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Resenha — Logan (sem spoilers)

O fim está próximo: leia nossa análise (sem spoilers) de Logan, o último filme da franquia X-Men com Hugh Jackman no papel do canadense invocado.

7 anos atrás

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Um funeral. Essa é a melhor maneira de definir Logan, o mais novo filme da Fox baseado no universo dos X-Men e o terceiro solo do Wolverine, personagem vivido por Hugh Jackman por quase duas décadas (céus, como o tempo voa). O clima é de desfecho, conclusão, já que o ator dá adeus ao papel do mutante mais popular da Marvel Comics em uma produção séria, que por muito pouco não se enquadra em uma produção de super-heróis.

Acompanhe-nos em uma análise livre de spoilers deste que está sendo considerado o melhor filme baseado em HQs já produzido.

There aren't any more guns in the valley

Parece que foi ontem, mas X-Men: O Filme estreou nos cinemas em 2000. Ainda que muitos apontem para Blade (1998) o verdadeiro primeiro filme da retomada dos heróis no cinema, foi a produção de Bryan Singer que mudou todos os parâmetros e mostrou que era possível contar uma história de seres com poderes malucos na tela grande. O grande problema é que ele atochou todo mundo dentro de roupas de couro preto, a fim de dar um ar de seriedade para o que ficaria ridículo na tela: um cara com seis garras de metal nas mãos usando um colã amarelo, botas azuis e uma máscara esquisita.

A ideia deu certo, os X-Men viabilizaram todo um novo filão de produções baseadas em HQs e até a Marvel refletiu isso nos quadrinhos, com os mutantes usando couro por anos. Precisou de um Joss Whedon em Surpreendentes X-Men para as roupas coloridas voltarem, com Ciclope apontando o óbvio: “o preto estava deixando todo mundo louco”.

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Só que em algum ponto a Fox perdeu a mão com a franquia. X-Men III: The Last Stand, dirigido por Brett Ratner porque Singer estava no comando de Superman Returns (outra bomba) fez tudo errado, ao matar uma penca de mutantes e tirar os poderes de outros tantos. A solução do estúdio foi se voltar para Wolverine, que era o destaque e galã da franquia (com seu 1,88 m e peito pelado, que sempre davam o ar da graça para alegria da mulherada) e dar a ele uma aventura solo, com a promessa de entregar uma produção “adulta” e mais próxima das Graphic Novels da Marvel.

Não poderiam estar mais errados. X-Men Origens: Wolverine (2009) foi uma bomba suja, ao ponto de muita gente ter agradecido ao nobre desconhecido que vazou a cópia incompleta antes da estreia, o que fez muita gente poupar sua grana. A Fox então decidiu recontar tudo, e com X-Men: A Primeira Classe (2011) o estúdio teve uma recepção excelente, o que abriu espaço para o reboot em Dias de Um Futuro Esquecido (2014).

Só que antes dele a Fox tentou mais um filme com Logan em voo solo. Wolverine: Imortal (2013) não é perfeito, mas a adaptação de James Mangold (Johnny & June, Os indomáveis) para a Graphic Novel Eu, Wolverine de Frank Miller já foi bem mais séria do que as tentativas anteriores. Só que um problema se apresentava: o tempo passa e como Hugh Jackman não tem fator de cura, ele está envelhecendo.

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Assim Mangold foi escalado para adaptar outra grande obra do carcajú nas HQs: a minissérie O Velho Logan, lançada em 2008 na revista mensal e escrita pelo insano genial Mark Millar, autor de pérolas como a saga Guerra Civil, os dois primeiros volumes d'Os SupremosThe AutorithyKick-Ass e The Secret Service (a HQ que se tornou base para a franquia cinematográfica Kingsman), entre outras. Ambientada num futuro apocalíptico onde os vilões venceram e quase todos os heróis estão mortos, Logan é um velho fazendeiro com uma família que tenta sobreviver alheio a tudo o que aconteceu, enquanto busca esquecer o grande pecado que cometeu no passado.

Logan é uma adaptação livre e possui sua própria história, mas segue o mesmo tom pesado e sem esperança da HQ. Por pouco ele não se enquadra em um filme de heróis, pois você não verá muitos mutantes pulando na tela e poderes para todos os lados. A narrativa é mais adulta e séria, ambientada num futuro em que tudo deu errado para os X-Men e todos ao seu redor. A trama é tensa, seca a aflitiva. Não há perspectiva de melhora neste mundo e mesmo os pequenos momentos de felicidade são fugidios, efêmeros.

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Logan agora é um homem decrépito. Com o fator de cura falhando e à beira de um colapso total ele tenta viver seus últimos dias tranquilamente, sem atrair problemas para si. Ele perdeu tudo e todos, não vê nada no horizonte e se arrasta (literalmente) para permanecer vivo apenas porque outro em piores condições depende dele: Charles Xavier. O mentor dos Filhos do Átomo, agora um nonagenário inválido em nada se assemelha ao austero professor que criou os X-Men, e a interpretação de Sir Patrick Stewart (que também está dando adeus ao papel) é comovente.

Mas quem rouba mesmo a cena é a pequena Laura, interpretada pela atriz novata Dafne Keen, que foi vista na série The Refugees. A mutante (que todo mundo já sabe é a versão live-action da X-23, a jovem clone feminina do Wolverine apresentada na animação fraquinha X-Men Evolution, mas agradou tanto que foi introduzida na cronologia oficial das HQs) é dona de um ar frio e compenetrado, mas explode em acessos de fúria tal qual Logan nos velhos tempos. Ainda assim ela continua sendo uma criança, e tenta viver como tal mesmo com o mundo todo a caçando.

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Os antagonistas, um grupo misterioso liderado em campo por Donald Pierce (criação de Chris Claremont e John Byrne, um ciborgue aristocrata e membro do Clube do Inferno que odeia os mutantes e tem sede de poder infinita; aqui ele não é muito diferente) quer Laura de volta e ela acaba entrando nas vidas de Xavier e Logan, sendo que este último não queria isso de jeito nenhum. O que se segue é uma jornada triste, quase um cortejo fúnebre com doses equilibradas de dor, sentimento e violência, muita violência. O contraste é inevitável, ao ver uma garota de 11 anos jogada num inferno em vida e contemplar mais mortes do que seria saudável.

Aliás cabe um parêntese aqui, especialmente dirigido aos pais: Logan, ao contrário da classificação indicativa brasileira não é adequado para 16 anos. Tanto ele quanto Deadpool foram pensados e produzidos como obras 18+, e algum tapado daqui viu “filme baseado em HQ” (ou a Fox Film do Brasil mexeu uns pauzinhos) e reduziu a barra. No entanto é bom deixar claro, o filme é violento até dizer chega; o sangue jorra em litros na tela e há cenas de desmembramentos, decapitações e empalações, além de palavrões em profusão.

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O saldo final é uma versão com poderes (sutis) de Onde os Fracos Não Têm Vez dos irmãos Coen: brutal, sem alma e sanguinolento, mas ao mesmo crível e demasiadamente humano. Logan ainda tenta fazer o que é certo por conta de sua boa índole, mas nenhuma boa ação vem sem punição e ele, mais do que ninguém a está sentindo na pele há anos. Mas Xavier e Laura precisam dele, e o mutante fará mais uma vez (a primeira vez na tela da TV sem freios) aquilo que faz de melhor, e que não é nada bonito.

Conclusão

Logan não é nem de longe o melhor filme da história, mas é difícil classifica-lo apenas como um filme de super-heróis. A jornada que o personagem faz em busca de redenção e expiação por seus erros é comovente e realista, e não fossem as garras e fator (cambaleante) de cura a película poderia se passar muito bem por um drama adulto de pessoas tentando encontrar algum sentido no que fazem e na própria vida.

Mangold conseguiu recontar na tela uma HQ violenta, tensa e sem uma gota de esperança de uma maneira única, ainda que os eventos sejam completamente diferentes a sensação é similar, igualmente angustiante. Logan é o filme adulto que Wolverine sempre mereceu por tudo o que significa para a cultura pop em geral e é um réquiem para Hugh Jackman, que encerra sua participação na franquia X-Men com o que pode ser o melhor filme baseado em personagens de quadrinhos já produzido.

Cotação:

5/5 velhos Logan.

Fox Film do Brasil – Logan | Trailer Oficial 2 | Legendado HD

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