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Cientistas Chineses medem velocidade do Fantasma de Einstein

Poucos efeitos quânticos são mais curiosos e anti-intuitivos do que o que Einstein chamou de “Efeito Fantasmagórico à Distância”. Agora cientistas chineses foram além e descobriram que esse fantasma viaja 10 mil vezes mais rápido que um feixe de prótons.

10 anos atrás

santanaquantum

Se há uma imagem mais adequada para um artigo sobre mecânica quântica, eu gostaria de saber.

A Mecânica Quântica é uma coisa que nunca desceu pela garganta de Albert Einstein. Toda sua incerteza não ressoava na mente ordenada que sonhava com um Universo sistêmico e ordenado. Só que Einstein era mais inteligente do que o pessoal que utiliza a sério o termo “heresia”, e Mesmo vendo seus dogmas ameaçados, percebeu elegância no modelo quântico.

Einstein terminou sendo um dos maiores críticos E um dos maiores colaboradores da teoria quântica. Um dos pontos de crítica é algo chamado pelo próprio Einstein de spukhafte Fernwirkung, ou “Efeito fantasmagórico à distância”. Descrito em um trabalho de 1935, o chamado Entrelaçamento Quântico é algo que Einstein considerava impossível.

Aí vieram os físicos experimentalistas, testaram em laboratório e descobriram que o efeito existe. Einstein estava errado. Não que muita gente tenha comemorado, o spukhafte Fernwirkung é uma enorme fonte de dor de cabeça.

O conceito é enganosamente simples. Funciona com partículas, e até objetos microscópicos, que são “entrelaçados” em suas características atômicas. Vejamos uma analogia, que lembra um pouco o Gato de Schrödinger, o que é justo, visto que ele foi um dos pioneiros (e autor do) conceito de Entrelaçamento Quântico.

Imagine que eu tenha uma máquina que produza moedas. Sem que ninguém veja, dentro da máquina ela cunha uma moeda. Um laser a divide ao meio. Metade cara, metade coroa. Cada metade é embalada e enviada para um laboratório do outro lado do país.

Nenhum dos dois cientistas sabe se a moeda é cara ou coroa. Quando um abre a caixa esses estados superpostos deixam de existir, a função de onda que define a moeda deixa de variar aleatoriamente e a probabilidade de ser cara ou coroa chega a 100%. Da mesma forma o cientista SABE qual o estado da moeda do outro lado.

Simples, não? Só que isso não é entrelaçamento quântico. Ainda não. Imagine que a máquina cunhe DUAS moedas ao mesmo tempo. Cada uma vai numa caixa, presa com uma gota de cola. As moedas podem ser cara ou coroa. Quando um cientista abre a caixa e descobre que a SUA moeda caiu com o lado cara pra cima, a outra caixa estará com o lado coroa pra cima.

São moedas diferentes, objetos isolados, mas no modelo quântico são uma coisa só, são descritas pela mesma função de onda. O ato de observar a moeda aqui fez a moeda em Manaus “escolher um lado”.

Isso foi testado experimentalmente com fótons entrelaçados. Um dos experimentos mais recentes foi de Robert FicklerMario KrennRadek LapkiewiczSven Ramelow e Anton Zeilinger, da Universidade de Viena. Eles usaram um equipamento assim:

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No experimento um par de fótons entrelaçados é criado. Um é enviado para um detector, mas antes chega a um filtro polarizador, que só permite a passagem de fótons com uma polaridade específica. Quando um fóton é detectado, um sinal é enviado para uma câmera que então fotografa o outro fóton. Há um carretel de fibra óptica usado para gerar um atraso, permitindo que o detector tenha tempo de acionar a câmera.

Até aí não temos entrelaçamento, mas se girarmos o filtro polarizador. E é hora de uma aulinha:

A luz, como toda radiação eletromagnética é uma onda. Ela tem dimensões espaciais, como comprimento de onda e frequência. E ângulo. A luz da maioria das fontes, como o Sol é não-polarizada. Emitida aleatoriamente em todos os ângulos. Isso pode ser controlado com filtros. Veja no vídeo abaixo um exemplo bem didático de como um polarizador controla a passagem de ondas:

Simples, não? No nosso caso só fótons com polarização diagonal chegam ao detector. Com ele desligado, a câmera capta fótons aleatórios, mas se acionarmos o detector e tentarmos capturar os fótons entrelaçados, algo acontece: é formado um padrão complementar. Mais ainda: girando o polarizador e alterando os fótons detectados, há uma mudança de padrão na câmera. Lembre-se, são OUTROS FÓTONS. Estamos escolhendo detectar um não um fóton e o “irmão” dele aparece — ou não — na câmera. Veja o vídeo dessa bagaça funcionando:

Agora o mais assustador: Não são “partículas complementares”. A definição de seu estado ocorre com o colapso da função de onda, causado pela observação do primeiro fóton. A “informação” de “ei, agora você tem um estado definido” viaja de uma partícula a outra em uma velocidade finita.

“OK, mais e Einstein?”

Exato, agora a coisa complica. Um grupo de cientistas chineses mediu a velocidade com que o Efeito Fantasmagórico é transmitido. Usaram dois detectores de fótons separados por 15,3 km. No meio uma fonte emitia partículas entrelaçadas. Depois de 12 horas de medições, levando em conta até a rotação da terra, descobriram que essa informação viajava entre as partículas a nada menos que 10 mil vezes a velocidade da Luz. O que como todos sabemos, é ilegal.

“OK, mais e Einstein?”

Calma. Einstein não gostava do Efeito-Gasparzinho justamente por isso, mas a própria relatividade traz a resposta. Nada pode viajar acima da velocidade da Luz. Principalmente informação, e nenhuma informação é passada entre os observadores. Yes crianças, Deus é um advogado e o Diabo está nos detalhes. Percebe-se, estamos ferrados.

O colapso da função de onda viaja 10 mil vezes mais rápido do que a Luz, mas só quando quer. Nós não podemos usar isso pra nada. Mesmo que fosse possível codificar informação nos fótons, eles viajam na velocidade da Luz, então mandar uma mensagem para Kepler 186f seria instantâneo, descontando os 500 anos para o fóton chegar até lá.

Mesmo assim o entrelaçamento quântico tem várias utilidades inclusive na ainda nascente criptografia quântica. Uma das formas de enviar sinais é misturando-os a ruído aleatório. Se você misturar sua transmissão com uma série de fótons aleatórios entrelaçados E transmitir junto o sinal dos fótons, um receptor pode decodificar a mensagem, e dada as características dos sistemas quânticos, se alguém interceptar a mensagem não conseguirá reenviar, e você perceberá que ela foi observada.

Claro, como não podia deixar de ser, PIORA.

Usando teleporte quântico você pode gerar um par de partículas entrelaçadas, teleportar uma delas para que entre em contato com outra partícula e ela repassará as informações de entrelaçamento. Assim você termina com duas partículas entrelaçadas que nunca se encontraram antes.

Assustador? Faz parte da descrição da maioria dos fantasmas.

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