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Ghouls 'n Ghosts e o incrível de talento de Yuji Naka

Após ver o Ghouls ‘n Ghosts rodando em uma feira, Yuji Naka decidiu que queria levar o jogo para o Mega Drive, o que o ajudaria a criar outra lenda, o Sonic

18/03/2024 às 8:56

No futuro, quando Yuji Naka não estiver mais entre nós, seu nome será lembrado pelos fracassos, mas também por diversos jogos de extrema qualidade que ajudou a criar. Mas até se tornar uma lenda (errante) da indústria de games, primeiro ele teve que perseguir um sonho, um jogo criado por outra empresa e que se chamava Ghouls 'n Ghosts.

Ghouls ‘n Ghosts

Crédito: Reprodução/Gabirotcho/ArtStation

Um apaixonado por automobilismo e recentemente condenado por ter aproveitado informações privilegiadas para adquirir ações de duas desenvolvedoras, Naka se tornou funcionário da Sega em 1983.

Logo nos primeiros projetos o programador se destacou pela qualidade do seu trabalho, com o seu objetivo na época sendo criar para o Master System jogos que não poderiam rodar no Nintendinho. Assim nasceram os calabouços 3D vistos no Phantasy Star, além das ótimas adaptações de jogos para fliperamas, como Space Harrier e Out Run.

Porém, com a chegada do Mega Drive ao mercado, Yuji Naka teria uma máquina muito mais poderosa para trabalhar e ao visitar a Amusement Machine Show em 1988, ele se deparou com o jogo que o impressionou. Ghouls ‘n Ghosts parecia muito superior a quase tudo o que existia na época e ao voltar para a sede da empresa, ele suplicou para que seu chefe fizesse um acordo com a Capcom. Inocentemente, o programador achava que seria possível adaptar o título para o atual console da Sega.

Crédito: Reprodução/Kartanym/MobyGames

“Cerca de um mês após aquilo, fui até a Capcom e recebi apenas o código-fonte e os dados da ROM. Então imergi completamente no processo de portabilidade. Contudo, percebi que estava com problemas quando tentei carregar os dados. Os cartuchos do Mega Drive tinham apenas 4 megabits, mas o código do programa sozinho era maior que 4 megabits. Eu pensei, ‘onde irei colocar os gráficos?!’

O trabalho se resumia a fazer tudo que pudesse para reduzir o código do programa e inserir os gráficos onde pudesse. Na metade, eu realmente comecei a me arrepender por ter dito que queria trabalhar com aquilo (risos).

Cheguei ao ponto em que pensei, ‘se eu simplesmente tivesse um pouco mais de memória, seria ainda mais parecido com a versão de fliperama.’ Eu realmente não queria reduzir a qualidade ainda mais. Fui até o meu chefe e implorei, ‘desculpe, mas eu poderia ter apenas mais um megabit?’ Consegui 5 megabits para o jogo e por causa do meu desejo de torná-lo bom, de todos os jogos para o Mega Drive, Ghouls ‘n Ghosts se tornou o único jogo a usar uma pouco ortodoxa ROM de 5 megabits.”

E para chegar ao resultado que veríamos no console, Yuji Naka teve que fazer sacrifícios. Com o projeto tendo se estendido por cinco meses, muitas vezes ele teve que dormir no chão em frente a sua mesa de trabalho. Isso poderia ter lhe revoltado, mas ele afirma que a dificuldade fez com que se tornasse um programador melhor.

Imagem 04 - Crédito: Reprodução/GTramp/MobyGames

Outro benefício que aquele desenvolvimento o trouxe foi ter plantado em sua mente um conceito que depois aproveitaria para dar vida àquilo pelo qual sempre será lembrado, o Sonic the Hedgehog. O motivo? Algo criado para o Ghouls ‘n Ghosts e que era muito difícil de programar, as superfícies inclinadas.

“Eu não entendi a tecnologia por trás daquele programa quando o vi numa feira de fliperamas. ‘O que está acontecendo com isso!?’ Foi por isso que pensei, ‘se eu transplantar isso, entenderei a tecnologia!’

Quando vi o código, fiquei impressionado! ‘Ah, estou vendo! Foi assim que eles fizeram isso! Isso é incrível!’ O Ghouls ‘n Ghosts era um programa que só conseguia mover dois pontos horizontalmente a cada 1/60 segundos, mas se pudéssemos mover aquilo para cerca de 16 pontos, não seria um jogo completamente diferente? Tive uma ideia e resolvi fazer algumas coisas. Então... isso é muito rápido!

Então, no estágio seguinte, quando fizemos a encosta do Ghouls ‘n Ghosts cada vez mais íngreme... Percebi uma coisa. Eu pensei, ‘Hã? Se eu conectar essas coisas, elas girarão.’ Como resultado, fui capaz de dar um giro, de uma vez só.”

Crédito: Reprodução/Satoshi Kunsai/MobyGames

Ou seja, foi assim que nasceu uma das marcas registradas do jogo do ouriço azul criado por Naka, os impressionantes loopings em que o personagem passava em altíssima velocidade e que se mostrou algo inédito.

O interessante é pensar que algo tão importante surgiu quase por acaso, da perseverança de Naka, mas também da sua capacidade em aprender, se adaptar e usar sua criatividade para levar adiante uma “simples” ladeira, uma ideia brilhante criada por outra pessoa.

Eu também só posso imaginar o quanto era difícil produzir jogos naquela época, quando a tecnologia disponível contava com tantas limitações e os game designers e programadores precisavam contar com talento puro para dar vida àquilo que idealizavam.

Ghouls ‘n Ghosts

Crédito: Reprodução/Kartanym/MobyGames

Se hoje é comum vermos profissionais lamentando o alto custo envolvido na criação de jogos, há três ou quatro décadas a preocupação era bem diferente e acho que não seria exagero dizer que trabalhar nessa indústria era até mais desgastante.

Sem querer desmerecer os profissionais de hoje ou glamorizar o sofrimento de outrora, mas quanto mais histórias ouço daquela época, mais empatia tenho por aqueles que sacrificaram tanto só para escovar cada bit com o intuito de entregar o melhor jogo possível. Sim, ainda são comuns os relatos de más condições de trabalho ao criar games, mas pelo menos atualmente os estúdios contam com a vantagem de colocar um título mal-acabado nas lojas e remendá-lo com o passar do tempo.

Fonte: Time Extension

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