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Como o Homem-Aranha "criou" a tornozeleira eletrônica

Tirinhas do Aranha dos anos 1970 inspiraram o desenvolvimento da tornozeleira eletrônica, que monitora presos em condicional

1 ano e meio atrás

A tornozeleira eletrônica é um dispositivo usado para monitorar presos em condicional ou prisão domiciliar, que aponta a localização do indivíduo constantemente. Ele deve se manter restrito ao perímetro estabelecido pela Justiça, e nunca tirar o aparelho, se não quiser voltar para a cadeia.

Desenvolvido nos Estados Unidos, a tornozeleira é uma das fontes de renda por patentes mais lucrativas do país, mas o que pouca gente sabe, é que a ideia para o dispositivo saiu de uma tirinha de jornal do Homem-Aranha, publicada nos anos 1970.

Jameson só lamenta que o Aranha não foi o primeiro a testar a tornozeleira (Crédito: Reprodução/Columbia Pictures/Sony Pictures/Marvel Entertainment/Disney)

Jameson só lamenta que o Aranha não foi o primeiro a testar a tornozeleira (Crédito: Reprodução/Columbia Pictures/Sony Pictures/Marvel Entertainment/Disney)

O causo em questão aconteceu durante a época em que a Marvel Comics, assim como a DC e várias outras companhias de quadrinhos, publicavam tirinhas de seus personagens em diversos jornais dos EUA, para diversificar sua receita. A série Thor: Contos de Asgard, de Stan Lee e Jack Kirby, surgiu primeiro como uma tirinha, depois foi compilada e colorizada em gibis.

Lee também roteirizava a tirinha O Espetacular Homem-Aranha (no original, The Amazing Spider-Man), esta desenhada por John Romita Sr., ainda considerado um dos melhores artistas a dar forma ao cabeça-de-teia. Ele respondia simultaneamente pela arte nas HQs e nos jornais nessa época.

Entre agosto e setembro de 1977, Lee e Romita Sr. publicaram na tirinha um arco em que o Aranha tinha que lidar com um novo plano de Wilson Fisk, o Rei do Crime. Ele acaba forçado a usar um bracelete eletrônico, basicamente um ping portátil, que apontava continuamente sua posição para o vilão.

A tirinha circulava também nos jornais do condado de Bernalillo, Novo México, no que foi lida por um juiz local, chamado Jack Love.

A tirinha que deu ideias a um juiz do Novo México (Crédito: Reprodução/newspapers.com/Marvel Comics/Disney)

A tirinha que deu ideias a um juiz do Novo México (Crédito: Reprodução/Newspapers.com/Marvel Comics/Disney)

Este juiz seria o primeiro dos EUA a autorizar o uso das tornozeleiras eletrônicas em sua jurisdição. Ele estabeleceu uma parceria com um engenheiro chamado Michael Goss, para desenvolver um dispositivo que, quando em uso, estabelecesse um perímetro onde o preso em condicional seria limitado a permanecer, o tempo todo.

A primeira versão do "Goss-Link", o nome oficial da tornozeleira, se conectava a um receptor ligado a uma linha telefônica, que disparava um ping a cada 60 minutos. O gadget, preso ao tornozelo do preso, recebia o sinal e mandava um de volta, desde que estivesse no alcance máximo de 150 pés (45,72 m).

Caso o dispositivo falhasse em mandar um sinal de volta, independente do motivo (o cenário provável, o preso saiu do perímetro), o receptor discava automaticamente para a polícia, que ia ao encalço do meliante.

O próprio juiz Love foi um dos primeiros a testar a eficiência da tornozeleira, no que ele a usou até durante o banho, sem problema algum. Ele atestou a utilidade primária para convictos do crime de dirigir embriagado, no que estes eram terminantemente proibidos de chegarem perto de seus carros, ou de entrar em bares à noite.

Com o Goss-Link, a polícia saberia se eles tentassem dirigir enquanto monitorados.

Notícia do jornal Albuquerque Tribune do Novo México, de 18 de março de 1983, apresentando a então novidade. Da dir. para a esq., Michael Goss, juiz Jack Love, e James Guttman, assistente de Goss na criação da tornozeleira (Crédito: Reprodução/Newspapers.com)

Notícia do jornal Albuquerque Tribune do Novo México, de 18 de março de 1983, apresentando a então novidade. Da dir. para a esq., Michael Goss, juiz Jack Love, e James Guttman, assistente de Goss na criação da tornozeleira (Crédito: Reprodução/Newspapers.com)

Em uma notícia do The New York Times de 1984, o juiz Love chegou a creditar o Homem-Aranha pela invenção da tornozeleira eletrônica.

Os primeiros testes com a tornozeleira foram conduzidos com três prisioneiros em condicional. O primeiro, condenado por repassar cheques sem fundo, foi selecionado por ter um filho menor de idade; o segundo, um veterano do Vietnã que já havia violado sua condicional por receptação de mercadoria roubada; o terceiro, preso por dirigir bêbado.

Todos os três usaram o Goss-Link por 30 dias; o primeiro foi novamente preso, desta vez por furto, dois meses depois do experimento; o segundo, que cumpria toque de recolher, apareceu bêbado no 5.º dia, no que foi mandado de volta à prisão.

Somente o terceiro preso em condicional cumpriu todos os 30 dias do teste e não teve registros de reincidência.

Modelo moderno de tornozeleira eletrônica (Crédito: acervo internet)

Modelo moderno de tornozeleira eletrônica (Crédito: acervo internet)

A ironia dessa história é que o experimento foi interrompido pela Suprema Corte do estado do Novo México, não por preocupações acerca da violação da privacidade dos prisioneiros, e sim porque o juiz Love... queimou etapas.

O projeto realizado com Michael Goss foi uma iniciativa independente, o contrato foi assinado sem que o magistrado apresentasse a ideia para apreciação pelos outros juízes da comarca de Bernadillo. O caso foi parar na Suprema Corte dos EUA, que concordou com a súmula de que Love não devia ter colocado o carro na frente dos bois, e que o certo seria apresentar a ideia para apreciação por seus pares, e realizar todo o processo legal requerido.

Só que o gênio já havia saído da garrafa. Entre 1983 e 1988, diversas outras companhias começaram a apresentar versões do Goss-Link a diversas comarcas e distritos judiciais dos EUA, que, na visão de Goss, custaria cerca de US$ 5/dia aos cofres públicos para manter o uso de uma unidade. Hoje, presos autorizados a optar pelo monitoramento para não ficarem presos, pagam taxas que chegam a até US$ 5 mil/ano ao Estado, uma das muitas críticas ao sistema.

Para terminar, embora a indústria da tornozeleira eletrônica seja um negócio milionário para o Estado e os fabricantes, Michael Goss não ficou rico com seu invento; outros, que o copiaram, ficaram.

Tudo por culpa do Homem-Aranha, aquela ameaça mascarada.

Fonte: Gizmodo

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