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NASA: diretor confia na SpaceX porque "quem manda não é Elon Musk"

Diretor Bill Nelson diz que não confia em Elon Musk, e agradece por ser Gwynne Shotwell quem comanda a SpaceX, o que deixa a NASA tranquila

08/05/2024 às 13:50

Não é segredo que Elon Musk tem uma porção de desafetos, muitos deles conquistados por sua boca grande e seu gênio imprevisível. Os mais notórios estão entre os membros do governo dos Estados Unidos, como a totalidade do Congresso (Senado e Representantes), em um dos poucos assuntos em que há consenso bipartidário, por sua SpaceX incomodar o método até então tradicional de explorar o Espaço.

Bill Nelson, diretor da NASA, também não vai com a cara de Musk, tanto que mesmo antes de assumir a agência, quando ainda era senador (DEM/Flórida), ele liderou a oposição na concessão de contratos de lançamentos à companhia, exclusivamente pelo "comportamento volátil" do executivo, que poderia ser prejudicial ao governo.

O perfil de profissional pé-no-chão de Gwynne Shotwell é muito mais amigável à NASA, do que o gênio imprevisível de Elon Musk (Crédito: Divulgação/SpaceX)

O perfil de profissional pé-no-chão de Gwynne Shotwell é muito mais amigável à NASA, do que o gênio imprevisível de Elon Musk (Crédito: Divulgação/SpaceX)

Com o tempo, Nelson e a NASA passaram a trabalhar em parceria com a SpaceX, com o diretor elogiando seus feitos, mas não por causa de Musk, em quem ele continua não confiando para nada. Na verdade, o diretor da agência é muito grato que o comando da companhia está nas mãos da presidente Gwynne Shotwell, de quem ele não tem ressalvas a fazer.

Diretor da NASA temia que caos no X afetasse a SpaceX

Em entrevista recente à rede de rádio pública NPR, Bill Nelson falou sobre uma série de tópicos, especialmente as ambições dos EUA em retornar à Lua em uma missão tripulada, na missão Artemis, até o fim da década, enquanto a China prometeu recentemente o mesmo, o que está se desenhando como uma Segunda Corrida Espacial, e outra vez ianques vs. comunistas, o que chega a ser irônico.

Em um ponto da entrevista, porém, o diretor da NASA foi questionado se não o preocupava a SpaceX ficar responsável por grande parte da missão, na forma da Starship, enquanto a Boeing responderá pelo foguete SLS e a cápsula Orion. O ponto abordado, sem muita surpresa, tem nome e sobrenome: Elon Musk.

O entrevistador apontou o crescente escrutínio em que duas outras empresas de Musk, a Tesla Motors e o X, vem recebendo das autoridades em diversos níveis, e em várias regiões do globo, principalmente pelo seu "envolvimento com guerras políticas e culturais", desde as declarações desastrosas sobre ações da Tesla, o que lhe custou o cargo de presidente e a cadeira no conselho, a mandar anunciantes do X se f#&%#em, e mais recentemente, comprar briga com o ministro do STF Alexandre de Moraes, o que lhe rendeu a inclusão de seu nome no inquérito das Fake News.

Bem, Nelson foi curto e grosso:

"Elon Musk... para ser sincero, uma das decisões mais importantes que ele já tomou, foi ter nomeado Gwynne Shotwell como presidente. Ela manda na SpaceX. Ela é excelente. Sobre isso, não tenho ressalvas."

Em verdade, esta nem foi a primeira vez em que Nelson expressou seu desdém por Musk, mais especificamente, o temor de que seu histórico de decisões impulsiva (e quase sempre desastrosas) pudessem causar danos ao trabalho da SpaceX, mesmo quando a companhia aeroespacial não estava diretamente envolvida nas presepadas do executivo.

No fim de 2022, poucos meses depois de Musk comprar o Twitter, ele renomeou a rede social para o nome atual, X, o que imediatamente disparou todos os alarmes na cabeça do diretor da NASA. Seu temor era de que o caos instaurado na outra companhia, e a associação com o novo nome, trouxessem problemas para a divisão de foguetes reutilizáveis, mesmo com ambos empreendimentos sendo completamente separados.

Na época, conforme relatado à NBC News, Nelson se encontrou com Shotwell, e foi direto:

"Me diga que essa distração em que o Elon se meteu com o Twitter não irá afetar a SpaceX."

Shotwell teria respondido que "não havia com o que se preocupar", e que nada que acontecia no Twitter/X afetaria a SpaceX. Nelson então completou:

"Eu a abracei com um sorriso, porque eu sei que é ela quem manda. É ela quem manda na SpaceX."

Fato: absolutamente ninguém no governo dos EUA, dos membros do Congresso ao diretor da NASA, vão com a cara de Elon Musk (Crédito: Divulgação/SpaceX)

Fato: absolutamente ninguém no governo dos EUA, dos membros do Congresso ao diretor da NASA, vão com a cara de Elon Musk (Crédito: Divulgação/SpaceX)

A grande verdade é que, talvez por pressão política, Musk tem zero influência no administrativo da SpaceX, no que todas as operações são concentradas na mão de Gwynne Shotwell. Engenheira mecânica formada na Universidade Northwestern de Illinois, ela começou sua carreira profissional na Chrysler, antes de mudar para o ramo aeroespacial, primeiro na The Aeroespace Corporation, depois na Microcosm, onde chegou ao cargo de diretora.

Shotwell foi uma das primeiras funcionárias da SpaceX, e está na companhia praticamente desde sua fundação, em 2002. Ela foi promovida ao cargo de presidente em 2008, principalmente por conduzir com sucesso o primeiro contrato da empresa com a NASA, as primeiras missões das cápsulas Dragon no Programa de Serviços de Reabastecimento Comercial (Commercial Resupply Services).

Foi exatamente nessa época em que Bill Nelson, ainda senador, liderou a bancada da oposição à entrada da SpaceX no páreo, exclusivamente devido a Elon Musk, que na época já era muito mal-visto no Congresso, basicamente como "o bilionário que chegou agora e quer sentar na janela".

Vale lembrar que, caso a Boeing não tivesse entrado no Programa de Tripulações Comerciais com sua cápsula Starliner, o projeto todo teria ido para o ralo, pois ninguém no Congresso vai com a cara de Musk, e não fechariam apenas com a Dragon, na época a única concorrente.

Claro, Elon Musk ainda tem bastante poder de influência na companhia, e consegue ter sua visão impressa em decisões técnicas, como quando aumentou a meta máxima de voos dos boosters Falcon para 42, por pura nerdice. No entanto, tudo o que diz respeito à administração da SpaceX é tocado exclusivamente por Shotwell, e aqui, a única função de Musk, mesmo sendo o CEO, é assinar os cheques.

O desprezo notório de Nelson por Musk é outro lembrete de que a classe política dos EUA odeia o executivo, especialmente por não poder usar os foguetes da empresa como plataforma política, da mesma forma que o faz com o SLS. O contrato mantido com a NASA dá à SpaceX flexibilidade de como e onde construir os foguetes e módulos, no que sua única obrigação é atender todas as especificações e exigências da agência espacial. E não só Musk entrega, toda vez, como ele não faz lobby.

O SLS, por sua vez, é gerido pelo Congresso, que determina em que estado cada parte será construída, no que senadores e representantes buscam puxar a sardinha para seus currais eleitorais, afinal, geração de empregos se converte em votos.

Para Bill Nelson, diretor da NASA, conquistas da SpaceX são 100% mérito de Shotwell (Crédito: Al Drago/Reuters)

Para Bill Nelson, diretor da NASA, conquistas da SpaceX são 100% mérito de Shotwell (Crédito: Al Drago/Reuters)

No passado, Nelson elogiou a SpaceX, lembrando que ela foi duramente criticada no início dos programas de carga e tripulação comerciais, por "não ser uma companhia legada" como a Boeing (sendo justo, ele próprio era um dos críticos), e reconheceu que, enquanto as cápsulas Dragon já tinham mais do que provado seu valor, a Starliner continuava no chão. E ainda continua.

A verdade é que, no entendimento do diretor da NASA, o méroto de bons resultados da SpaceX se deve unicamente a Gwynne Shotwell, não só por ser uma profissional pé-no-chão e extremamente competente, mas também por agir como uma barreira contra os devaneios ególatras de Elon Musk.

Há quem diga que Nelson estaria provocando o executivo para ele fazer alguma besteira, como dar o tratamento Linda Yaccarino à presidente da SpaceX, mas mesmo Musk não seria tão idiota, apenas para demonstrar ser ele quem manda.

Ou seria?

Fonte: NPR

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