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A hipótese da Floresta Sombria

A Floresta Sombria é uma hipótese aterradora para explicar a ausência de civilizações alienígenas detectáveis. Ao mesmo tempo, ela faz sentido

07/02/2024 às 23:22

A Floresta Sombria não é uma hipótese realmente nova, muito menos o Paradoxo de Fermi, que já discutido mais de uma vez aqui no Meio Bit, mas ela é interessante (e aterradora) o suficiente para ganhar artigo próprio.

Nada mais assustador do que uma floresta tranquila (Crédito: Stable Diffusion)

 

"Existem duas possibilidades: ou estamos sozinhos no Universo ou não estamos. Ambas são igualmente aterrorizantes."

Arthur Clarke

Fora do History Channel e da ficção científica, não há uma abundância de aliens. Filmes como Homens de Preto e séries como Star Trek passam a ideia de que a Terra é a Esquina do Universo, mas nossas observações, tanto no espectro visível como via radioastronomia não retornaram nada. Nenhum sinal de vida.

Com a imensa quantidade de estrelas e planetas na Via-Láctea, deveríamos estar cercados de Vida Inteligente. Há até uma fórmula para isso:

A Equação de Drake, proposta pelo astrônomo Frank Drake em 1961 estima o número de civilizações extraterrestres na Via Láctea com as quais poderíamos potencialmente comunicar. A fórmula é:

N = R ∗ × fp × ne × fl × fi × fc × L

Onde:

  • N é o número de civilizações na nossa galáxia com as quais poderíamos comunicar.
  • R é a taxa de formação estelar na Via Láctea.
  • fp é a fração de estrelas que têm planetas.
  • ne é o número médio de planetas que podem potencialmente suportar vida por estrela que tem planetas.
  • fl é a fração de planetas que poderiam desenvolver vida.
  • fi é a fração de planetas com vida onde a vida inteligente se desenvolve.
  • fc é a fração de civilizações que desenvolvem tecnologias que liberam sinais detectáveis no espaço.
  • L é o tempo médio que as civilizações emitem sinais detectáveis no espaço.

Na prática, sendo honesto, todos os elementos da equação são desconhecidos, é possível gerar qualquer resultado apenas manipulando as variáveis, mas por algum motivo a Equação de Drake se tornou importante na cosmologia especulativa, mas mesmo assim ela não explica o Paradoxo de Fermi.

Sugerido durante um bate-papo de almoço em 1950, entre Enrico Fermi, Edward Teller (O Pai da Bomba de Hidrogênio) e outros cientistas. Eles conservavam sobre UFOs, vida extra-terrestre e a imensidão do Universo, em como as estrelas deveriam estar pululando de vida, mas mais surpreendente do que o Word me dizer que “pululando” existe, foi a pergunta de Fermi: “Mas então, onde está todo mundo?”

Esse é o paradoxo: Em um Universo repleto de Vida, como não vemos nenhum sinal dela? Várias hipóteses tentam responder isso. Vamos conhecer algumas.

1 – Hipótese do Zoológico

Ou, como prefiro chamar, a Primeira Diretriz. Em Star Trek, os planetas da Federação têm uma Lei primordial: eles são proibidos de interferir no destino, ou muito menos revelar sua existência a mundos que ainda não desenvolveram tecnologia de Dobra Espacial.

O conceito é que somente civilizações que atingem um estágio mínimo de organização e maturidade conseguem evoluir tecnologicamente até a Dobra Espacial, do contrário se destroem sozinhas.

Entendedores entenderão (Crédito: Paramount Pictures)

Segundo essa hipótese, civilizações evitariam comunicações por ondas de rádio (que de qualquer jeito seriam primitivas e ineficientes), e por isso não seriam detectadas por civilizações primitivas; essas, por sua vez, enviaram mensagens para o Cosmos, igualmente ignoradas.

Essa Primeira Diretriz de Não-Interferência colocaria civilizações primitivas em uma espécie de quarentena. É uma versão bastante benigna da Hipótese da Floresta Sombria.

2 – Grandes Filtros

Arthur Clarke disse uma vez, mais ou menos brincando, que supernovas são acidentes industriais. Ele deu a entender que algumas civilizações, tentando manipular tecnologias e energias extremas, acabam se autodestruindo.

A hipótese dos Grandes Filtros supõe que na evolução de civilizações, barreiras naturais tendem a impedir seu avanço. Na Terra tivemos (e estamos tendo de novo) a Guerra Nuclear como grande barreira. Em 2024, o Boletim Dos Cientistas Atômicos manteve o Relógio do Apocalipse em 23:58:30, 90 segundos até meia-noite, que significa Fim do Mundo.

Tic toc... tic toc... (Crédito: Bulletin of the Atomic Scientists)

Alguns dizem que o Aquecimento Global é um dos Grandes Filtros. Arthur Clarke (sempre ele. Leia Clarke!) cogitou até um segundo aquecimento global, quando daqui a uns 20 anos tivermos desenvolvido fusão nuclear em escala comercial, energia deixar de ser um problema e após anos com a natureza equilibrada, descobrirmos que estamos jogando calor na atmosfera do mesmo jeito.

Filtros podem surgir de toda forma. Uma espécie que se espalhe por um sistema solar pode, após centenas de milhares de anos, se dividir em duas, começando uma guerra. Em Stargate, a nobre raça dos Asgardianos morreu por falta de diversidade genética, após incontáveis gerações se reproduzindo por clonagem.

Pew pew pew! (Crédito: Stable Diffusion)

Talvez haja um relógio cósmico cuidando para que somente civilizações ágeis consigam sobreviver. A Terra é atingida por um asteroide na faixa de 10 km de diâmetro a cada 50 ou 60 milhões de anos, extinguindo praticamente toda a vida no planeta. Somente uma civilização avançada seria capaz de se proteger de um impacto desses. Só para lembrar, o último caiu 65 milhões de anos atrás e destruiu os dinossauros. A nossa capacidade de desviar um asteroide de 10 km é a mesma de um Velociraptor.

3 – Terra Rara

Essa é a mais autoindulgente, autocentrada, arrogante e improvável das hipóteses, mas eu sou um completista e o Mobilon não me paga para ser sucinto.

Essa hipótese, diametralmente oposta à Floresta Sombria, parte do princípio que somos especiais e muito amados, a Terra é um planeta único, com condições raríssimas que deram origem à vida, e talvez em nenhum lugar do Universo exista algo parecido.

Um Universo sem vida daria muita força para os grupos religiosos, e, ao mesmo tempo, seria um grande desperdício de espaço. A visão mais otimista desse tipo de Universo seria Fundação, de Isaac Asimov, com uma galáxia colonizada apenas por humanos.

Fundação, na AppleTV+. Altamente recomendada (Crédito: AppleTV+)

Claro, um Universo inteiro só para nos servir é de uma arrogância literalmente bíblica.

Existem muitas variações dessas hipóteses, incluindo a benigna que defende que não detectamos ninguém, pois ninguém usa mais rádio, seria uma fase muito curta na História de uma civilização.

Ondas de rádio realmente são bem limitadas, se enfraquece com o inverso do quadrado da distância.

Lembre-se, estamos transmitindo um sinal em todas as direções, em uma esfera. Imagine um balão quase murcho. Pinte pontinhos em sua superfície. São os fótons das ondas de rádio. Sopre o balão. À medida que ele infla, os pontos ficam mais distantes do centro, mas mais distantes entre si. Uma tampinha de cerveja significando uma antena captaria, sei lá, 5 pontos se encostada na superfície do balão murcho, mas com ele mais inflado, só conseguiria cobrir 2 pontos. Ou seja, o sinal está mais distante, mas mais fraco.

A Hipótese da Floresta Sombria

O conceito foi proposto em 1983 por David Brin, em 1987 ele foi mais detalhado na novela The Forge of God, de Great Bear, mas o termo “Floresta Sombria” foi cunhado por Liu Cixin, em 2008, no livro do mesmo nome, segundo da genial e ambiciosa (talvez ambiciosa demais) trilogia iniciada com O Problema dos Três Corpos.

Uma... floresta sombria (Crédito: Stable Diffusion)

A hipótese parte do princípio que existe uma pletora de civilizações no Universo, mas os recursos são finitos. Toda civilização tende a crescer e se expandir, colonizando seu sistema solar, e depois estrelas próximas, formando impérios e colecionando mundos.

Civilizações sem essas ambições são colonizadas por outras, eventualmente assimiladas.

Toda civilização é vista como competição, e competição deve ser eliminada.

A Floresta Sombria é uma metáfora. Imagine um grupo de caçadores em uma floresta sombria. Cada um caçando os outros. Um vê uma fogueira. Pode ser um caçador novato, desavisado. Outros caçadores o abatem antes que ele crie experiência, e com isso sobra mais floresta para os outros.

Na hipótese da Floresta Sombria, assim que uma civilização anuncia sua existência ao Universo, é eliminada para não se tornar uma futura competidora. As outras civilizações se mantêm em silêncio, mas ocasionalmente uma é detectada. Aí algo sinistro acontece:

A civilização que fez a detecção pode não atacar, por não ter tecnologia ou para não se expor, então ela transmite um sinal com as coordenadas da outra civilização, que eventualmente é destruída por alguém mais forte e mais determinado.

Nós estaríamos colocando nossa existência em perigo, ao transmitir sinais para as estrelas.

A ideia de um universo com recursos finitos pode parecer sem sentido, mas se lidarmos com um Universo onde a Velocidade da Luz é o limite máximo, sem atalhos, Stargates ou Dobras Espaciais, o comércio entre sistemas estelares poderá levar centenas, talvez milhares de anos.

Um sistema solar terá que se virar apenas com recursos locais. Materiais de outras partes do Império serão usados em obras verdadeiramente grandiosas, com prazos de dezenas de milhares de anos, como Esferas de Dyson. Quando uma estrela inteira se torna material de construção, é muito inteligente você se encolher e rezar para ninguém perceber que seu planeta existe.

Não há final feliz para a Hipótese da Floresta Sombria, são civilizações destruindo civilizações, galáxias contra galáxias, até que não reste mais ninguém de pé, pois uma guerra nessa escala não tem como deixar sobreviventes.

Literalmente não temos como comprovar a hipótese da Floresta Sombria, mas só de pensar nela, já lembro de fazer minha parte e colocar o celular em Modo Avião.

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