Ronaldo Gogoni 6 anos atrás
Quando Donald Trump assumiu a presidência dos EUA houve um temor muito grande de que o governo iria tentar reverter os esforços estaduais na legalização da maconha, de forma a não apenas combater o tráfico mas regularizar o uso medicinal da erva.
A nomeação do senador Jeff Sessions como procurador-geral e chefe do Departamento de Justiça reforçou esse sentimento, visto que ele já declarou que "pessoas de bem não fumam maconha" e poderia ser uma pedra no sapato das administrações que legalizaram o consumo. Dito e feito, mas Sessions está enfrentando resistência d próprio Congresso.
Vale explicar mais uma vez como funciona a lei americana quanto ao consumo de maconha: a legislação federal proíbe veementemente seu uso em quaisquer circunstâncias, mas os estados podem decidir o que fazer independente da instância superior. No atual cenário 28 dos 50 estados possuem regras mais frouxas quanto ao consumo da maconha, seja descriminalizando-a ou legalizando formalmente. Vários estados possuem leis específicas para uso medicinal leve ou específico, que demanda processamento de variantes com alta concentração de canabidiol (CBD), indicada para o tratamento de doenças como epilepsia. A Califórnia recentemente descriminalizou o uso, bem como Nevada e Massachussets.
Outros estados são bem mais rígidos. No Texas, por exemplo o porte e uso ainda é crime, e mesmo a aplicação medicinal controlada é proibida. No estado do Alabama, reduto eleitoral de Jeff Sessions apenas o uso medicinal de CBD é permitido, mas ele próprio já havia dado a entender que nem isso ele viria a tolerar em seu mandato à frente do Departamento de Justiça. Em fevereiro, quando questionado sobre o assunto o procurador-geral disse o seguinte:
"Eu definitivamente não sou um fã do uso expandido da maconha; os estados, no entanto podem passar as leis que quiserem. Eu digo apenas que distribuir a erva nos Estados Unidos permanece sendo um crime federal, independente de um estado legalizar seu uso ou não."
Sessions vem trabalhando para reforçar as leis federais acima da legislação dos estados, tentando frear todo o avanço da discussão sobre a criminalização das drogas e mesmo o uso medicinal não foi poupado; é seu desejo voltar ao estado anterior criminalizando toda e qualquer aplicação do cânhamo nos Estados Unidos, independente se para uso recreativo ou tratamento de doenças graves. Infelizmente para ele o Congresso não pensa assim.
Em abril a Câmara aprovou o orçamento de US$ 1,1 trilhão para o atual ano fiscal, sancionada por Trump em maio que incluía uma cláusula muito específica: o Departamento de Justiça fica impedido de usar seus fundos para combater leis estaduais referentes ao uso medicinal de maconha. Não satisfeito com a puxada de tapete, Sessions contra-atacou escrevendo uma carta ao Congresso (cuidado, PDF) pedindo autorização para combater os fármacos baseados em cânhamo e utilizando uma série de argumentos furados, visivelmente apelando para o FUD (Fear, Uncertainty and Doubt ou Medo, Incerteza e Dúvida).
Sua lógica não tem um pingo de caráter: Sessions diz que o uso de maconha aumenta o consumo de opioides quando estudos apontam exatamente o contrário: estados em que a erva é permitida, mesmo na forma do cigarrinho de artista o consumo de analgésicos e outros medicamentos perigosos está caindo. No entanto Sessions deve enfrentar dura resistência e não por causa de princípios moralistas:
A verdade é que a maconha está rendendo MUITO dinheiro aos EUA. A legalização/descriminalização reverte US$ 1 bilhão em impostos ao ano, sem falar no menor consumo de medicamentos verdadeiramente perigosos e o tratamento de doenças debilitantes que os tradicionais não combatem tão bem. Pais de crianças com epilepsia severa e outros distúrbios graves têm muito a agradecer ao governo Obama, que brigou pela legalização dos fármacos.
Mesmo Trump não possui uma agenda concreta sobre o assunto. Décadas atrás ele disse que país deveria legalizar e controlar todas as drogas ilícitas, a fim de injetar os impostos na educação. Mais recentemente ele declarou ser 100% a favor do uso medicinal da maconha. No Twitter o assunto é tabu, o presidente não menciona uma vírgula sobre.
O mais provável de acontecer é o Congresso dar de ombros para as declarações alarmistas de Sessions, que pode sim utilizar o Departamento de Justiça para combater o uso recreativo em nível federal; por outro lado sua cruzada contra a maconha medicinal soa como um mimimi fundamentalista, sendo que seu uso já foi provado como benéfico e é feito por gente séria.
Fonte: Ars Technica.