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Pesquisadores criam transístor feito de... madeira

Transístor de madeira não vai resolver o problema do limite de silício, mas pode ser opção biodegradável para soluções menos exigentes

45 semanas atrás

Um grupo de pesquisadores da Suécia conseguiu algo que parece saído de uma história em quadrinhos: eles desenvolveram um transístor, o componente semicondutor básico para todos os dispositivos eletrônicos do planeta, feito de madeira. E sim, ele é completamente funcional.

A novidade pode abrir caminho para um desenvolvimento mais sustentável para a eletrônica, computação, infraestrutura e o que mais você imaginar, mas há uma série de caveats que precisamos considerar.

Sim, isto é um transístor (Crédito: Thor Bakhed/Linköping University)

Sim, isto é um transístor (Crédito: Thor Bakhed/Linköping University)

O transístor é uma das mais importantes invenções do século XX, e muita gente séria coloca ele no topo da lista (eu também, mas não me enquadro no quesito "gente séria"). Ele é um componente que possui duas funções principais, barrar a passagem de uma corrente elétrica, ou amplificá-la. Na condição de amplificador, ele produz uma saída de maior intensidade, algo facilmente exemplificado por um microfone, ligado a um sistema de som.

Já como interruptor, um transístor é usado para determinar quando, e quantas vezes, uma corrente pode passar por um circuito. Aliados a resistores e capacitores, transístores são os alicercer para implementar lógica booleana em eletrônica, convertendo sinais analógicos em condicionais, ou simplificando, matemática binária.

Os transístores se tornaram a pedra angular da computação moderna, ao substituir as enormes e menos eficientes válvulas termiônicas. Todo dispositivo eletrônico usa os conceitos estabelecidos por Julius Edgar Lilienfeld em 1926, mas demonstrados pela primeira vez em 1947.

Um transístor usa material semicondutor (óbvio), os mais usados são silício e germânio, mas outros também podem ser empregados; desnecessário dizer que o grosso da produção de semicondutores e transístores se encontra hoje na Ásia, principalmente China e Taiwan, e o colapso na cadeia de suprimentos, causado pela pandemia da Covid, afetou todo o mercado consumidor, industrial, de infra, etc. do planeta.

Há também uma série de questões sobre a extração desses e outros minerais raros da Natureza, que em muitos lugares, violam direitos humanos básicos (como as minas de cobalto no Congo, material usado nas baterias de lítio), levando pesquisadores a tentarem a sorte com outras abordagens, algumas curiosas.

Réplica do primeiro transístor funcional, desenvolvido por John Bardeen e Walter Brattain na Bell Labs em 1947 (Crédito: Executive Office of the President of the United States/domínio público)

Réplica do primeiro transístor funcional, desenvolvido por John Bardeen e Walter Brattain na Bell Labs em 1947 (Crédito: Executive Office of the President of the United States/domínio público)

O que nos traz à pesquisa de um grupo de cientistas suecos misto, da Universidade de Linköping e do Instituto Real de Tecnologia (KTH). O artigo descreve o transístor "orgânico" usando madeira da árvore conhecida como pau-de-balsa (Ochroma pyramidale), nativa das Américas, ocorrendo do norte da América do Sul até o México. Ela é geralmente empregada na produção de balsas (daí o nome) e aeromodelos, mas também foi usada na construção de aviões de combate, como o DH.98 Mosquito.

Transístor ecológico

A madeira do pau-de-balsa é considerada a mais leve e menos densa registrada, devido a sua organização. Suas fibras de celulose se assemelham a "favos", estes preenchidos com lignina, uma macromolécula que confere rigidez às plantas, que foi removida, deixando os espaços vazios.

A seguir, os "favos" foram preenchidos com um polímero plástico chamado poli(3,4-etilenodioxitiofeno), ou PEDOT:PSS, que possui capacidades condutivas. O conjunto então foi devidamente montado, resultando em um componente semicondutor a base de madeira.

Nos testes, os cientistas constataram que a passagem da corrente elétrica pelo transístor se dá sem que o componente se deteriore; experimentos anteriores não deram certo, porque os modelos só permitiam o transporte de íons, mas quanto estes acabavam, o semicondutor também deixava de funcionar.

Diagrama do transístor de madeira (Crédito: Linköping University/PNAS)

Diagrama do transístor de madeira (Crédito: Linköping University/PNAS)

Embora um certo burburinho tenha se formado em torno da pesquisa, levantando a hipótese de usar transístores de madeira para habilitar controles eletrônicos em plantas, ou usar o método para substituir o silício, é preciso ir com calma. O transístor da pesquisa mede 3 cm de comprimento, e os usados na computação moderna são medidos em nanômetros, onde 1 nm = 0,000000001 m, ou 1 bilionésimo de metro.

Um processador moderno, com bilhões de transístores, caso usasse o de madeira da pesquisa, teria uma área de muitos km2, o que penso eu, acabaria com o conceito de portabilidade. Sem contar que a frequência que ele é capaz de regular foi de... 1 Hz. Nada de GHz ou MHz, nem mesmo KHz. Um mísero hertz. Acho, só acho, que ele não rodaria Crysis.

A busca por soluções eficientes para resolver o problema do limite teórico do silício virou uma corrida armamentista, com pesquisadores hoje apostando no grafeno, ou em outras abordagens de materiais já estabelecidos. O experimento com madeira não é nem de longe pensado para esse cenário, e os pesquisadores admitiram terem sido movidos pelo Espírito Hacker, apenas para saber se podia ser feito.

Por outro lado, a pesquisa levanta a possibilidade de uso da técnica em aplicações mais limitadas e menos exigentes, tanto em poder computacional, quanto em eficiência energética, com o Bônus de ser ecologicamente correta.

Referências bibliográficas

TRAN, V. C., MASTANTUONI, G.G., ZABIHIPOUR, M. et al. Electrical current modulation in wood electrochemical transistor. PNAS, Volume 120, Edição 18, 7 páginas, 24 de abril de 2023. Disponível aqui.

Fonte: Linköping University

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