Ronaldo Gogoni 2 anos atrás
Depois de Marte, Vênus é o planeta mais próximo da Terra minimamente viável para exploração humana, tanto pela proximidade quanto pelas similaridades, embora seja a mais próxima definição de um inferno real, com temperaturas acima de 460º C, ventos de mais de 400 km/h, chuvas de ácido sulfúrico, pressão equivalente a 92 atmosferas terrestres, esta 98% composta de dióxido de carbono, que impõe ao planeta um Efeito Estufa permanente.
Imagem composta de Vênus criada com dados da sonda espacial Magellan e da Pioneer (Crédito: NASA/JPL-Caltech)
Por ser o corpo celeste mais brilhante do céu depois do Sol e da Lua, e ser descrito como uma das "estrelas errantes" (em grego, planetes asteres), Vênus foi inicialmente identificado como a representação da divindade da alvorada, por ser visível de manhã, daí o nome de Estrela D'Alva.
Os gregos chamavam a visão matutina de Vênus de Fósforo, "portador da luz", filho da deusa Éos, a Aurora, enquanto de tarde o nome mudava para Héspero, ou "Estrela Vespertina". Em Roma o nome usado, que significava a mesma coisa, era Lúcifer, enquanto Héspero virou Vésper.
Só muito tempo depois a Igreja Católica se apropriou do nome para relacioná-lo ao diabo, em sua estratégia de adaptação dos mitos antigos, o que é irônico. Dado o imaginário de hoje, Lúcifer é um nome muito mais adequado para Vênus do que o da deusa romana da beleza, mas divago.
Os soviéticos deram bastante atenção a Vênus por quase duas décadas. As missões Venera e Vega pousaram no planeta, mandaram imagens e estudaram a atmosfera com balões, enquanto que a NASA foi um pouquinho mais comedida, dadas as dificuldades. A missão Pioneer 12, lançada em 1978, entrou em órbita e enviou dados da atmosfera até 1992, para estudar a composição e causas do Efeito Estufa tresloucado que ocorreu lá.
Em 1989, a sonda espacial Magellan foi a primeira missão interplanetária lançada de um ônibus espacial e a 5ª e última enviada a Vênus pela NASA, com o objetivo de mapear a superfície do planeta. Ela funcionou até 1994, quando foi direcionada para uma entrada controlada na atmosfera.
Explorar Vênus in loco é extremamente complicado, dadas as condições do planeta. Todos os equipamentos precisam resistir a situações de pressão, corrosão, velocidade de ventos e temperaturas absolutamente insanas, algo muito diferente dos ambientes desprovidos de atmosfera como a Lua e Marte.
Tais equipamentos custam fortunas e levam muito tempo para ficarem prontos, e assim, é muito mais simples (técnica e financeiramente falando) enviar sondas orbitais, ou usar equipamentos que ficam nas camadas superiores da atmosfera.
E é essa abordagem que a NASA vai continuar usando, com os dois novos projetos aprovados para lançamento entre 2028 e 2030, a um custo total de US$ 1 bilhão, dividido igualmente. Assim como aconteceu com os módulos lunares, o Projeto Discovery selecionou propostas de terceiros, que receberão o aporte financeiro e terão que cumprir os objetivos definidos pela agência espacial.
A missão VERITAS (Venus Emissivity, Radio Science, InSAR, Topography, and Spectroscopy) consiste de uma sonda orbital equipada com um poderoso radar, a única forma de atravessar a atmosfera densa, tendo como objetivo principal mapear a topografia de Vênus, criando modelos 3D de todo o relevo para determinar por que o desenvolvimento geológico do planeta diferiu da Terra, mesmo ambos sendo tão próximos.
A VERITAS é em essência uma atualização da missão da Magellan, desta vez usando equipamentos muito mais potentes e precisos. A sonda também será capaz de identificar o tipo de solo e detectar emissões de infravermelho.
Representação artística do processo de entrada da sonda atmosférica DAVINCI+ em Vênus (Crédito: Divulgação/GFSC/NASA)
A missão DAVINCI+ (Deep Atmosphere Venus Investigation of Noble gases, Chemistry, and Imaging), por sua vez, é uma retomada da missão Pioneer Orbiter, visando estudar especificamente a atmosfera e as possíveis razões de por que um planeta, que até onde se sabe era bem parecido com a Terra 4 bilhões de anos atrás, desenvolveu um Efeito Estufa tão louco, e medir a possibilidade do mesmo ocorrer por aqui.
Os principais objetivos da missão são determinar a composição exata da atmosfera, quando ela se formou e descobrir se em algum momento, Vênus já teve algo parecido com os oceanos da Terra. A missão consiste de dois módulos, sendo um orbital, este responsável por determinar o passado do planeta e encontrar pistas sobre se os mares do planeta evaporaram por conta do Efeito Estufa, ou se nunca existiram em primeiro lugar.
O segundo módulo é uma sonda atmosférica, que fará uma entrada controlada na atmosfera para identificar seus elementos, inclusive mais pistas para a presença detectada de fosfinas, um composto diretamente ligado à presença de vida, mas que pode se formar de outras formas, como já foi identificado em Júpiter e Saturno.
O objetivo é descobrir por que fosfinas foram detectadas em Vênus, e SE há organismos microscópicos ou não suspensos na atmosfera os produzindo (provavelmente não).
As duas missões escolhidas já foram preteridas antes. Em 2017, ambas perderam para projetos destinados a estudar asteroides, as missões Lucy e Psyche, que serão lançadas em 2021 e 2022 respectivamente. Agora, venceram propostas de estudos da atividade vulcânica ininterrupta de Io, o satélite furioso de Júpiter, e do satélite natural Tritão, de Netuno, ainda elegíveis para seleções futuras.
Segundo a NASA, as missões VERITAS e DAVINCI+ deverão aproveitar a janela de lançamentos entre 2028 e 2030, mas ao menos a NASA está voltando para Vênus depois de tanto tempo. Atualmente, apenas a sonda japonesa Akatsuki ("alvorada"), lançada em 2010 e projetada para uma missão de apenas 2 anos, continua operacional e enviando dados, mas seu combustível está previsto para acabar ainda em 2021.
Fonte: NASA