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Em 50 anos Facebook virará The Walking Dead

5 anos atrás

Você já parou para se perguntar como os romanos limpavam o fiofó depois de ir ao banheiro? Papel ainda não havia sido inventado (na Europa), e ninguém usaria pergaminho para esse fim, Asterix impedia a invasão romana então a tecnologia de bidês também não estava disponível, mas mesmo assim havia um jeito.

Roma tinha centenas de banheiros públicos, e eram tão modernos que nem faziam segregação de gênero. Aliás eram realmente avançados, os romanos, ao contrário de 48.1% da população brasileira, tinham acesso a saneamento básico, as latrinas públicas tinham encanamento com água corrente para levar os dejetos para longe, mas isso não explica a questão primordial.

Por muito tempo ninguém fazia idéia de como  os romanos se limpavam. Sabia-se que era com um negócio chamado tersorium, mas era algo tão mundano que ninguém se deu ao trabalho de descrever, até que estudando os textos de Sêneca, intelectual romano do Século I, descobriu-se um trecho onde ele comenta sobre um gladiador germânico que se suicidou em um banheiro público, único lugar onde podia ir sozinho sem um guarda acompanhando.

O tal gladiador "pegou o bastão de madeira com uma esponja na ponta, dedicado aos usos mais vis e o introduziu na garganta", morrendo sufocado. Sêneca não só descreveu um final melhor do que o de Gladiador, como resolveu um mistério.

Os banheiros romanos tinham um espaço na frente do assento que aparentemente era acesso pro cidadão se limpar com a tal esponja, que era mantida em um balde com água salobra misturada com vinagre. No final uma empoada com uma lã de carneiro perfumada e o cidadão estava 0 km limpinho e cheiroso pronto pro passatempo favorito da Roma Antiga: Sodomia.

Ah sim, o tersorium era comunitário.

E que diabos isso tem a ver com o Facebook?

A questão, impaciente padawan, é que mesmo uma das sociedades antigas mais documentadas da História falhou completamente em preservar para a posteridade essa informação. E a História está cheia dessas omissões. Temos detalhes incríveis da vida romana, sabemos que acima do segundo andar as casas eram de madeira então eram proibidas de acender fogo para cozinhar, então muita gente comprava delivery, entregue em ânforas.

Sabemos que gladiadores ganhavam dinheiro com contratos de publicidade promovendo produtos e estabelecimentos. Uma cena de Gladiador, com personagens tomando chá numa cafeteria ao lado do Coliseu teve que ser cortada por parecer moderna demais, apesar de historicamente precisa (o termo "cafeteria" foi por minha conta)

Ao mesmo tempo no mesmo Gladiador, uma cena causou problema com os historiadores contratados pela produção: Quando os arqueiros estão acendendo suas flechas incendiárias em uma pequena vala de óleo incandescente os historiadores reclamaram que não havia referência para aquilo. A produção perguntou "ok então como eles acendiam as flechas?"

A resposta foi "ninguém sabe".

Essas pequenas coisas do dia-a-dia passam ao largo dos historiadores, afinal quem escreve sobre a Guerra do Peloponeso não vai perder tempo falando sobre como os soldados limpam a bunda. Já os soldados com certeza gastavam horas com piadas e histórias de caserna e de latrina.

E que latrina melhor que o Facebook? Ele guarda nossas histórias, nossos comentários, bilhões de observações do cotidiano que jamais iriam parar em um livro de História, mas que são um instantâneo de nosso tempo, de nossas vidas.

Etnicamente é complicado estudar pessoas vivas, e nem só porque elas se debatem muito. Já a vida de uma pessoa morta, bem, aí é História. E o Facebook está cheio de História, todo dia pessoas morrem e seus parentes não se preocupam em apagar suas contas. Muitas vezes elas são deixadas conscientemente no ar como um tributo ao falecido.

Esses dados estão se acumulando, o Facebook hoje tem 2.3 bilhões de usuários ativos, o que eu imagino desconsidere os mortos. Segundo projeções feitas por cientistas de dados, até 2100 1,4 bilhões de usuários terão morrido, e mantendo a projeção de crescimento atual, em 2070 o Facebook terá mais mortos do que vivos.

Não será a primeira vez, o MySpace provavelmente está na mesma situação.

Até o final do Século o Facebook poderá ter dados de toda uma vida de 4.9 bilhões de pessoas já falecidas. Isso será um paraíso para todo tipo de pesquisador, pense em quantas fotos, filmes, opiniões, testemunhos de eventos históricos podem ser extraídos.

Com os avanços em Big Data questões bem mais genéricas poderão ser respondidas com base em dados, nunca mais teremos um tersorium, as pessoas terão postado milhões de fotos das suas atividades mais mundanas, e a porta do banheiro não é mais limite pra essa exposição ilimitada e voluntária de nossa intimidade.

Historiadores poderão vasculhar décadas de posts, sentir o pulso da população, comparando com informações oficiais e da imprensa.

Claro, entra a velha discussão se o Facebook tem direito de vender as informações de seus usuários mortos, se isso é mórbido ou não, e se esses dados serão anonimizados antes de mandados pros pesquisadores, mas essa questão, sendo honesto, já foi respondida, vide isto aqui:

Isso é uma carta, uma correspondência particular de um recruta egípcio chamado Aurelius Polion. Ele era parte de uma legião Romana estacionada no que seria hoje Budapeste. No texto ele reclama com a família, dizendo que já mandou seis cartas e ninguém respondeu, e que iria pedir licença ao Comando para ir até o Egito ver se estava todo mundo bem.

É uma peça histórica, tem 1800 anos e ninguém está preocupado em respeitar a privacidade de Aurelius ou de mais ninguém mencionado na carta. Então por quê diabos é tão mais importante respeitar as privacidades de seus memes daqui a 100 ou 200 anos?

 

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