Carlos Cardoso 7 anos atrás
Os Nove Bilhões de Nomes de Deus é um dos (ótimos) contos de Arthur Clarke. Nele dois engenheiros visitam um mosteiro no Himalaia, os monges querem comprar um computador para ajudar no trabalho da Ordem: eles acreditam que Deus tem 9 bilhões de nomes, e é função dos monges compilar cada um deles em pesados livros com capas de couro. Por gerações, os religiosos pacientemente calculavam as permutações, seguindo regras antigas e complicadas. O computador agilizaria imensamente o trabalho.
O computador é vendido, instalado e as listagens começam a sair das impressoras. Um dos engenheiros pergunta o que acontecerá quando o trabalho terminar. O líder dos monges explica que o Universo terá cumprido sua função e acabará.
Os engenheiros começam a ficar preocupados, quando o último nome sair da impressora e nada acontecer os monges podem ficar irritados, culpar o computador e talvez até colocar a vida deles em perigo. Decidem fugir pela trilha de mulas que levava ao mosteiro, ao mesmo tempo em que o trabalho está quase no fim.
Quase chegando na pista de pouso, com o avião de fuga os esperando, um dos engenheiros olha pra cima e percebe que as estrelas estão, uma a uma, se apagando.
Foi exatamente isso que astrônomos testemunharam, na Constelação de Cisne.
Eles estavam acompanhando a galáxia NGC 6946, a uns 20 milhões de anos-luz da Terra. Mais precisamente a estrela N6946-BH1, que estava prestes a se tornar uma supernova, e prestes no sentido “Scotty se você não consertar os motores de dobra AGORA nós estamos mortos!”.
Com massa de 25 vezes a do Sol, era uma ótima candidata a supernova, e em 2009 seu brilho começou a crescer, chegou a vários milhões de vezes o do Sol, quando normalmente é só umas cem mil vezes mais brilhante.
A estrela é das grandes. Para dar uma idéia, esta é Betelgeuse (não vale 3 vezes), que tem METADE da massa de N6946-BH1. Está vendo o pontinho branco? É o Sol, na superfície dela.
Só que em vez de explodir em um apocalipse de energia, a estrela começou a definhar, o brilho foi diminuindo, diminuindo e por volta de 2015 ela simplesmente se apagou.
Poucas coisas fora da ficção científica são capazes disso.
Não é inédito uma supernova dar chabu: às vezes elas não têm a massa mínima pra desencadear a reação, depois que camadas da atmosfera são eliminadas ela não consegue sustentar o processo e se encolhe. Acontece com todo mundo, fale com seu médico, eu falaria.
Só que normalmente sobre uma estrela normal, dizendo que está cansada e estressada por causa do trabalho. Desta vez não havia estrela visível. Telescópios espaciais como o Hubble e o Spitzer foram apontados e começaram a procurar por assinaturas em infravermelho, talvez uma nuvem de poeira resultante da explosão fracassada estivesse ocultando a estrela.
Nada.
Como nem Galactus sumiria com uma estrela, e os cientistas não acreditaram quando Lula disse que foi a Marisa, só sobrou uma explicação: a N6946-BH1 se tornou um buraco negro.
Quando o núcleo esfriou e não conseguiu conter mais a gravidade da estrela, a matéria se condensou, reativando a fusão nuclear, provocando a primeira explosão, mas aparentemente a reação não conseguiu se manter, e o resto da estrela colapsou sem dó nem piedade, formando o buraco negro, em vez da supernova.
Isso explicaria um fenômeno que intriga cientistas faz tempo: temos muito mais estrelas super-gigantes do que supernovas, os números não batiam. Agora aparentemente está explicada a discrepância: uns 30% das super-gigantes ao invés de explodir, viram direto buracos negros.
A pesquisa foi publicada no artigo “The search for failed supernovae with the Large Binocular Telescope: confirmation of a disappearing star” e claro que temos o link, aqui é o MeioBit, a gente mata a cobra e mostra o fucking paper.