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SpaceX ganha mais um desafeto: radioastrônomos

Institutos de radioastronomia dizem que satélites StarLink da SpaceX interferem em observações, e podem danificar equipamentos sensíveis

04/06/2024 às 12:27

A SpaceX, companhia aeroespacial de Elon Musk, não tem uma boa imagem junto à pesquisa astronômica e não é de hoje. É fato comprovado que os satélites StarLink, de órbita baixa (LEO) para conexão à internet, estão poluindo o céu observável e dificultando pesquisas, o que a própria empresa admite e está tentando remediar, o que vem dando algum resultado.

Pesquisadores afirmam que mega constelações de satélites, como os da SttarLink, interferem na radioastronomia (Crédito: Ronaldo Gogoni/ Meio Bit) / spacex

Pesquisadores afirmam que mega constelações de satélites, como os da SttarLink, interferem na radioastronomia (Crédito: Ronaldo Gogoni/ Meio Bit)

Como nada está tão ruim que não pode piorar, vários institutos e pesquisadores submeteram reclamações à FCC (Federal Communications Commission, ou Comissão Federal de Comunicações), o órgão do governo dos Estados Unidos equivalente à Anatel no Brasil, para que esta averígue como mega constelações de satélites, tanto da SpaceX quanto da concorrente AST SpaceMobile, estão prejudicando a radioastronomia, interferindo nas observações e até danificando equipamentos.

SpaceX vs. Cientistas, Round 2

No que se refere a telecomunicações e internet, satélites LEO são muito mais eficientes quando comparados aos geoestacionários, dada a óbvia diferença na distância que ambas categorias se situam em relação à Terra: pegando um exemplo aleatório, o brasileiro SGDC-1, lançado com sucesso em 2017 (pois é, às vezes a gente acerta), se encontra a 35.786 km de altitude, em órbita geossíncrona ou órbita de Clarke, girando na mesma velocidade da Terra.

De nosso ponto de vista, é como se ele estivesse parado no céu, sempre sobre o mesmo ponto, a menos que seja movido. Satélites geoestacionários são importantes do ponto de vista estratégico, mas a velocidade de comunicação não é das melhores, porque Einstein não perdoa: o ping médio é de 240 ms.

Satélites LEO como os da StarLink, por sua vez, operam bem mais baixo, ficando entre 520 e 550 km, na média. A essa altitude, a comunicação se torna muito mais rápida, o suficiente para viabilizar serviços ao consumidor final, com relativa competitividade quando comparado a serviços de conexões terrestres, mas oferecem muito mais velocidade e estabilidade do que concorrentes que oferecem internet via satélites geoestacionários, como a HughesNet, sem falar que a SpaceX cobra bem menos.

Claro que o avanço teve um preço, e quem está pagando é a comunidade científica. Objetos em órbita mais baixa são bem mais visíveis, e os satélites são bastante brilhantes, assim, constelações da StarLink e concorrentes acabavam photobombando em capturas de longa exposição, no que a CalTech levantou que, em apenas um observatório em 2021, elas estragaram 18% das imagens.

Assim como na diferença entre desempenho de um LEO e um geoestacionário, novamente a Física não perdoa ninguém, e não há a menor possibilidade de prejudicar a pesquisa científica e a observação do espaço, por institutos e amadores, em nome de uma empresa fazer mais dinheiro. No entanto, antes que a FCC se manifestasse, a SpaceX se comprometeu a resolver o problema por iniciativa própria.

Primeiro, a companhia testou espelhos anti-reflexo, mas nunca gostou deles por aumentarem o arrasto, e de qualquer forma, eles não resolveram o problema; a técnica mais recente, revelada em setembro de 2023 (vídeo acima), utiliza um filme para diminuir a reflexividade dos satélites, que também não é perfeito, mas ao menos a empresa publicou a técnica em caráter aberto (cuidado, PDF), para quem quiser usar e aperfeiçoar.

Hoje, há um entendimento que tanto as companhias de mega constelações de satélites, quanto astrônomos e institutos terão que aprender a conviver, mas agora, a comunidade radioastronômica resolveu engrossar o coro... e estão dispostos a entornar o caldo de Musk e cia.

Várias universidades, institutos, e pesquisadores autônomos enviaram cartas à FCC, pedindo à agência norte-americana que se atente às novas gerações de satélites da StarLink e AST SpaceMobile, que oferecerão comunicação direta para celulares (direct-to-cell), o que os cientistas afirmam que acabarão com as "zonas de silêncio" do céu observável, necessárias para radiotelescópios operarem.

A Sociedade Astronômica da América, um dos reclamantes, afirma que, com cada vez mais constelações operando, e os satélites LEO ficando maiores (o futuro V2 da StarLink, na configuração completa, é um trambolho de duas toneladas), as zonas consideradas ideais para prescrutar o Espaço profundo vão diminuir, e muito.

Não obstante, um relatório de outra agência dos EUA, a Fundação Nacional da Ciência (NSF), aponta (cuidado, PDF) que equipamentos sensíveis de radioastronomia podem ser danificados, pela passagem de um desses satélites na frente de seus receptores.

Jodie Foster em cena do filme "Contato" (1997), baseado no livro de Carl Sagan (Crédito: ImageMovers/Warner Bros.)

Jodie Foster em cena do filme Contato (1997), baseado no livro de Carl Sagan (Crédito: ImageMovers/Warner Bros.)

A intenção dos pesquisadores de radioastronomia, é forçar a FCC a realizar um profundo escrutínio na tecnologia direct-to-cell dos satélites mais modernos, de modo que SpaceX e AST SpaceMobile tenham que demonstrar, com provas, que seus equipamentos não representam (mais uma) ameaça à pesquisa científica.

Até o momento, nenhuma das duas companhias se manifestou a respeito.

Fonte: Federal Communications Commission

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