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A primeira Unidade Processadora de Aleatoriedade Quântica

A Física Quântica tem muitas utilidades. Uma das mais importantes é gerar números realmente aleatórios

1 ano atrás

Sim, incrivelmente aconteceu, o termo “Quântica” usado em um produto real, que não envolve colchões, pomadas ou braceletes. Dessa vez é real, e espetacular.

O tal QRNG (Crédito: Quside)

O dispositivo, lançado pela Quside (quieta, 5ª Série) é um gerador de números aleatórios, algo que segundo o GPTChat é extremamente simples:

import random
# gera um inteiro aleatório entre 1 e 1 milhão
random_number = random.randint(1, 1000000)
print(random_number)

Na prática não é tão simples, e números aleatórios são importantíssimos. São usados o tempo todo em criptografia, cada página que você acessa online depende de números aleatórios para manter uma conexão segura, e quando isso não é possível, coisas ruins acontecem.

Na Segunda Guerra Mundial, vários deslizes dos nazistas ajudaram os criptoanalistas de Bletchley Park. Em uma ocasião, um operador de rádio alemão usava sempre o nome da namorada, “Cillie”, para configurar os painéis frontais da máquina Enigma. Quando interceptavam mensagens dele, elas eram decodificadas bem mais rápido.

Em outra ocasião um operador transmitiu uma mensagem longa, o outro lado avisou que veio quebrada. Ao invés de redigitar a mensagem usando uma nova chave criptográfica escolhida da tabela do dia, o tedesco preguiçoso reenviou a mesma mensagem sem alterar as chaves.

Como era esperado da Enigma, ela transformou o texto em algo completamente diferente da versão anterior, mas como as chaves não haviam sido mudadas, isso deu aos ingleses uma porta de entrada para as configurações dos rotores da Enigma.

As pessoas imaginam que computadores facilitaram a geração de números aleatórios, e é verdade para o nosso dia-a-dia, mas nem tudo é https fechando conexão com o xvideos. Espiões e militares dependem de criptografia avançada, e os nerds da NSA jantam a nossa criptografia cotidiana.

Mesmo algo aleatório, como um dado ou uma moeda, não é realmente aleatório, variações de forma e peso criarão pesos estatísticos que eventualmente gerarão um padrão aproveitável para um criptógrafo.

Sendo que um gerador realmente aleatório PODE gerar um padrão, por algum tempo. É a natureza dos valores randômicos. A maioria das pessoas não entende que é perfeitamente possível tirar cara 10 vezes seguidas, é apenas improvável. A Apple teve problemas com isso quando introduziu reprodução de faixas em ordem aleatória no iPod.

As pessoas começaram a reclamar que algumas faixas eram reproduzidas muitas vezes, e em alguns casos o iPod reproduzia a mesma faixa duas vezes seguidas. Os programadores protestaram, explicando que não havia nada errado, era natural para uma seleção aleatória.

Steve Jobs mandou escreverem bacalhaus para evitar reprodução da mesma faixa, e para normalizar a distribuição "aleatória".

Talvez o mais avançado sistema de criptografia da 2a Guerra Mundial tenha sido o SIGSALY, um monstro de 50 toneladas, ocupando 40 racks e consumindo 30KW, com a única função de encriptar transmissões de voz em tempo real.

O bicho fazia compressão de sinal, manipulação por harmônicos e misturava tudo usando uma fonte de ruído aleatório criada gravando as oscilações de válvulas de vapor de mercúrio. Os sinais eram gravados em discos de vinil, que depois eram distribuídos para os vários terminais.

Aqui dá pra ver bem as carrapetas. (Crédito: DOD/Domínio Público)

Era determinado um ponto de início na reprodução do disco, os dois lados então estavam sincronizados (fora as outras configurações). Mesmo hoje seria danado de difícil, talvez impossível quebrar essa criptografia.

Por volta de 12 terminais foram construídos, se uso era somente para gente de altíssimo escalão, tipo Churchill, McCarthur e provavelmente os operadores que ficavam de papo furado quando não tinha nenhum figurão na linha.

Na Guerra Fria os EUA atiravam para todo lado atrás de fontes de números realmente aleatórios. Alguns sistemas usavam discos com ruído aleatório da radiação de micro-ondas do fundo galáctico, captada via radiotelescópios.

Mesmo hoje em dia métodos criativos são usados em busca de números aleatórios. A Cloudflare usa uma parede de lâmpadas de lava, aquela decoração kitsch dos anos 60/70, com uma lâmpada aquecendo glicerina e álcool. A glicerina derrete, forma uma bolha, que se desprende em algum momento randômico, sobe, esfria, desce e repete o processo.

Uma câmera observa cada lâmpada anotando os eventos e extraindo números randômicos deles.

Isso é necessário pois os geradores de números aleatórios na maioria das linguagens de programação são muito fracos a ponto de serem chamados de geradores de números pseudo-randômicos.

As características de cada chip individual, de cada configuração de cpu/RAM, chipset contribuem para criação de padrões que tornam os números randômicos previsíveis (para gente como a NSA e a KGB, claro).

Mesmo fora da espionagem, números randômicos viciados podem ser prejudiciais. Aplicações estocásticas, que dependem de fatores aleatórios, como algoritmos de mercado de ações, simulações de Monte Carlo ou modelagem de interferência atmosférica podem ser negativamente afetados por um conjunto de dados aleatórios ruins.

Os QRNG, Geradores Quânticos de Números Aleatórios se valem do Princípio da Incerteza para produzir os números e isso por incrível que pareça, é bem simples.

Fenômenos quânticos são aleatórios por natureza. Estatisticamente sabemos que se você deixar 1kg de Urânio-235 numa gaveta, quando voltar em 700 milhões de anos metade terá se transformado em chumbo. Isso é facílimo de prever. O que é impossível é determinar o momento em que um átomo individual sofrerá decaimento radioativo emitindo energia.

Cuidado ao comprar seu urânio! (Crédito: Reprodução Internet)

Um simples contador Geiger apontado para uma amostra de material radioativo é um excelente gerador de números aleatórios. Também há métodos que usam ruído gerado por diodos e transístores, interferência de lasers (no caso da Quside) e outros métodos exóticos.

Chipset QN100, gerador de aleatoriedade quântica (Crédito: Quside)

O mais difícil é filtrar o ruído aleatório da fonte quântica, que é bem tênue, de outros sinais bem mais fortes, que podem ser confundidos com os dados quânticos.

E há também o fator velocidade. Segundo Jose Martinez, cientista-chefe da Qusid,

"Subrotinas de geração de números pseudo-aleatórios podem envolver até 50% dos recursos computacionais totais para cargas de trabalho estocásticas"

Com o QRNG, a promessa é performance 10 vezes mais rápida que os métodos usando CPUs discretas, não-quânticas e consumo de energia até 20 vezes menor.

Se o brinquedo cumprir o que promete, tornará a Internet mais segura, e muitas aplicações bem mais eficientes. Ou não, mas essa é a natureza das coisas quânticas.

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