Carlos Cardoso 2 anos atrás
Spot é aquele cachorro-robô da Boston Dynamics, simpático e inofensivo, exceto pro pessoal de New York que acha que ele é basicamente um T-1000 disfarçado. Já a NASA acha que ele pode ser um excelente recurso para explorar cavernas marcianas.
Calma, o Spot é do bem. (Crédito: Boston Dynamics)
Uma vez eu estava conversando com um blogueiro cientista, não lembro se o Átila ou o Hotta, e comentei achar estranho a Evolução nunca ter inventado a roda, exceto no caso daquelas plantas que habitam faroestes. Coisas bem mais complexas foram inventadas pela Natureza, como a hélice, no caso dos flagelos de alguns organismos unicelulares, e há até uma espécie de insetos que usam ENGRENAGENS para saltar.
A resposta caiu como uma tonelada de tijolos com a cara do Carl Sagan. “Antes de evoluir a roda, a Natureza precisaria evoluir estradas”. E é verdade. Existem pouquíssimos ambientes naturais na Terra onde rodas são úteis. O melhor 4x4 gasta uma quantidade considerável de energia para atravessar terrenos que qualquer quadrúpede passa sem nenhum esforço.
Esse é um motivo para os andadores imperiais em Guerra nas Estrelas serem uma idéia idiota (pergunte aos Ewoks) e máquinas especializadas que usam pernas são raras, não costumam passar da fase de protótipo e quando passam, ninguém compra.
Ironicamente Marte é o planeta ideal para... rodas. A geologia do planeta criou imensas planícies, crateras com bordas suaves e terrenos que podem ser explorados por séculos por nada mais que um Land Rover pressurizado. E esse é um dos motivos dos robôs que mandamos para lá usarem rodas, ao invés de pernas ou esteiras.
Só que nem todo terreno, mesmo em Marte é ideal para rodas. Robôs pequenos são especialmente vulneráveis, e as futuras explorações de cavernas no fundo de crateras não poderão ser feitas com robôs de rodízios.
Isso é angustiante, pois nos tubos de lava, protegidos da radiação e do clima da superfície é aonde esperamos achar os últimos remanescentes da vida marciana. Que tipo de robô seria capaz de andar nesse terreno irregular, com autonomia para lidar com o terreno em tempo real, capaz de se erguer se perder o equilíbrio, e versátil o bastante para executar pesquisas científicas?
Cratera em Marte com afloramento de um possível tubo de lava (Crédito: NASA/HIRISE)
A NASA acha que é o Spot, da Boston Dynamics, ou ao menos um de seus descendentes.
Ele está sendo usado em um projeto piloto usando a tecnologia NeBula, do Jaboratório de Propulsão a Jato da Califórnia. É um conjunto de softwares de inteligência artificial que pretende dotar sondas e robôs de total autonomia, acabando com o microgerenciamento das missões atuais, onde cada passo é ensaiado e controlado de Terra.
O projeto está instalando um monte de sensores extras no Spot, que por sua vez foi entregue para o Projeto BRAILE (Biologic and Resource Analog investigations in Low Light Environments), um projeto que pesquisa cavernas e tubos de lava na Terra, atrás de sinais de vida, para aprender como fazer o mesmo em Marte e outros lugares.
Eles originalmente usavam um robô convencional, com rodas, mas o Spot assumiu o centro dos holofotes.
Com o NeBula o Spot passa a operar em grupo, vários robôs explorando o ambiente, criando mapas tridimensionais e compartilhando entre si as informações. Eles são capazes de identificar áreas perigosas, como regiões com água, e traçar rotas contornando esses obstáculos. Caso o sinal esteja começando a degradar, um robô pode comandar outro para posicionar naquele ponto um repetidor.
Como o Spot não é blindado contra radiação nem projetado para trabalhar em temperaturas extremas no quase vácuo de Marte, ele terá que ser reprojetado totalmente, mas mesmo que fique 10 vezes mais caro, US$750 mil, não chega nem perto dos US$2,5 bilhões da Curiosity ou dos US$80 milhões do mini-drone Ingenuity.
Será a NASA a salvação da Boston Dynamics? Eu consigo facilmente ver dezenas de Spots alegremente saltitando pela superfície de Marte, da Lua, Europa e outros satélites, como um V’Ger de quatro patas aprendendo tudo que for possível aprender e levando a informação para o Criador.