Meio Bit » Ciência » Neuralink: Elon Musk mentiu sobre testes em macacos

Neuralink: Elon Musk mentiu sobre testes em macacos

Documentos dos testes da Neuralink desmentem versão de Elon Musk, de macacos em estágio terminal e que cirurgias não foram exploratórias

30 semanas atrás

A Neuralink é a companhia mais obscura do bilionário Elon Musk, dono da Tesla, SpaceX e X (ex-Twitter). Fundada para avançar os estudos na área da comunicação cérebro/máquina, seu objetivo é permitir que humanos possam se comunicar mentalmente com computadores, para diversos fins. É o mesmo campo do Dr. Miguel Nicolelis, que apresentou resultados modestos no passado.

A pesquisa da Neuralink em si não é inédita, inserir conexões físicas no córtex cerebral é feito em pacientes com limitações específicas, mas Musk quer que todo mundo coloque um chip no cérebro para, entre outras coisas, ouvir música e chamar seu Tesla à distância, mas a princípio, seguirá o mesmo caminho de outras pesquisas de hoje, para devolver mobilidade a tetraplégicos, ou pacientes com esclerose lateral amiotrófica (ELA).

Elon Musk afirma que o método de interação cérebro/máquina da Neuralink é seguro, mas não é o que os documentos dizem (Crédito: Dennis Berger)

Elon Musk afirma que o método de interação cérebro/máquina da Neuralink é seguro, mas não é o que os documentos dizem (Crédito: Dennis Berger)

A Neuralink vem realizando testes com animais, entre porcos e macacos, desde 2017, e nesta quarta-feira (20), anunciou ter recebido autorização de um corpo independente de avaliação para iniciar o recrutamento de voluntários humanos, após a FDA (Food and Drug Administration, órgão dos EUA equivalente à Anvisa) dar permissão para os procedimentos em maio de 2023; a agência havia negado o pedido de Musk em 2022, por preocupações acerca de um superaquecimento dos chips.

No entanto, uma investigação trazida a público simultaneamente ao início do recrutamento pode atrapalhar os planos de Musk para a Neuralink, ao revelar um cenário digno de filmes de terror envolvendo os macacos usados nos testes com animais, que desmente afirmações anteriores do executivo, sobre o estado dos espécimes e os procedimentos cirúrgicos.

Neuralink: edemas, dor e cérebros esfarelados

Ainda nesta quarta-feira (20), o site WIRED publicou um longo e detalhado artigo, baseado no estudo do Comitê de Médicos Medicina Responsável (Physicians Committee for Responsible Medicine, ou PCRM), ONG que luta contra testes realizados em animais.

Este teve acesso a documentos do departamento de Veterinária da Universidade da Califórnia em Davis, instituição que trabalhou com a pesquisa entre 2017 e 2020, sobre as cirurgias realizadas em diversos macacos da espécie Rhesus (Macaca mulatta), usados na fase de experimentação em animais.

O relatório aponta que as mortes dos espécimes, já anteriormente divulgada, foram consequências diretas dos experimentos realizados pela Neuralink, algo que Musk nega veementemente; em defesa à sua companhia, o bilionário afirmou que os macacos "estavam em fase terminal" quando foram selecionados, mas um ex-funcionário, que pediu para permanecer anônimo por medo de retaliação, afirma que as cobaias passavam por pelo menos um ano de aclimatação e treinamento comportamental, antes da cirurgia.

Outra pesquisadora, uma doutoranda do Centro de Pesquisas com Primatas da UC Davis, que também pediu para não ser identificada, questionou a equipe sobre as alegações de Musk de que os macacos estariam perto da morte, quando, na verdade, todos os espécimes "eram bem jovens".

Resumindo, o dono da Neuralink mentiu.

No entendimento do PCRM, que submeteu uma carta à SEC (Securities and Exchange Commission), a agência que regula o mercado financeiro dos EUA, para que esta investigue a Neuralink, o executivo o fez "em um esforço para ludibriar os acionistas, sobre a real segurança e desenvolvimento do implante cerebral", o que pode inclusive caracterizar fraude médica e financeira, similar ao golpe de Elizabeth Holmes, a hoje encarcerada ex-CEO da Theranos.

Os documentos, disponibilizados publicamente no fim de 2022, pintam um cenário terrível. Pelo menos 12 macacos tiveram que ser eutanasiados, após apresentarem diversos quadros de efeitos colaterais relacionados diretamente ao implante. Os casos envolviam diarreia hemorrágica, paralisia parcial e edemas cerebrais, mas alguns espécimes experimentaram sofrimentos específicos.

Um dos macacos, identificado como "animal N.º 20" no relatório da UC Davis, foi submetido a um teste de sobrevivência e observado em 2019. Ao coçar o local da cirurgia, que começou a sangrar, ele "quebrou" um componente interno e mesmo após passar por um procedimento de correção, ele contraiu infecções e teve que ser sacrificado, em janeiro de 2020.

Qualquer semelhança... (Crédito: Reprodução/Edward R. Pressman/New Line Cinema/Warner Bros. Pictures/Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Qualquer semelhança... (Crédito: Reprodução/Edward R. Pressman/New Line Cinema/Warner Bros. Pictures/Ronaldo Gogoni/Meio Bit)

Outro espécime, uma fêmea chamada de "animal N.º 15", começou a bater a cabeça contra o chão sem motivo aparente, indicando que ela sentia dor, pela presença do implante ou devido a uma infecção subsequente. Ela passou a puxar o implante até sangrar, e começou a perder a coordenação motora, e a "tremer descontroladamente" quando um pesquisador se aproximava.

Após eutanasiada, uma necrópsia revelou que ela sofreu com um sangramento interno, e que os eletrodos implantados "esfarelaram" partes de seu cérebro.

A necrópsia de ainda outro macaco, "animal N.º 22", sacrificado em março de 2020 após o implante craniano ficar frouxo, revelou que ele "podia ser facilmente puxado", e que sua falha "podia ser classificada como puramente mecânica, não tendo sido exacerbada por infecções", ou seja, erro humano.

Esta conclusão refuta categoricamente o argumento de Elon Musk, que "nenhum macaco morreu" por decorrência das cirurgias, e jogar a culpa na eutanásia não serve como desculpa. De certa forma, os pesquisadores da Neuralink estavam realizando cirurgias exploratórias, basicamente cutucando o cérebro de macacos para ver o que acontecia, e agora, querem aplicar essa mesma metodologia em humanos.

Ryan Merkley, líder do estudo do PCRM, a Neuralink tentou varrer para baixo do tapete todos os problemas com o implante e os métodos de implantação, e as consequências funestas para os macacos, a fim de não perder dinheiro e conseguir a aprovação dos testes com humanos o mais rápido possível:

"Eles (a Neuralink) afirmam que colocarão um dispositivo seguro no mercado, e é por isso que você (usuário ou acionista) deve investir (...). Mas o que nós vimos por trás dessa mentira, foi uma tentativa de encobrir o que aconteceu durante esses estudos exploratórios."

Um porta-voz da UC Davis declarou que o departamento "não fará comentários" a respeito da pesquisa; Elon Musk não se pronunciou, e a Neuralink, assim como quase todas as companhias do bilionário, não possui um departamento de Relações Públicas. A única exceção é a SpaceX, por exigência da FCC.

Fonte: WIRED

Leia mais sobre: , , , .

relacionados


Comentários