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Cientistas identificam organismo que "come" vírus

Espécie de ciliado tem predileção por vírus em seu cardápio; até então, pensava-se que seres similares os consumiam por acidente

1 ano atrás

Os vírus estão entre nós pelo menos desde a origem da vida na Terra, agentes infecciosos que sequer preenchem as lacunas que poderiam caracterizá-los como seres vivos (tecnicamente, não são). Na Natureza, existem pouquíssimas coisas capazes de combatê-los, embora haja registro de microorganismos, capazes de consumi-los, ainda que por acidente.

Geralmente, seres do Reino Protista (amebas, protozoários) conseguem comê-los, mas na maioria das vezes estes os confundem com bactérias. No entanto, cientistas identificaram uma espécie que caça e consome vírus deliberadamente, como uma fonte de alimento.

Vírus SARS-CoV-2, que causam a Covid, vistos por um microscópio eletrônico (Crédito: National Institute of Allergy and Infectious Diseases/Rocky Mountain Laboratories)

Vírus SARS-CoV-2, que causam a Covid, vistos por um microscópio eletrônico (Crédito: National Institute of Allergy and Infectious Diseases/Rocky Mountain Laboratories)

O artigo (cuidado, PDF) descreve uma pequisa realizada pela Universidade de Nebraska-Lincoln, liderada pelo biólogo John DeLong, em busca de organismos unicelulares que consomem vírus ativamente. Em geral, protistas comem tudo o que veem pela frente, e uma pesquisa de 2020 já apontava que espécies marinhas também consumiam vírus, mas esses vinham no pacote.

Até onde se sabia, ciliados e outros seres do mesmo Reino tinham predileção por bactérias, mas não eram tão exigentes a ponto de dispensar um cardápio de vírus, se estes estivessem disponíveis. A nova pesquisa, por sua vez, se focava em encontrar espécies que não só sabem a diferença entre bactérias e vírus, mas que também preferem a segunda opção, de forma consciente.

Os pesquisadores coletaram água de um lago próximo e adicionaram às amostras uma variedade de chlorovirus que ataca algas vivendo em água doce. Nas observações, eles identificaram uma espécie de ciliado (que utilizam cílios para se locomover e capturar suas presas; o paramécio é o exemplo mais conhecido) particular, a Halteria sp. que, até então, pensava-se ter uma dieta exclusiva de bactérias.

Não só a Halteria estava comendo os vírus, como dava preferência a eles.

A cultura onde o ciliado foi observado continha os chlorovirus e outras fontes de alimento, mas uma vez que as opções não interessantes à pesquisa foram eliminadas, a população de Halteria aumentou 15 vezes em apenas dois dias, enquanto a dos vírus foi reduzida a 1% da original.

O time de pesquisadores confirmou que a Halteria estava ativamente consumindo os chlorovirus, ao injetar marcadores fluorescentes nos vírus, e constatar que os ciliados também passaram a brilhar; os cientistas constataram que outra espécie de protista, o Paramecium bursaria, também se alimentava dos chlorovirus, mas sua população não aumentou durante as observações.

Cientistas já conheciam a Halteria, mas pensavam que ela só consumia bactérias (Crédito: Don Loarie)

Cientistas já conheciam a Halteria, mas pensavam que ela só consumia bactérias (Crédito: Don Loarie)

Por que a Halteria prefere os vírus, então? Segundo DeLong, estes possuem estruturas ricas em fósforo, nitrogênio e ácidos nucleicos, que compõem seu material genético (o DNA e o RNA são feitos da mesma coisa), fazendo deles uma iguaria irresistível para seres que tiram estes elementos de outras fontes. É possível que, do ponto de vista de um ciliado, um vírus não só seja mais nutritivo, como sua presença abundante o torna mais interessante e menos custoso de capturar.

Claro, isso nem de longe significa que poderemos usar protistas como uma forma de tratamento para vírus. Em geral, organismos complexos odeiam essa turma, há diversas espécies que promovem estragos severos, como doença de Chagas, toxoplasmose, malária, leishmaniose, giardíase, doença do sono, candidíase, etc., e nem mencionei as que acometem animais.

Ainda assim, a pesquisa é importante por constatar que ciliados como a Halteria desempenham um papel relevante na cadeia alimentar aquática, ao controlar o número de vírus na água, e com um aumento conseguinte na sua população, servir como alimento para outras espécies, enquanto evita a propagação de doenças causadas pelos chlorovirus.

Da mesma forma, ela demonstra que os vírus têm um papel relevante na cadeia, e participam ativamente do Ciclo da Vida, servindo de comida.

Referências bibliográficas

DELONG, J. P., VAN ETTEN, J. L., AL-AMEELI, Z., DUNIGAN, D. D. The consumption of viruses returns energy to food chains. Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), Volume 120, Edição 1, 3 páginas, 27 de dezembro de 2022. Disponível aqui.

Fonte: ExtremeTech

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