Carlos Cardoso 5 anos atrás
Um fenômeno interessante da corrida espacial é que a gente acha que a NASA constrói um monte de foguetes, mas em verdade a NASA não constrói nada, ela especifica e empresas cuidam da parte de engenharia. Demorou pra esse ciclo ser quebrado, era apenas caro demais e lucrativo de menos para as empresas desenvolverem foguetes por conta própria, por isso a imagem (real) de que programas espaciais eram coisa de governos.
No Japão por exemplo a Agência Espacial deles, a JAXA, usa primariamente o H-IIA, um foguete desenvolvido pela Mitsubishi sob encomenda. Até hoje não havia nenhuma empresa privada investindo diretamente em exploração espacial, isso mudou com a chegada da ambiciosamente batizada Interstellar Technologies.
Embora existisse como grupo de hobbystas desde os anos 90, a empresa foi formalmente criada em 2005 por Takafumi Horie, investidor e figura pop no Japão, dono do Livedoor, um grande provedor de internet que virou portal.
Infelizmente Takafumi-san foi preso em 2006 por fraude de seguros e suspeitas de lavagem de dinheiro para a Yakuza, mas antes apresentou seus planos, que envolviam desenvolver um lançador de pequenos satélites, baratear custos e eventualmente até trabalhar com turismo espacial.
Apesar das aventuras pitorescas do fundador, a Interstellar Technologies conseguiu desenvolver um primeiro foguete muito enxutinho, o MOMO.
Usando oxigênio líquido e etanol, o MOMO tem 10 metros de comprimento, pesa uma tonelada no total e consegue levar cargas pequenas de até 20 kg a uma altitude de 100 km, o que tecnicamente é espaço. Ele permite que experimentos sejam feitos em microgravidade por até 4 minutos (fonte: manual do bicho).
A grande diferença é que ele é muito barato, custa US$ 441 mil, o que é ¼ do custo de um foguete equivalente usado pela JAXA.
O primeiro lançamento do MOMO tecnicamente deu certo, ao menos nos primeiros 20 km, mas ele perdeu contato com a base e por segurança se autodesligou.
Isso foi em 30/7/2017, a empresa então perdeu todos os cientistas e ficou 20 anos sem lança… — ah não essa é outra agência. Os caras voltaram pra prancheta, e quase exatamente um ano depois tentaram de novo, com resultados bem mais espetaculares.
O MOMO-2 foi lançado 30/6/2018 mas aparentemente a câmara de combustão ou a bomba de combustível não resistiu à pressão e, bem, ele desceu tão rápido quanto subiu:
É desanimador, mas o lema da exploração espacial, Ad Astra Per Aspera significa “para as estrelas, apesar das adversidades” e não “vai na fé champs é facinho meu nego não tem como errar”. Von Braun errou, Korolev errou, todo mundo errou no começo.
Um dos melhores erros foi o Mercury-Redstone 6, um lançamento absolutamente ridículo, que resultou em um vôo de 10 cm.
A própria SpaceX penou para acertar as pontas. O Falcon 1 foi testado entre 2006 e 2009, foram quatro lançamentos, os três primeiros mal-sucedidos. Elon Musk conta que o dinheiro estava no fim, eles só tinham grana para mais um lançamento.
Se o quarto não tivesse sido bem-sucedido, não haveria SpaceX hoje em dia.
No final o Falcon 1 foi uma plataforma de aprendizado, fez mais um lançamento, o único com uma carga comercial, e foi aposentado dando espaço para o Falcon 9.
Por isso podem ficar tranquilos, enquanto houver dinheiro o MOMO seguirá em frente, não duvidaria nada se no próximo lançamento ele já não faça um vôo perfeito. Aliás, eu ESPERO, afinal o mundo precisa de foguetes com rostos de zangado.
De resto, o pessoal posando com o MOMO-2 após sua michaeljacksonização inversa não parece muito preocupado com o futuro do projeto.