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Operadoras brasileiras imitam a FCC e querem acabar com a neutralidade da rede

Finja surpresa: operadoras brasileiras aguardam resolução da FCC para forçar uma modificação no Marco Civil da Internet, de modo a acabar com a neutralidade da rede no país.

6 anos atrás

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O que, você realmente pensou que a articulação ocorrendo nos Estados Unidos não se refletiria aqui? Segundo reportagem da Folha de São Paulo, as operadoras brasileiras estão preparando uma investida agressiva junto ao governo para forçar uma modificação no Marco Civil da Internet, de modo a acabar com a neutralidade da rede no país tão logo a mesma seja derrubada pela FCC (Federal Communications Commission), o que pode ocorrer na próxima semana.

Desde que foi aprovada na forma da Lei Federal Nº 12.965/2014, sendo posteriormente regulamentado pela então presidente Dilma Rousseff através do Decreto Nº 8.771/2016 o Marco Civil estabelece regras claras sobre a isonomia da internet no país, e um dos pontos mais críticos trata sobre a neutralidade da rede. Ela determina que as operadoras não podem diferenciar o tráfego dos usuários independente do uso, nem oferecer melhores condições de navegação a quem pode pagar mais. Dessa forma, tanto empresas grandes e estatais têm os mesmo direitos de acesso e transmissão de dados e o usuário final não pode ser vilipendiado, ou forçado a adquirir pacotes específicos com acesso a determinados sites, produtos e serviços.

O texto, que foi elogiado por diversas entidades internacionais é semelhante às regras assinadas em 2015 pelo então presidente dos EUA Barack Obama, de forma a uniformizar o acesso e garantir que todos, sem exceção tenham acesso igualitário à internet sem limites ou restrições. No entanto, o então conselheiro da FCC Ajit Pai se manifestou desde o início contra a regulamentação e hoje, na posição de diretor do órgão já deixou claro que irá enterrar a regulação no dia 14 de dezembro. Sob seu entendimento a neutralidade da rede “foi um erro, pois ela é prejudicial ao livre mercado e freia a competitividade e inovação”.

Assim sendo, a ideia da FCC que é obviamente apoiada por todas as operadoras dos EUA é permitir que quem tem mais dinheiro (obviamente grandes companhias) possa fazer uso de mais e melhores conexões, ao mesmo que tempo que libera a administração da internet para as operadoras tratarem os demais usuários como quiserem; a ideia é deixar a FTC (Federal Trade Commission) cuidar da parte da proteção ao consumidor, entretanto a AT&T está tentando impedir o órgão de vigiar as operadoras no país.

Caso ganhe, o que não é difícil os usuários finais, startups e pequenas empresas se verão presos a conexões mais lentas, traffic shaping e bloqueio de serviços e sites a menos que paguem mais, entre outras mumunhas e mesmo em caso de derrota essa não é a competência da FTC. É como colocar a Anvisa para cuidar da investigação de homicídios.

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Pois bem: como muito provavelmente as regras para a neutralidade da rede serão inevitavelmente revertidas nos EUA, as operadoras daqui se preparam para fazer o mesmo. Tão logo o parecer positivo à FCC saia o grupo planeja pressionar agressivamente o governo em rodadas de visitas ao presidente Michel Temer, à Câmara dos Deputados, ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e à Anatel de modo a implementar uma modificação no Marco Civil, efetivamente exterminando as regras de neutralidade da rede no país e permitir que as empresas tenham autonomia sobre como controlar a internet, também oferecendo melhores condições para quem pode pagar mais.

Caso o governo brasileiro acate a ideia, o que julgo muito provável de acontecer operadoras poderão oferecer pacotes de serviços, apps e sites com diferentes preços de acordo com o que ela estiver disposta a promover (ou for paga para fazê-lo) e bloquear o que não tiver dinheiro ou for contrário a seus interesses como sites de torrents e de organizações pró-neutralidade (como o EFF por exemplo), ao contrário de hoje onde o acesso é democrático. Um bom exemplo é a prática do do zero-rating: sites e apps oferecem navegação gratuita, sem descontar consumo de dados e que foi regulamentado no Brasil após uma emenda no Marco Civil (nos últimos anos ele foi tão alterado que hoje se assemelha mais a um queijo suíço); o plano só pode ser bancado por grandes companhias que podem arcar com a navegação gratuita e é uma tramoia da grossa, disfarçada de benefício que prejudica startups e induz o usuário a fazer uso sempre dos mesmos produtos. Com o fim da neutralidade da rede essa seria a regra.

O argumento oficial das operadoras nacionais é de que a modificação no Marco Civil visa priorizar o tráfego para a Internet das Coisas em aplicações críticas, desde controle de tráfego a uso no setor médico, só que isso é uma mentira descarada: o serviço compartilhado, de uso do usuário final não foi feito para tal fim e para isso existem links dedicados, que já são priorizados pelas operadoras e controlados pelo governo de forma a garantir a manutenção da rede, caso contrário as multas a serem pagas são bem pesadas.

Nos EUA uma série de companhias se posicionaram contra a decisão da FCC de reverter a neutralidade da rede, entre elas Google, TwitterFacebook, Netflix, Etsy e várias outras e embora tenham tentado adiar a votação da FCC, Ajit Pai não só manteve a data como disse que “os opositores estão desesperados”; já no Brasil é bem provável que companhias e organizações se manifestem em prol da manutenção do Marco Civil da Internet da maneira que ele é hoje, mas a verdade é que o cenário não é muito favorável.

Fonte: Folha.

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