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Por que HP bloqueia cartuchos de tinta de terceiros? "Vírus"

Enrique Lores, CEO da HP, dá desculpa inacreditável para justificar o bloqueio de cartuchos de tinta de terceiros em suas impressoras

24/01/2024 às 9:52

Tão pontual quanto um relógio, a HP libera, todos os anos, uma atualização via OTA chamada "Segurança Dinâmica", a todas as suas impressoras conectadas na internet, sempre na época da volta às aulas. Sua função, bloquear o funcionamento do equipamento, caso ele detecte a presença de cartuchos de tinta de outros fabricantes, por estes não terem chips de identificação compatíveis.

A prática, iniciada em 2016 e repetida religiosamente todos os anos (a edição 2024 deve chegar em março, nos Estados Unidos), rendeu à companhia diversos processos, mas para o CEO Enrique Lores, a Segurança Dinâmica é necessária porque (não ria!) "cartuchos de terceiros contêm vírus". E eu não estou inventando isso!

E lá vamos nós... (Crédito: Divulgação/HP)

E lá vamos nós... (Crédito: Divulgação/HP)

A declaração estapafúrdia do executivo-chefe da HP foi dada na última quinta-feira (18), em uma entrevista dada à rede CNBC, sobre os recentes desdobramentos legais a respeito do processos movidos contra a companhia, e outros procedimentos mesquinhos, como bloquear o funcionamento de todos os recursos de uma multifuncional, mesmo escaneamento e cópia de fotos e documentos, se o equipamento estiver sem tinta, que não é usada nesses procedimentos.

A HP enfrenta uma ação coletiva, aberta em 2022, sobre o bloqueio das multifuncionais sem tinta, e em janeiro de 2024, se tornou alvo de mais um processo, desta vez devido à Segurança Dinâmica. Segundo a acusação (cuidado, PDF), a empresa usa da estratégia para "criar um monopólio" de substituição de cartuchos em seus equipamentos, para que estes aceitem apenas os que ela mesmo fabrica, removendo da equação soluções compatíveis de terceiros; vale lembrar que, graças a uma decisão anterior, cartuchos de tinta não são patenteáveis.

A ação diz que a HP convenientemente oculta dos clientes, por trás da insistência para que os donos das impressoras registrem seus equipamentos junto ao site oficial, e os mantenham conectados à internet para receberem "atualizações de segurança" assim que forem lançadas, seu verdadeiro objetivo, subir updates que comprometem o funcionamento das mesmas, no que a empresa não pode simplesmente dizer quais cartuchos podem ser usados, e quais não podem.

Vale lembrar que a companhia sempre libera a atualização de Segurança Dinâmica no período de volta às aulas, quando os pais abastecem as impressoras com tinta para que seus filhos usem, na impressão de trabalhos escolares. É nesse momento que muitos descobrem, para completo desgosto, que a tinta de terceiros que comprou e que funcionava até ontem, passou a emperrar a impressora ou multifuncional, porque o equipamento não mais a reconhece, e já falamos várias vezes que tinta de impressora está entre os líquidos mais caros do planeta.

Internamente a HP tem orgulho de suas práticas, a companhia tem histórico de ser uma das mais funestas do Vale do Silício, portanto, não surpreende Enrique Lores sacar uma explicação das mais esquisitas, que mais parece um plano de vilão dos filmes do 007, para justificar a existência da Segurança Dinâmica, que a empresa defende com unhas e dentes, mesmo nos tribunais (pule para 3:30):

Lopez afirma, baseado em um artigo de uma companhia de segurança (uma pesquisa bancada pela HP, aliás), que vulnerabilidades foram encontradas em chips de identificação presentes em cartuchos de tinta de terceiros, no que eles poderiam ser contaminados com malwares; uma vez conectado a uma impressora, ele passaria do cartucho para o equipamento, dele para o PC, e daí se propagaria por outros equipamentos em rede (intranet).

Shivaun Albright, tecnólogo-chefe do setor de Segurança de Impressão da HP, afirma que a vulnerabilidade permite que o vírus (como Lores diz), ou malware, permaneça no buffer de memória da impressora ou multifuncional, podendo infectar outros equipamentos sempre quando conectada.

A HP admite que nunca detectou um caso de infecção de cartuchos de terceiros no mundo real, e boa parte dos profissionais de segurança independentes, consultados pelo editor-chefe do site Ars Technica Dan Goodin, dizem ser este mais um caso de uma companhia usando o FUD (Medo, Incerteza e Dúvida) em benefício próprio; no caso, fazer com que donos de impressoras da HP sempre comprem tinta na sua mão.

HP, PIs e Impressão como Serviço

Por mais que isso pareça uma preocupação da HP com a segurança de seus usuários, a real motivação é outra. Antes da explicação fantástica de Lores, ele entregou o real motivo que o leva a bloquear cartuchos de terceiros em seus equipamentos:

"Proteger nossa propriedade intelectual (PI) é crucial. Há diversas PIs nossas nos cartuchos de tinta e nas nossas impressoras... e ao fazer isso, quando identificamos cartuchos que violam nossas PIs, nós (a HP) bloqueamos o funcionamento da impressora."

Um dos argumentos a favor da existência da Segurança Dinâmica, usado desde 2016, é o da "melhor experiência de uso" provida por ela, ao prezar pelo uso de suprimentos oficiais, ao mesmo tempo que "protege nossas (da HP) PIs", contra a "violação" representada por cartuchos de terceiros.

Lores defende que cartuchos não-HP podem "causar todo o tipo de problemas", mas a bem da verdade, a companhia não quem nem que o usuário compre as tintas na loja; para isso existe o programa de assinatura Instant Ink, em que usuário assina um plano e recebe uma quantidade determinada de suprimentos, dependendo do valor pago.

Em dezembro de 2023, a CFO Marie Myers disse que o programa representa uma grande oportunidade de aumento na receita, ao "amarrar o usuário" com o suprimento direto; de fato, o plano da HP a longo prazo é migrar totalmente para o modelo de PaaS, ou Impressão como um Serviço, onde a tinta oficial só poderá ser adquirida através do Instank Ink.

Lores explicou na entrevista que, para a HP, todo cliente que compra uma de suas impressoras, é um investimento que a companhia faz, logo, se ele não consome suprimentos providos por ela (de preferência, pelo Instant Ink), ele se torna "um investimento ruim". A relação ideal, para a empresa, é de dependência total dos consumidores, enquanto estes vão procurar pelos preços mais justos de tinta, geralmente, providas por terceiros. Assim, a Segurança Dinâmica estaria justificada, e é por isso que a HP continuará defendendo a prática.

Claro que não há santos nesse mercado, Epson e Lexmark se comportam de forma parecida, o que levou muita gente a migrar para outras marcas, como os modelos a laser da Brother, bem menos predatória.

Fonte: Ars Technica

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