Gold Masters Series e os documentários interativos

Uma das piores coisas que podemos fazer quando se trata de um jogo, é criar expectativa. Com isso, a chance de nos decepcionarmos se torna muito grande, mas quando aquilo que imaginamos se mostra ainda melhor, é como derrotar um chefe aparentemente insuperável, salvar aquele personagem que tanto gostamos ou quebrar um recorde que perseguimos por muito tempo. Hoje posso dizer: o primeiro capítulo do Gold Masters Series teve esse impacto em mim.

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Idealizado pela Digital Eclipse, o Gold Masters Series é um documentário interativo que tem como objetivo resgatar um pouco da história dos videogames. Produzida de maneira independente, a série pretende “celebrar os principais designers, estúdios e jogos que mudaram o mundo,” como explica a desenvolvedora.

E para a estreia do projeto, eles escolheram um dos jogos mais influentes da história, o Karateka. Quando soube da existência do The Making of Karateka, falei por aqui sobre o quanto estava ansioso para experimentá-lo e após o fazer, pude comprovar o quão brilhante foi sua execução.

Além de nos dar acesso ao jogo original lançado para o Apple II, o título ainda nos oferece conversões para outros sistemas, como o Commodore 64 e Atari 8-bit, e até a uma remake, que além de reimaginar os gráficos e a trilha sonora, também traz mudanças na jogabilidade.

Ter a oportunidade de revisitar aquele clássico foi excelente, mas o meu maior interesse neste lançamento estava mesmo no documentário interativo que ele prometia entregar. Contando a história da criação do jogo, The Making of Karateka está a todo momento transpirando a admiração que o pessoal da Digital Eclipse tem pelo trabalho de Jordan Mechner e talvez até mais importante do que isso, estabelece um novo patamar quando se trata de abordar o passado dos jogos.

Após passar algum tempo nesse documentário, a sensação é de que os outros que se dispuseram a contar o processo de criação de algum título ficaram devendo algo, que foram até preguiçosos. Pois esse sentimento se explica com uma palavra: interatividade.

Sim, com a principal características dos videogames sendo sua capacidade de nos colocar no controle das ações, seria natural que qualquer documentário nos permitisse interagir com as informações que nos são passadas e é justamente aí que Gold Masters Series se destaca. Seja ao nos permitir avançar por uma linha do tempo, seja ouvindo comentários do game designer enquanto jogamos sua criação ou até mesmo assistindo um gameplay e podendo assumir o controle do personagem quando quisermos, caberá ao jogador/espectador escolher como consumir aquele material.

Ainda não temos como saber se a ideia implementada pelo Digital Eclipse será copiada por outros estúdios, mas eles esperam lançar mais capítulos e material para isso não deverá faltar.

“A história que estamos contando nos levará a qual será o próximo título ou qual será o foco de tudo,” explicou o Diretor Editorial, Chris Kohler. “É um jogo, uma série de jogos, uma franquia, uma pessoa ou até mesmo... uma história? E se pudéssemos licenciar múltiplos jogos de múltiplas franquias e editoras, e usá-los para contar a história da evolução de um gênero?”

Para Kohler, ao contrário do que acontece com coletâneas de jogos antigos, o formato de documentário interativo da Gold Masters Series os permite apostar em títulos desconhecidos ou que até foram cancelados. O importante é que a história que eles abordarão seja interessante.

Contudo, além do estúdio ter que conseguir os direitos autoriais para poder contar essas histórias, eles ainda terão que lidar com um problema até maior: reunir o material necessário para criar esses documentários. No caso do Karateka os envolvidos não precisaram enfrentar isso, já que Jordan Mechner fez um ótimo trabalho ao guardar diários e documentos de produção.

“Os videogames ainda são considerados descartáveis,” lamentou o diretor. “Acho que estamos mudando de ideia sobre isso, mas é muito incomum alguém documentar o que fez e a maneira como fez aquilo. Porém, existem outros jogos que possuem esse nível de documentação. Portanto, é apenas uma questão de podermos colocar as mãos nesse material?”

Outro aspecto importante de um documentário como esse é a maneira como ele mostra às pessoas o quão complicado costuma ser a criação de um jogo. Embora hoje exista muito mais tecnologia envolvida, os conflitos da época em que o Karateka foi criado não são muito diferentes daqueles vistos hoje em dia.

“Espero que isso abra os olhos das pessoas para muitas compensações, negociações, compromissos e coisas que precisam acontecer nos bastidores do desenvolvimento de jogos,” declarou Kohler. “Quero dizer, fundamentalmente, é um produto de entretenimento, mas se eu puder ajudar as pessoas a entenderem os bastidores da criação de videogames, acho que isso também seria incrível.”

Por enquanto não sabemos qual será o tema do próximo Gold Masters Series, mas como esse segundo capítulo estava sendo feito paralelamente ao The Making of Karateka, não deverá demorar muito para ele ser lançado. Se tudo correr bem, ainda em 2023 teremos a oportunidade de conhecer mais uma história fascinante e se o Digital Eclipse conseguir repetir a dose, teremos mais um documentário obrigatório para qualquer pessoa que ame os games.

Sei que isso soará quase utópico, mas eu adoraria que o estúdio pudesse dedicar uma ou mais equipes apenas para esse tipo de material, com novos documentários interativos sendo lançados constantemente. A história dos videogames precisa ser contada e consequentemente preservada, e projetos assim podem ser uma excelente maneira de fazer isso.

Por tudo isso, só posso desejar vida longa à Digital Eclipse, vida longa aos documentários e vida longa aos videogames, que graças a Gold Masters Series, mostraram que a mídia pode ser também uma ótima plataforma para o compartilhamento de conhecimento.