mail enviado ao site TechCrunch, o porta-voz da Apple Tom Parker disse que "o caso não era sobre quanto pagar, mas para qual governo", que Cupertino "sempre paga o que deve", e que "nunca se beneficiou" de acordos ilegais. Ainda assim, quando a decisão original foi emitida em 2017, o CEO Tim Cook a chamou de "uma m#%&@ completamente política".

No comunicado oficial, a Comissária para a Competição e VP executiva da UE para uma Europa Pronta para a Era Digital (que título comprido...), o flagelo das big tech Margrethe Vestager, disse que ambos os casos são emblemáticos, pois mostram ao mundo que "ninguém está acima da Lei", e que mesmo as companhias de tecnologia mais ricas e poderosas do mundo "serão responsabilizadas", pagarão multas pesadíssimas por suas más práticas, e que os processos movidos inspiraram novas legislações, dentro (DMA e DSA) e fora do continente.

Já para Apple e Google, só restam choro e ranger de dentes, e cofres mais vazios.

Fonte: European Commission

Leia mais sobre: , , .

relacionados


Comentários